Declaração de Ângelo Alves, membro da Comissão Política do Comité Central e da Secção Internacional, Conferência de Imprensa

65 anos depois de Hiroshima: a Cimeira da Nato em Lisboa, novos perigos para a paz

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Há 65 anos o mundo testemunhou um dos mais hediondos crimes contra Humanidade. 6 e 9 de Agosto - os dias em que Hirsohima e Nagasaki foram reduzidas a cinzas após o lançamento, pela primeira vez na História, de duas bombas atómicas - são duas das mais negras páginas da História Mundial que não devem nem podem ser esquecidas.

O bombardeamento de Hiroshima e Nagasaki não foi uma obra do acaso, e muito menos uma necessária estratégia militar para garantir a vitória dos Aliados na II Guerra Mundial. O lançamento de duas bombas atómicas sobre populações civis foi uma premeditada e criminosa decisão do imperialismo norte-americano visando a demente afirmação da sua supremacia militar e tecnológica e a sinalização da sua política de crescente confrontação com a então União Soviética e de início da chamada “guerra fria”.

O acto de relembrar o crime de terrorismo de Estado cometido pelos EUA contra as populações mártir de Hiroshima e Nagasaki não é, para o PCP, um simples tributo às vítimas do horror nuclear. Para o PCP, relembrar Hiroshima e Nagasaki é acima de tudo manter viva a memória do holocausto nuclear - para que dele se retirem todas as lições - e reafirmar a importância crucial da luta contra o militarismo, o imperialismo e a guerra, pela paz, o desarmamento, a resolução pacífica dos conflitos e a cooperação entre os povos.
Hiroshima e Nagasaki foram uma trágica demonstração de quão longe pode ir o imperialismo na utilização do militarismo e da guerra como parte da sua estratégia de dominação económica e geoestratégica.

Hoje, passados 65 anos, num quadro internacional marcado pelo aprofundamento da crise estrutural do capitalismo, pelo brutal aprofundamento da exploração dos trabalhadores e dos povos, por sérias derivas anti-democráticas, pela ingerência externa e ataques à soberania dos povos, por crescentes rivalidades inter-imperialistas e por complexos processos de rearrumação de forças no plano internacional, a realidade demonstra que infelizmente o militarismo, a guerra e a agressão, continuam a ser instrumentos centrais da estratégia imperialista.

A ofensiva militarista protagonizada pelas principais potências mundiais e pela NATO assume hoje um carácter global e multifacetado. Desmentindo a propaganda e as palavras fáceis da “mudança”, do “diálogo”, da “contenção” e da “diplomacia” que marcaram a eleição de Barack Obama e a atribuição ao Presidente norte-americano do prémio Nobel da Paz, a actualidade internacional é marcada pela intensificação das guerras imperialistas, nomeadamente no Iraque e no Afeganistão; pelo escandaloso aumento das despesas militares - segundo os últimos dados disponíveis a despesa militar aumentou em plena crise económica internacional 6% entre 2008 e 2009 e 49% entre 2000 e 2009, atingindo o valor recorde de 1,5 Biliões de Dólares –, pela consolidação e aprofundamento de blocos-político militares agressivos como a NATO, pela militarização acelerada de blocos como a União Europeia e por uma perigosa teia de acções estratégico-militares visando vários países e povos.

O PCP acompanha com extrema preocupação os diversos focos de tensão que caracterizam a actual situação internacional e que são indissociáveis da política de ingerência e militarismo dos EUA e da NATO: No extremo oriente com as recentes manobras militares sul coreanas e dos EUA nos mares Amarelo e do Japão e com as reiteradas afrontas à China, como com a venda de armamento a Taiwan; na América Latina com as recentes provocações à Venezuela, a reactivação da IV Esquadra dos EUA, a instalação de inúmeras bases militares norte-americanas na Colômbia e outros países da região e com as ocupações militares de facto do Haiti e da Costa Rica e o golpe de Estado nas Honduras; e, muito especialmente, no Médio Oriente, com as recentes provocações israelitas na linha azul entre o Líbano e Israel (que provocaram a morte a vários soldados libaneses e a um jornalista membro do Partido Comunista Libanês a quem o PCP presta sentida homenagem), com a actuação impune de Israel prosseguindo a sua política de terrorismo de Estado contra o povo palestiniano e contra aqueles que com eles se solidarizam, ou ainda com a extremamente perigosa escalada contra o Irão a pretexto do alegado perigo nuclear, ignorando-se recentes e importantes passos da diplomacia como o acordo de troca de combustível nuclear entre Irão, Turquia e Brasil.

As acções e crimes dos EUA e NATO em toda a zona do Médio Oriente e Ásia Central, alguns das quais recentemente confirmados com a divulgação de documentos militares norte-americanos, configuram um perigosíssimo quadro numa das mais tensas regiões do Mundo, e desmascaram por completo as campanhas de reabilitação da imagem do imperialismo norte-americano e da NATO dos últimos dois anos. Não é com a profusão de matanças de civis e outros crimes de guerra, com o continuado apoio e fornecimento militar a vários países da região, Israel incluído, com a manutenção da ocupação do Iraque e a utilização de armas proibidas nesta guerra de agressão, com a intensificação da guerra no Afeganistão, com as crescentes ameaças ao Irão e agora ao Paquistão, com o descarado apoio à política de terrorismo de Estado e de provocação internacional de Israel, com o silêncio cúmplice face ao mais que provado arsenal nuclear israelita, que se pode contribuir para a paz na região.

Se os EUA e NATO estivessem de facto interessados numa real política de desarmamento não usariam o artifício da instrumentalização do Tratado de Não Proliferação – cuja conferência de revisão se saldou por muita propaganda dos EUA mas por decisões muito limitadas – para servir a sua estratégia de pressões e ingerências contra países da região como o Irão e a Síria. Se EUA e NATO estivessem de facto interessados no desarmamento nuclear não insistiriam - como está previsto no que se conhece dos elementos centrais do novo conceito estratégico da NATO a ser aprovado na cimeira de Lisboa em Novembro - na manutenção de um poderosíssimo arsenal nuclear (num total combinado de mais de 10.000 ogivas nucleares) passível de ser utilizado em ataques militares, não insistiriam no estacionamento de armas nucleares norte-americanas em diversos países da Europa - numa acção que contraria frontalmente um dos três pilares do TNP – e não avançariam para decisões, como a recentemente tomada pelo Reino Unido, de vender tecnologia nuclear à Índia, País não signatário do Tratado de Não Proliferação.

Se por parte dos EUA e da NATO houvesse um real desígnio de desarmamento nuclear teriam então de começar por reduzir significativamente o seu próprio poderio nuclear, teriam que pôr fim às ocupações e às guerras de agressão numa das zonas mais instáveis do Mundo, teriam de garantir ao povo palestiniano o direito à sua pátria livre e independente e teriam que pressionar Israel a declarar e eliminar o seu arsenal nuclear, condição primeira e essencial para uma desejada, e há muito defendida pelas forças progressistas de todo o Mundo, Zona Livre de Armas Nucleares no Médio Oriente.

Mas tal não está a acontecer. E não acontece porque a questão nuclear, como o provou Hiroshima e Nagasaki não é separável da situação internacional e das opções de fundo do imperialismo. Não acontece porque, num período de intensa crise e de perda de peso relativo das principais potências capitalistas mundiais, o militarismo continua a afirmar-se como a outra face da globalização económica capitalista e a NATO confirma-se como a polícia de choque das principais potências capitalistas mundiais. Não acontece porque os EUA e a NATO instrumentalizam o direito internacional e usam as instituições internacionais como a ONU e o seu Conselho de Segurança, não para consertar posições, alcançar consensos e contribuir para o desanuviamento internacional, mas para impor os seus interesses e estratégia.

É num quadro extremamente complexo e perigoso para os povos do Mundo e para a Humanidade que se realizará em Portugal a Cimeira da NATO. Prevista para Novembro deste ano, ela terá três objectivos essenciais: Amarrar os seus membros ao atoleiro militar em que se transformou a guerra do Afeganistão e à decisão de incrementar ainda mais os gastos militares com esta e outras guerras; Aprovar um novo conceito estratégico abertamente agressivo, de intervenção global da NATO sob qualquer pretexto, conferindo-lhe um leque de missões e objectivos que apontam para a sua sobreposição em relação à própria ONU, elevando-se assim este bloco Político-Militar a um novo patamar como instrumento de ingerência e de agressão a nível mundial; e por último envolver os membros da NATO no projecto de instalação de sistemas antimíssil na Europa, decisão que a ser concretizada representaria o fim do equilíbrio estratégico nuclear ainda existente entre as duas principais potências nucleares mundiais.

E é neste quadro e tendo em conta o perigo que os objectivos da cimeira da NATO representam para os povos do Mundo que o PCP está fortemente empenhado em desenvolver, por ocasião desta cimeira em Portugal, um forte movimento popular de luta pela paz e contra a política militarista e agressiva da NATO. Política que infelizmente, e numa acção contrária ao sinal da Constituição da República Portuguesa, o Governo português apoia, como o demonstra aliás a decisão de receber mais uma cimeira da guerra no nosso País.

65 anos depois de Hiroshima e Nagasaki, O PCP apela a todos os amantes da paz, aos trabalhadores, aos democratas, à juventude e ao povo português em geral que se mobilizem em torno da Campanha “Paz Sim, Nato Não” que congrega mais de 100 organizações e que face ao conclave do militarismo e da guerra em Portugal elevem bem a voz em defesa da paz, do desarmamento, da cooperação e da amizade entre os povos. Será a luta dos povos que melhor garantirá o sucesso da conhecida frase “para que nunca mais aconteça”.

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