Senhor Presidente da República,
Senhor Presidente da Assembleia da República,
Senhor Primeiro-Ministro,
Senhores Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional,
Capitães de Abril,
Senhoras e senhores convidados,
Senhoras e senhores deputados,
Naquele dia de Abril, que hoje comemoramos, o povo saiu à rua e, pleno de força e determinação, proclamou: «O povo é quem mais ordena!» E com esta afirmação, tão singela, mas ao mesmo tempo tão profunda nas suas implicações, o povo tomou nas mãos o seu destino e fez-se revolução.
Um pouco por todo o País, mas com especial simbolismo no cerco ao quartel do Carmo, impressionantes massas populares juntaram-se aos militares de Abril e, ombro com ombro, de cravo na mão, forjaram a aliança Povo-MFA e partiram à conquista de uma nova sociedade.
Chegava ao fim a longa noite fascista, cujo negrume, ao longo de quase 50 anos, havia sido iluminado pela corajosa luta dos resistentes antifascistas, que não olharam a sacrifícios, por vezes da sua própria vida, para devolverem a liberdade ao povo português.
Nos meses seguintes, com a feroz oposição daqueles que acham que o povo é apenas um penacho decorativo no chapéu da democracia, as massas populares operaram decisivas e profundas transformações na sociedade portuguesa.
Atiraram a odiosa ditadura fascista para o caixote do lixo da História e construíram a mais avançada, mais progressista e mais democrática organização social que alguma vez Portugal teve.
Liberdade de expressão, direito de reunião e manifestação, liberdade de associação e formação de partidos políticos, liberdade sindical, direito ao trabalho, direito à greve, controle pelo Estado dos sectores estratégicos da economia, participação dos trabalhadores na gestão das empresas, direito à contratação colectiva, reforma agrária, direitos sociais e culturais, sistema de segurança social, serviço nacional de saúde, geral e gratuito, ensino básico universal, elevação do nível de vida das classes trabalhadoras e do povo em geral, reconhecimento do direito dos povos das colónias à independência, estas são algumas das importantes conquistas da Revolução de Abril.
Nenhuma destas conquistas foi oferecida ao povo português. Foram – todas elas – alcançadas pela luta dos trabalhadores, das massas populares e do movimento sindical, em aliança com os militares do Movimento das Forças Armadas. Conquistas que, dois anos depois, haveriam de encontrar o seu lugar na Constituição da República Portuguesa, a qual, apesar de desvirtuada em sucessivas revisões, ainda mantém o espírito progressista e democrático da Revolução de Abril.
Exercendo as conquistas de Abril, antes que qualquer decisão dos órgãos de poder formal as reconhecessem, o povo afirmou-se como protagonista na construção de uma nova e mais justa sociedade.
Volvidos mais de quarenta anos, ainda ouvimos certas pessoas e certas forças políticas referirem-se em tom depreciativo e, nalguns casos, mesmo com indizível horror àqueles intensos anos de transformação revolucionária da nossa sociedade. É a atitude de quem abomina a democracia ou a vê simplesmente como um processo formal em que a intervenção das massas populares na vida política se deve limitar ao voto de quatro em quatro anos.
Ao longo de quatro décadas, as conquistas da Revolução de Abril nos domínios dos direitos políticos, económicos, sociais e culturais estiveram sob fogo cerrado da política de direita, que, em estreita consonância com os interesses do grande capital, procurou limitar o seu alcance ou mesmo liquidá-las.
Particularmente gravosa foi a acção do anterior Governo PSD/CDS que desferiu o mais brutal ataque de que há memória aos direitos dos trabalhadores e do povo. Não é exagero dizer que, pela sua intensidade e alcance, essa acção se traduziu num verdadeiro ajuste de contas com o 25 de Abril e as suas conquistas.
A corajosa e persistente luta dos trabalhadores e do povo português levou ao isolamento político e social desse Governo, à rejeição da sua política de exploração e empobrecimento e, em Outubro de 2015, à sua derrota eleitoral. Também aqui se confirmou, mais uma vez, que vale a pena lutar. É com a luta que os trabalhadores e os povos resistem e derrotam as ofensivas contra os seus direitos e é com a luta que abrem horizontes de esperança.
Nos últimos dois anos e meio, no quadro de uma nova correlação de forças na Assembleia da República, com o contributo decisivo do PCP, foram adoptadas medidas de defesa, reposição e conquista de direitos e rendimentos. Medidas que, dando resposta a problemas urgentes dos trabalhadores e do povo, estão, contudo, aquém daquilo que seria necessário e possível. E se não se vai mais longe na resolução dos problemas dos trabalhadores, do povo e do País, isso deve-se às opções do PS e do seu Governo, que, em convergência com PSD e CDS, mantêm o seu compromisso com os interesses do grande capital e a sua submissão às imposições do Euro e da União Europeia.
O que se impõe é a mobilização dos recursos orçamentais disponíveis não para a redução acelerada do défice e da dívida, mas sim para dar resposta aos problemas das pessoas, investindo nos serviços públicos, no Serviço Nacional de Saúde e na Escola Pública, na protecção social, nos transportes públicos, na floresta e no mundo rural, na cultura, ciência e investigação, na segurança e na justiça.
Portugal e os portugueses não estão condenados a uma perpétua submissão às orientações e imposições do Euro e da União Europeia e aos interesses do grande capital. Os avanços alcançados nos dois últimos anos e meio não são o ponto de chegada; são o ponto de partida de novas lutas para conquistar novos avanços, são o ponto de partida para a afirmação e construção de uma política alternativa, patriótica e de esquerda.
Há quarenta e quatro anos o povo português saiu à rua e, superando todas as dificuldades e obstáculos, empreendeu a construção de uma sociedade mais livre, mais justa e mais fraterna. A melhor forma de hoje comemorarmos a Revolução de Abril e a ousadia de um povo que soube transformar um sonho em realidade, é projectar os valores e conquistas dessa Revolução no presente e no futuro de Portugal.
Viva o 25 de Abril!