Projecto de Lei N.º 664/XIV/2.ª

Determina o alargamento, requalificação e criação de vagas na rede de equipamentos e serviços de apoio social e a contratação de trabalhadores para reforçar as necessidades do seu funcionamento

Exposição de motivos

O surto epidémico e o agravamento do número de contágios, designadamente em lares e estruturas residenciais, coloca a necessidade de serem avaliadas e reajustadas as medidas tomadas ao longo destes meses visando assegurar a eficácia das respostas de emergência que concorram para assegurar a capacidade de resposta que é devida nas situações de contágio com COVID–19, aos seus trabalhadores e utentes, mas igualmente para mitigar as consequências de natureza social, física, mental e cultural das pessoas idosas que vivem nestes equipamentos e que têm estado sujeitas a um isolamento forçado, que em si mesmo coloca em perigo a sua saúde física e psicológica, agravando os problemas motores e psicológicos que daqui advêm.

A situação epidemiológica por SARS-Cov2 e da doença COVID-19 trouxe para primeiro plano a situação e as perspetivas das respostas sociais que integram a Rede de Equipamentos e Serviços de Apoio Social nos seus múltiplos domínios.

E se há ilações a retirar dos tempos difíceis que vivemos em resultado da situação epidemiológica é a consciência de que nenhuma estrutura ou organização tem capacidade de dar resposta a esta emergência social, mas muitas das vulnerabilidades verificadas resultam de lacunas, insuficiências e fragilidades que são anteriores ao atual contexto.

Esta Rede abrange um vasto número de instituições, de valências e um elevado número de utentes e de trabalhadores. A atual situação, na sua diversidade, evidencia denominadores comuns cujos traços essenciais são anteriores ao surto epidémico e que tenderão a agravar-se se não forem tomadas as medidas adequadas.

Existe um largo número de lares (estruturas residenciais para pessoas idosas), que abrangem um universo alargado de entidades gestoras - entidades do sector social, do sector privado e equipamentos não licenciados - com situações muito diferenciadas, designadamente quanto aos recursos humanos existentes e quanto à tipologia dos equipamentos adequados à concretização das medidas sanitárias que impeçam as cadeias de contágio e que assegurem a resposta de emergência que se impõe em situação de utentes e trabalhadores infetados pelo novo coronavírus.

Importa destacar o esforço acrescido que tem sido exigido aos trabalhadores destes equipamentos, na sua grande maioria mulheres, com baixos salários e que, em condições muito difíceis, têm assegurado o funcionamento destes equipamentos e o acompanhamento dos idosos sendo de destacar também o esforço realizado em muitas das instituições do sector social na adoção das medidas necessárias à prevenção do surto e na garantia da qualidade dos serviços prestados.

Mas ao longo dos últimos meses têm-se registado situações gravíssimas em muitos lares, e um pouco por todo o país, situações que expõem as fragilidades e lacunas de muitos deles. Situações que sendo anteriores, se vieram a avolumar no atual contexto de epidemia face ao número de contágios em trabalhadores e idosos e à carência de trabalhadores para a prestação de cuidados fundamentais aos idosos, designadamente por falta de pessoal.

O PCP considera fundamental que sejam avaliadas e reajustadas as medidas tomadas ao longo destes meses, adotando-se respostas de urgência, quer de reforço de trabalhadores para atender ao contexto de pandemia, em que se regista uma redução de pessoal fruto de contágio com COVID-19, quer para dar resposta às redobradas exigências e que não podem ser resolvidas com as soluções do Governo assentes no recurso a desempregados, entre outros, como está contemplada na Portaria em que propusemos a sua revogação.

É através da contratação de trabalhadores que se poderão suprir as carências de recursos humanos, assegurando por um lado, estabilidade aos que ingressam nas instituições em tempos tão difíceis e, por outro, assegurando as condições mínimas de formação necessárias a esta atividade tão específica, satisfazendo assim a condição para garantir estabilidade no funcionamento destes equipamentos no cumprimento dos planos de contingência, na qualidade dos cuidados diários aos idosos, na defesa da sua saúde relativamente a diferentes patologias, mas igualmente na realização de atividades que assegurem o seu estímulo motor e psicológico que mitiguem as consequências do isolamento.

Destaca-se que a insuficiência de recursos humanos já constitua uma realidade anterior ao surto epidémico, tanto no domínio do pessoal auxiliar, como em enfermeiros, animadores culturais e psicólogos. Uma realidade que não se resolve com «pensos rápidos» porque a natureza da intervenção nos Lares de Idosos é específica, com exigências redobradas em tempo de surto epidémico, e que deverá permanecer como uma prioridade para o futuro. Tal como a defesa intransigente da valorização das condições de trabalho dos trabalhadores que intervêm nos Lares (estruturas residenciais para idosos) como nas restantes respostas sociais, é indissociável da garantia de qualidade na prestação de serviços no quadro do surto epidémico e no futuro.

Importa ainda não perder de vista que continuam a existir listas de espera para acesso a lares e estruturas residenciais para pessoas idosas, quer porque existe insuficiência de vagas no sector social, quer face ao valor das mensalidades que excluí os idosos com mais baixos rendimentos. Uma realidade a exigir resposta.

O PCP considera e nesse sentido apresenta iniciativas legislativas que articulem a necessidade de adoção de medidas urgentes com medidas de fundo que assegurem a existência de uma Rede Pública de Equipamentos e Serviços de Apoio aos idosos que responda aos problemas que o envelhecimento coloca, corrigindo lacunas e insuficiências anteriores ao surto epidémico.

Igualmente, deve ser equacionada uma clara articulação entre a Rede de Cuidados Continuados no que concerne aos idosos, com o papel específico dos Lares e Estruturas Residenciais, não devendo estes cumprir objetivos que devem ser a primeira a satisfazer.

O PCP considera necessário o reforço das respostas de emergência a serem adotadas para o quadro excecional que se vive e é nesse sentido que apresentamos este projeto-lei.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei define:

  1. O regime de alargamento e requalificação da rede de equipamentos sociais de apoio aos idosos, procedendo à alteração do artigo 31.º da Lei n.º 11/2007 e posteriores alterações;
  2. O regime de contratação de trabalhadores necessários ao aumento da capacidade e qualidade das respostas sociais, revogando Portaria n.º 82-C/2020, de 31 de março.

Artigo 2.º

Âmbito

O regime previsto na presente lei destina-se:

  1. A suprir as dificuldades sentidas pelas instituições e insuficiências nas respostas sociais aos idosos, que se agravaram exponencialmente no quadro do surto epidémico, criando insuficiências de recursos humanos geradores de incapacidade de resposta às acrescidas exigências que estão colocadas, nomeadamente devido ao aumento das atividades de apoio social ou ao impedimento temporário dos seus trabalhadores por motivo de doença, isolamento profilático, assistência a familiares ou dependentes;
  2. A assegurar o reforço de trabalhadores necessários, identificados por cada equipamento de apoio a idosos que sejam da responsabilidade de entidades públicas, instituições particulares de solidariedade social ou entidades privadas sem fins lucrativos.

Artigo 3.º

Alargamento e requalificação da rede de equipamentos sociais

  1. O alargamento e requalificação da rede de equipamentos sociais prevê:
    1. Assegurar a redução do número de utentes por quarto, prevista na Portaria 67/2012;
    2. Assegurar o cumprimento das regras sanitárias, designadamente nos espaços comuns, com vista à redução do risco de contágio por COVID-19;
    3. Aumentar o número de vagas para todos os idosos, assegurando a resposta a todos os que se encontram em lista de espera para ingresso nos Lares e Estruturas Residenciais.
  2. O alargamento e requalificação dos equipamentos sociais da rede pública e do setor social e solidário são executados pelo Instituto de Segurança Social, I.P., incluindo a criação e requalificação de equipamentos e respostas sociais nas áreas de apoio a idosos que promovam aumento da capacidade e da qualidade das respostas sociais.
  3. O Instituto da Segurança Social, I.P. cria as vagas necessárias, considerando todos os distritos do território nacional, proporcionalmente às necessidades identificadas em lista de espera.
  4. Para o cumprimento do previsto nos números anteriores:
    1. São disponibilizados equipamentos da Segurança Social que, não estendo ocupados ou em funcionamento, sejam convertidos em resposta pública no âmbito dos equipamentos sociais de apoio a idosos;
    2. São mobilizados os edifícios do património edificado do Estado que se encontrem disponíveis para o efeito, devendo a autorização de investimento ser unicamente da responsabilidade do Ministério proprietário do equipamento.
  5. A responsabilidade pela implementação e gestão da resposta pública prevista no presente artigo é do Instituto de Segurança Social, I.P., sem prejuízo da articulação com outras entidades da Administração Central.
  6. As obras de adaptação, requalificação e reestruturação das infraestruturas a serem utilizadas na resposta social de apoio a idosos podem ser financiadas com recurso ao Programa Pares e/ou fundos comunitários.

Artigo 4.º

Contratação de trabalhadores para a rede de Lares e Estruturas Residenciais

  1. São admitidos os trabalhadores necessários, identificados por cada equipamento que seja da responsabilidade de entidades públicas, instituições particulares de solidariedade social ou entidades privadas sem fins lucrativos, através de contrato de trabalho sem termo.
  2. A seleção de trabalhadores é efetuada de acordo com critérios a regulamentar pelo ministério responsável pela área da Segurança Social, considerando, designadamente, a formação e experiência profissional.
  3. A formação inicial e contínua dos trabalhadores é da responsabilidade do IEFP, I.P. em conjunto com as entidades referidas no n.º 1, considerando, designadamente, as funções a desenvolver com utentes com características específicas ou o seu exercício em contexto laboral de risco.
  4. A atribuição de funções aos trabalhadores prevista no n.º 1 é da responsabilidade da Segurança Social e depende da avaliação das necessidades existentes nos diversos Lares e Estruturas Residências do Sector Social das prioridades a observar no seu preenchimento e concretizada no respeito pelas normas legais e convencionais em vigor para o setor, incluindo a contratação coletiva em vigor, nomeadamente no que diz respeito à retribuição base e outras prestações retributivas, aos horários e tempos de trabalho, à categoria profissional e ao respetivo conteúdo funcional.
  5. É ainda criada uma bolsa de recrutamento, na dependência da Segurança Social e sob tutela do ministério responsável pela área da Segurança Social, a fim de se proceder ao reforço de trabalhadores nas diversas valências dos equipamentos sociais.
  6. A bolsa de recrutamento prevista no número anterior é utilizada para o recrutamento de trabalhadores necessários ao alargamento da rede de equipamentos sociais, bem como à criação de uma rede pública de equipamentos sociais geridos de forma direta pela Segurança Social.

Artigo 5.º

Financiamento e acordos de cooperação

  1. As medidas de reforço de trabalhadores em equipamentos sociais previstas na presente lei são financiadas através do Orçamento de Estado, sendo os respetivos montantes transferidos para a Segurança Social.
  2. A celebração dos contratos de trabalho, nos termos previstos no artigo 4.º e quando esteja em causa o exercício de funções em equipamentos sociais abrangidos por Acordos de Cooperação com a Segurança Social, é considerada no âmbito do respetivo Acordo de Cooperação a entrar em vigor em janeiro de 2021, devendo refletir o valor correspondente aos montantes despendidos com a remuneração dos trabalhadores em causa.

Artigo 6.º

Alteração à Lei n.º 11/2007, de 19 de janeiro

Para a prossecução do previsto no artigo 3.º é alterado o n.º 6 do artigo 31.º da Lei n.º 11/2007, na sua redação atual, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 31.º

(…)

  1. (…)
  2. (…)
  3. (…)
  4. (…)
  5. (…)
  6. O desenvolvimento da ação social concretiza-se, no âmbito da intervenção local, pela responsabilidade da administração direta do Estado na criação e gestão de respostas públicas, sem prejuízo de respostas complementares concretizadas pelo estabelecimento de parcerias, designadamente através da rede social, envolvendo a participação e a colaboração dos diferentes organismos da administração central, das autarquias locais, de instituições públicas e das instituições particulares de solidariedade social e outras instituições privadas de reconhecido interesse público.»

Artigo 7.º

Entrada em vigor

  1. A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos com o Orçamento do Estado subsequente, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
  2. Compete ao Governo a criação de condições para que a presente lei produza efeitos em 2021, considerando a disponibilidade orçamental para o ano económico.
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