O Sistema de Ensino Superior Público português tem sido fustigado desde há décadas por uma política de subfinanciamento, que resulta numa clara limitação das suas potencialidades. A retórica da “competitividade” e da “atratividade” tomou posse da política de Ciência e Ensino Superior servindo sempre, afinal de contas, apenas como pretexto para que o Estado se demita gradualmente das suas funções perante as instituições, para que sejam essas instituições forçadas a recorrer a captação de receitas próprias que, na esmagadora maioria são resultado da cobrança de propinas. Ao mesmo tempo, a ausência de uma política estratégica para o Sistema Científico e Tecnológico Nacional, que defina claramente o papel e missão das Universidades, Politécnicos e Laboratórios de Estado, contribui para que essas instituições disputem financiamento e tarefas com prejuízo para todas e para o país.
A rede pública de ensino superior em Portugal tem mostrado, apesar das dificuldades, ser capaz de elevar a qualificação da população e traduzir-se em ganhos de desenvolvimento regional que de outra forma seriam impossíveis de alcançar. A prova, porém, de que a oferta pública de ensino superior se situa ainda aquém das necessidades, é a proliferação de oferta privada um pouco por todo o país. Muitos continuam a ser os que, impedidos de entrar na rede pública, recorrem ao Ensino Superior Particular e Cooperativo. A diminuição da dimensão da rede pública, a contração dos recursos ao seu dispor, não geraria evidentemente menor procura nem menor dispersão territorial do universo estudantil, mas apenas uma ainda maior e crescente substituição do Ensino Público por Ensino Privado. Tal assimetria é agravada pelo facto de, em muitos casos, a rede pública de ensino ter sido profundamente influenciada por fatores pouco ajustados, nomeadamente a disputa de financiamento que conduziu ao surgimento de oferta formativa de forma desarticulada e norteada por objetivos de captação de alunos.
O Partido Comunista Português defende um sistema unitário para o Ensino Superior Público, um modelo de dignidade, qualidade e financiamento iguais para missões diversas, entre instituições ou mesmo entre unidades orgânicas de uma mesma instituição.
Ao contrário, os sucessivos governos e o atual Governo do PSD/CDS vêm executando uma política de aprofundamento da diferenciação. PSD e CDS, seguindo as orientações que já presidiam ao anterior Governo PS, pretendem agora orientar o Politécnico para as formações curtas, de especialização, até aqui tidas como ensino pós-secundário não superior. Uma tal política não se traduzirá na elevação da cultura científica da população, nem na capacitação dos indivíduos para fazer frente à situação económica e social que o país atravessa, mas antes na sua fragilização ante a ditadura do mercado que se consolida. O estreitamento da formação, a conversão dos politécnicos em institutos de formação profissional de banda estreita, no seguimento dos cursos profissionais do ensino secundário, é uma opção que tem como objetivo apenas satisfazer as necessidades de um mercado de trabalho desequilibrado, na medida em que não existe uma política de desenvolvimento, de aposta na industrialização do país, na agricultura e nas pescas e de dinamização da economia.
O PCP defende uma política de independência nacional, de aposta na produção e na valorização do trabalho e das suas componentes científicas e técnicas. Para que essa política seja possível, é necessário assegurar uma rede pública de ensino superior público que responda às necessidades do país, bem como às necessidades de uma economia orientada para o bem-estar de todos os portugueses. Tal política tem no Ensino Superior Público, Universitário e Politécnico, um dos eixos centrais.
A rede pública deve pois atentar às necessidades regionais e nacionais e ser dotada dos recursos necessários para que não seja forçada a sobreviver pela via de tarefas que não são matriciais e fundamentais. A Universidade e o Politécnico devem pois ter assegurada a sua capacidade e vitalidade pela via do Orçamento do Estado, deixando a prestação de serviços para o mundo empresarial, público ou privado. Da mesma forma, deixando as funções de soberania ou de prestação de serviços na área das “outras atividades de Ciência e Tecnologia” para os laboratórios, principalmente para os Laboratórios do Estado. A investigação, a criação e difusão do saber e da tecnologia devem ser cumpridas pela Academia, dotada que seja dos meios para o fazer.
O problema do Ensino Superior Público em Portugal não é a dispersão da rede – aliás, adequada ao território – nem tampouco a falta de sinergias entre instituições. O principal problema do Ensino Superior Público em Portugal é o seu subfinanciamento e a real incapacidade de consolidar uma massa crítica estável para a alimentação das necessidades do Sistema Científico e Tecnológico Nacional e da Economia. A insularização do sistema, a competição entre instituições, a sua total subordinação aos preceitos retrógrados de Bolonha e a mercantilização do conhecimento são resultados práticos da política de direita que vem despedaçando a rede pública de ensino superior.
Nesse Sentido, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português propõe a rutura com a política de destruição do Ensino Superior Público e uma verdadeira aposta no conhecimento e na tecnologia como passos para a superação dos problemas estruturais do país, colocando a rede de ensino superior a funcionar como uma verdadeira rede e não como um mapa de instituições isoladas e em competição constante e centrando essa articulação na capacitação das instituições para cumprirem efetivamente o seu papel na elevação da qualificação dos portugueses.
Assim, a Assembleia da República, nos termos regimentais e constitucionais em vigor, recomenda ao Governo que:
1. Estabeleça um plano estratégico de investimento no Ensino Superior Público que eleve gradualmente o financiamento público das instituições até à total supressão da necessidade de pagamento de propinas em 5 anos;
2. Estabeleça um plano de metas nacionais de qualificação, discutido e elaborado com todas as instituições e comunidades educativas, que sirva também de base para a majoração do financiamento das instituições;
3. Assegure o carácter unitário do Sistema de Ensino Superior Público, sem prejuízo das diferentes missões do Universitário e Politécnico;
4. Promova um amplo e profundo debate nacional sobre a distribuição social, económica e geográfica das instituições de ensino superior público, privilegiando a rede pública, assegurando que nenhuma instituição pública seja encerrada enquanto persistir similar oferta particular ou cooperativa.
Assembleia da República, em 3 de maio de 2013