Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República, Debate na generalidade do Orçamento do Estado 2022

O Governo escolhe submeter os trabalhadores, o povo português, a dificuldades acrescidas

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Quando a situação do País já era de enorme gravidade em 2021, o Governo apresentou em Outubro um orçamento que não respondia aos graves problemas que os portugueses enfrentavam.

De então para cá esses problemas acentuaram-se e novos problemas surgiram. As dificuldades na vida dos trabalhadores e dos reformados, das micro e pequenas empresas, dos sectores produtivos são piores e piores são as perspetivas de futuro imediato.

Perante esse quadro de maior urgência e exigência, o Governo apresenta uma proposta de orçamento que está ainda mais distante das respostas necessárias aos problemas do país.

Este orçamento não responde à exigência do aumento real dos salários e das pensões. Do combate efetivo ao aumento do custo de vida e do controlo dos preços. Do reforço dos serviços públicos, desde logo do Serviço Nacional de Saúde. Da defesa do direito à habitação, contra os despejos e a escalada das rendas.

Em todas estas e muitas outras matérias fundamentais, as soluções para o país ficam mais longe do orçamento agora apresentado.

Diz o Governo: o PS teve maioria absoluta, vai daí o povo quer este orçamento. O Governo decide aumentar salários e pensões abaixo da inflação e vem aqui explicar-nos que é isso que faz porque é isso que as pessoas querem!

O Senhor Primeiro-Ministro pode dizer às pessoas que vão perder poder de compra porque a maioria absoluta do PS assim decide. O que não pode é dizer que as pessoas “optaram” por menos poder de compra.

Quando a inflação era baixa, não se aumentava os salários porque não era preciso. Quando os preços disparam, não se aumenta os salários por causa da inflação!

Entretanto, deixa-se cair a dinamização do mercado interno para as micro, pequenas e médias empresas. Deixa-se degradar os serviços públicos com uma carência crónica de pessoal, com os trabalhadores tantas vezes a saírem dos serviços – e mais ainda a optarem por outros trabalhos (e até outros países!), à procura de melhores salários.

A opção política do Governo é a de colocar acima de tudo, como “questão absolutamente essencial” (palavras do Ministro das Finanças), a prioridade máxima do défice.

O objetivo do Governo em Outubro era um défice de 3,2. Agora, com o aumento do custo de vida, com o agravamento dos problemas, o Governo coloca agora o objetivo, não em 3,2 mas em 1,9.

O Governo escolhe submeter os trabalhadores, o povo português, a dificuldades acrescidas; escolhe não avançar com respostas (essas sim essenciais) a problemas gritantes do país… para quê? Para atingir o objetivo supremo de baixar sete pontos percentuais e ficar com a dívida em 120% do PIB!

É isso, diz o Governo, que nos vai proteger de novos abalos telúricos nas taxas de juro. Não se pode construir hospitais nem creches públicas por causa da Euribor!

A chantagem e os ataques especulativos dos abutres, perdão, dos “mercados”, já não acontece se os trabalhadores portugueses passarem fome, se as pequenas empresas caírem na ruína, se os inquilinos continuarem a ser expulsos das suas casas, se os serviços públicos entrarem em rutura. É esta a profissão de fé do Governo.

Mas para alguns o dinheiro não pode faltar.

Não falta dinheiro para aumentar as PPP rodoviárias (para 1.555 milhões de euros em pagamentos). Não falta dinheiro para aumentar borlas fiscais e benefícios e subsidiar lucros a grandes grupos económicos. Para isenções fiscais à importação para financiar a NATO e a guerra.

Este orçamento alarga o regime de isenção de IVA para material usado em missões militares, da NATO para a União Europeia.

São opções: 23 por cento de IVA para a eletricidade que as famílias pagam, zero por cento de IVA para os mísseis. São opções – mas não são as nossas!

Ao colocar o saldo primário como o alfa e o ómega das opções orçamentais, o Governo faz uma opção. Entre o défice e o país, o Governo escolhe o défice.

A velha pergunta com que Almeida Garrett nos interpela ainda se coloca com a atualidade de sempre – e ganha agora uma nova expressão e novas variáveis: quantos pobres são precisos para produzir 1,9 de défice?

Senhor Presidente, Senhores Deputados,

O país não tem de estar condenado a estas supostas inevitabilidades. Tem de haver uma resposta à altura dos problemas e das necessidades que enfrenta, mobilizando todas as possibilidades que hoje existem.

É preciso o reforço substancial do investimento público e da sua execução; a defesa do aparelho produtivo, substituindo importações pela produção nacional, criando emprego, diminuindo a dependência e exposição externas, dinamizando o tecido económico, em particular as micro, pequenas e médias empresas.

É preciso o reforço dos serviços públicos, do Serviço Nacional de Saúde, da Escola Pública, nos transportes; na cultura, da promoção de oferta pública de habitação; da rede pública de creches e de outros equipamentos.

Portugal não é um país pobre. O País tem potencial e recursos para enfrentar a atual situação. E pode continuar a contar com o PCP para intervir e lutar para garantir soluções que integrem a resposta global aos problemas nacionais, caminho indispensável para a vida do País.

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