Em nome do Partido Comunista Português quero saudar e agradecer a todos os que participam nesta sessão evocativa do nascimento de Urbano Tavares Rodrigues, esse homem de cultura, escritor, professor e militante comunista, nascido há 100 anos.
Uma figura incontornável da literatura portuguesa, em todos os domínios da escrita – do jornalismo ao romance, passando pela novela, pelo conto, teatro, poesia, crónica, ensaio, viagens – fosse qual fosse a forma, os valores humanos que norteavam a vida de Urbano marcaram sempre presença.
Um homem cuja generosidade transparecia em cada momento, como tão bem retratou Manuel Gusmão.
Desde as críticas de teatro, onde se forçava “a encontrar aquele mínimo que merece o respeito pelo desamparo de quem se expõe”, até às apresentações e prefácios a livros de estreantes, “na tentativa de acalentar a pequena centelha de talento, de promover os gestos de uma criatividade possível”.
Nasceu em Lisboa, mas cedo, ainda criança, a sua família instala-se em Moura, no Alentejo.
Nesse Alentejo que é marca indelével na sua criação, mas também no criador, na sua obra literária e nas suas opções políticas e partidárias.
Urbano conheceu muita coisa, aprendeu e viajou, mas foi no Alentejo que deixou sempre o mais fundo de si.
Nas palavras do próprio: «O que é bem certo é que o prazer da escrita tenho-o conhecido sobretudo ao evocar, ao reinventar, ao escrever o Alentejo, o que pode parecer paradoxal, já que algumas destas estórias são negras, dramáticas, como o destino do povo junto ao qual cresci e com quem abri os olhos para a vida.»
Com pouco mais de 20 anos começa a trabalhar no Diário de Notícias e, enquanto jornalista, trabalha ainda no Diário de Lisboa e n’O Século.
O seu primeiro livro de ficção, “A Porta dos Limites”, é publicado em 1952.
O seu primeiro romance, “Bastardos do Sol”, é publicado em 1959, ano em que é eleito para a Direcção da Sociedade Portuguesa de Escritores.
No Congresso da Comunidade Europeia de Escritores, em Roma, denuncia a destruição da Sociedade Portuguesa de Escritores pela PIDE, na sequência do prémio atribuído ao livro “Luuanda”, de Luandino Vieira, então preso no Tarrafal.
Com uma actividade política desde cedo na sua vida, em 1947 participa na greve académica de solidariedade com os estudantes de Medicina.
Participa nas campanhas eleitorais do General Norton de Matos e de Humberto Delgado.
Urbano Tavares Rodrigues foi um dos escritores com mais livros apreendidos pela polícia política.
Viria a sofrer várias prisões ao longo da década de sessenta, em todas elas submetido a brutais torturas da PIDE e chegando a cumprir perto de 5 meses de isolamento em Caxias.
Como José Casanova escreveu no Avante! quatro dias após a morte de Urbano Tavares Rodrigues, «nem perseguições, nem ameaças, nem prisões, nem torturas, o fizeram abrandar, sequer, a sua prática de resistência».
Em 1969, na campanha eleitoral que pretendia simular eleições democráticas, participou na lista da Comissão Democrática Eleitoral de Beja e nesse mesmo ano adere ao Partido Comunista Português.
E é em pleno fascismo e em plena guerra colonial, numa altura em que os amantes e lutadores pela paz corriam tantos riscos por lutarem contra a guerra e pela solidariedade e amizade entre os povos e trabalhadores de todo o mundo, que Urbano Tavares Rodrigues participa activamente em acções do Conselho Mundial da Paz e do Conselho Português para a Paz e a Cooperação.
Viria a aderir ao Conselho Mundial da Paz e em 1971 participou na importante Conferência de Bruxelas, preparatória da Conferência de Helsínquia sobre a Paz e o Desarmamento.
Militância pela paz que se constitui um exemplo de profunda e séria actualidade.
Hoje, como então, o imperialismo não olha a meios para justificar e prolongar a guerra e o massacre.
Hoje, como então, a defesa coerente, séria e firme do PCP pela paz, contra a guerra, pela solidariedade, amizade, cooperação entre os povos de todo o mundo, no respeito pelo direito internacional e pela Carta das Nações Unidas e da Acta Final da Conferência de Helsínquia, revela-se não só justa como uma necessidade cada vez mais urgente.
Hoje, tal como naquela altura, os Povos precisam de paz e não da guerra, e aproveitamos para daqui enviarmos uma forte, calorosa e sentida saudação aos povos de todo o mundo e, neste momento em particular, ao povo heróico da Palestina, instando o Governo, de uma vez por todas, a reconhecer o Estado palestiniano, e a pautar a sua acção pelo respeito da Constituição da República Portuguesa, pelo cumprimento das resoluções das Nações Unidas, agindo em prol do cessar-fogo permanente e pelo fim da guerra.
Num momento em que a escalada armamentista e os riscos reais de um conflito de larga escala, com todos os perigos e desenvolvimentos que daí poderiam decorrer, é a altura certa para lembrar a acção, o exemplo e a luta pela paz levada a cabo por Urbano Tavares Rodrigues, um exemplo que hoje nos motiva e inspira.
Depois de ter sido obrigado, na sequência do apoio à candidatura de Humberto Delgado, a abandonar o cargo de assistente na Faculdade de Letras de Lisboa, onde começou a leccionar em 1957, após o 25 de Abril Urbano Tavares Rodrigues foi convidado a regressar.
Teve uma intervenção activa no processo revolucionário e na luta em defesa das conquistas da Revolução.
Foi candidato à Assembleia Constituinte pelo PCP.
Integrou o Sector Intelectual da ORL do PCP e foi candidato a deputado pelo círculo da emigração.
É eleito presidente da direcção da Associação Portuguesa de Escritores em 1980, e, dois anos depois, preside ao II Congresso de Escritores Portugueses.
Em 2002, para além da homenagem que teve na Festa do Avante!, recebeu o «Prémio Vida Literária», da Associação Portuguesa de Escritores.
Uma atribuição que começou por partir, no ano anterior, da iniciativa e proposta de um grupo de mais de 120 escritores.
À entrega não foram alheios uma série de factores, dos quais são apenas exemplo a longa e permanente criação literária, então já superior a 70 títulos, o exercício como crítico literário em numerosas revistas e jornais culturais, a participação em congressos de Literatura em numerosos países, ou ainda a integração em inúmeros júris de prémios literários.
Merecido reconhecimento de uma figura que permanece ímpar no nosso panorama cultural e literário.
Esta sessão acontece na véspera de o Governo ser demitido e num quadro marcado pelos graves problemas sociais que se reflectem nos baixos salários, no Serviço Nacional de Saúde, no direito à habitação, nas mais variadas esferas da nossa vida, em que a Cultura está longe de ser excepção.
A Cultura continua a ser esquecida, desvalorizada e ameaçada.
Tantas e tantas estruturas culturais, elegíveis, sem apoio.
Tantos e tantos trabalhadores da Cultura afectados pelos baixos salários, pela precariedade, pelos horários desregulados, e tantas outras dificuldades.
Nenhuma manobra orçamental, mesmo que sustentada numa enorme operação de propaganda, consegue apagar a realidade, e a realidade esta aí, está aí e bem expressa na sub-orçamentação crónica da Cultura.
Não nos conformamos com esta situação, estamos empenhados, assim como o estão os agentes da cultura, em alterar o caminho, em mudar a política no que diz respeito também à produção e fruição culturais.
Uma política nova, cuja necessidade e urgência se comprova todos os dias e que será tão mais rápida a implementar quanto maior for a força do PCP e o desenvolvimento da justa e necessária intervenção e luta.
O momento é de agir, de lutar, de afirmar e reforçar o PCP e a CDU.
No próximo dia 10 de Março é uma oportunidade para fazer a mudança, é uma oportunidade de votar e reforçar a CDU.
Podem desdobrar-se em sondagens, podem tentar traçar linhas disto ou daquilo, podem construir todos os cenários que quiserem, que a única linha real e na vida de todos os dias, é a que separa os que defendem os interesses dos grupos económicos e dos seus 25 milhões de euros de lucros por dia e os que defendem a alternativa pelo aumento geral dos salários, aumento dos salários para todos os trabalhadores e em particular para os 3 milhões que ganham até 1000 euros por mês.
É a linha entre a banca e os seus 12 milhões de euros de lucros por dia e os milhões de pessoas cada dia mais apertados, a fazer todos os sacrifícios para aguentar a sua habitação e o seu pequeno negócio ou empresa.
É a linha que separa a opção de entregar 8 mil milhões de euros públicos para os grupos privados do negócio da doença, e a alternativa de salvar o Serviço Nacional de Saúde, fixar profissionais e responder às necessidades dos utentes.
É a linha que separa a política ao serviço dos 5% mais ricos que concentram 42% da riqueza criada e o dia-a-dia da vida difícil dos dois milhões que estão na pobreza, centenas de milhar de crianças e dos 72% dos reformados com pensões abaixo dos 500 euros.
É a linha que separa os que tratam a Cultura como algo de secundário, os que apostam na mercantilização, que colocam entraves à criação e fruição, que apoiam e condenam ao desaparecimento estruturas e projectos culturais e a alternativa com vista a 1% do PIB num futuro próximo e que defende um Serviço Público de Cultura.
A linha fundamental de todos os dias e que aí está é a que separa as contas certas de uns poucos e a incerteza na vida de todos os dias de muitos.
É esta a grande linha divisória, o grande confronto, a grande escolha que está colocada no dia 10 de Março.
Agarremos pois esta oportunidade, reforçando a CDU com mais votos, mais percentagem, mais eleitos.
Em plenas comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, esse que é um dos momentos maiores da História do nosso povo, desse que é justamente o acontecimento comemorado, festejado, sentido e acarinhado pelo nosso povo, ganha ainda maior significado marcarmos presença nesta homenagem a um de entre tantos construtores de Abril, daqueles que sempre defenderam os seus valores, que combateram a reacção e a contra-revolução, que participaram, ergueram e protegeram as conquistas consagradas na Constituição.
Lembremos o exemplo e o legado de Urbano Tavares Rodrigues, que sempre esteve “ao lado dos que levam pancada”.
E estaria, como esteve, até ao fim da vida, “do lado dos fracos contra os fortes”.
É com eles, ao seu lado, todos os dias, nos locais de trabalho, nas fábricas, nas empresas, nas instituições, nas escolas, nos centros de saúde, nos serviços públicos, nas ruas, que defenderemos os seus direitos laborais, sociais, económicos, políticos e culturais.
Cá estamos e lá estaremos, com eles, ao seu lado, todos os dias, na defesa dos interesses e dos direitos de quem trabalha, de quem trabalhou, de quem produz a riqueza, de quem sofre as discriminações, dos tais que levam pancada, dos tais que têm sido enfraquecidos e explorados por uma minoria que se acha dona disto tudo, mas que estão a construir a unidade, ganham consciência da sua força, ganham a consciência de que tal como afirmou Urbano, “o grupo é o começo de tudo aquilo que um homem só, fechado na sua prisão, nunca pode realizar”.
E é esse grupo, esse colectivo que mais cedo ou mais tarde tomará nas suas mãos o destino das suas vidas.