Sr. Presidente
Sras. e Srs. Deputados,
1. Um Orçamento fraco com os fortes, forte com os fracos
Com esta proposta de Orçamento do Estado, este Governo mostra mais uma vez a sua opção de ser forte com os fracos, e fraco com os fortes.
Exemplo maior está na Habitação: ao decidir acabar com o travão nas rendas, o Governo vai permitir e subsidiar o maior aumento dos últimos anos nas rendas; quase uma renda a mais no final do ano.
Forte com os fracos e fraco com os fortes – e por isso, não admira que tenha o aplauso do PSD, do CH e da IL, que foram logo elogiar o fim do travão à subida das rendas.
Também no crédito à habitação, o Governo faz o que a direita faria: todas as medidas anunciadas deixam a banca exatamente na mesma: a lucrar, e muito, à custa do sufoco das famílias! A aproveitar ao máximo esta política de juros do BCE insana, errática, a que o país foi amarrado com a submissão ao euro.
Mas não é só na habitação. Também nos Salários.
Agora, além do Orçamento do Estado ser sujeito ao “visto prévio” de Bruxelas, o Governo incorporou a obrigação do “visto prévio” das confederações patronais, a que chama de “acordo de rendimentos”, e onde, em troca de salários que não chegam para as necessidades básicas, se garantem mais benefícios fiscais para as grandes empresas.
Mesmo a CIP, sem assinar, garantiu presença neste Orçamento com a sua proposta demagógica de legalizar os “pagamentos debaixo da mesa”, que ataca a sustentabilidade da segurança social, mas que acima de tudo é um ataque a cada trabalhador, que com este desvio dos salários para os prémios, fica mais desprotegido, mais sujeito a arbitrariedades, e com menos descontos na sua carreira contributiva.
Lá está a proposta da CIP, depois de vocalizada no Parlamento por PSD, Chega e IL, vertida, mais coisa menos coisa, neste Orçamento da maioria absoluta do PS.
Nas pensões, mesmo somando os vários aumentos, até aqueles que o Governo não queria fazer, a verdade é que o proposto não cobre nem metade do aumento dos últimos dois anos dos preços dos bens alimentares, para onde se dirige todo o rendimento de quem tem pensões mais baixas.
Os preços aumentam, nos combustíveis: e o Governo nada faz para travar as margens de refinação da Galp, que está a lucrar quase 4 milhões de euros por dia!
Os preços aumentam na alimentação: e o Governo deixa que os donos do Pingo Doce e do Continente lucrem 2,5 milhões por dia!
A fortuna de alguns é a miséria de muitos – e num momento em que se agravam os contrastes entre uma minoria privilegiada e o sufoco da vida da maioria trabalhadora, o Orçamento podia e devia fazer uma opção para reverter este rumo.
E aqui devia entrar a política fiscal. A função redistributiva da política fiscal. É preciso aliviar os impostos sobre quem trabalha ou trabalhou, sobre os rendimentos mais baixos e intermédios; mas ao mesmo tempo, é preciso tributar os lucros realizados no país, acabar com benefícios fiscais para o grande capital.
Não vemos isso: os benefícios fiscais até se alargam; e o alívio fiscal deixa de fora uma grande parte da população com rendimentos mais baixos, ou com muitas despesas dedutíveis, que pouco ou nada vão ver desta alteração no IRS, uma vez que o Governo foi atrás do PSD e decidiu deixar de fora qualquer alívio no IVA da energia. Fraco com os fortes, forte com os fracos, também na política fiscal.
2. Um Orçamento irresponsável e nada prudente
O Governo tem apresentado este Orçamento com ares de prudência, responsabilidade, as chamadas contas certas. Mas a política do Governo tem sido tudo menos acertada, tudo menos prudente, tudo menos responsável.
Tudo menos acertada, porque falha constantemente na execução orçamental. Em 2022, foram 1.400 milhões de investimento público por executar; em 2023 foram 1.200 milhões. Investimento que fica a faltar nas escolas, nos hospitais, nos centros de saúde, na ferrovia, na habitação, nos transportes, nos serviços em geral.
E por isso esta é uma política que é tudo menos prudente. É que deixar investimento público por fazer, quando ele é tão necessário, é comprometer as gerações futuras com investimentos que, não sendo feitos no momento certo, vão sair mais caro.
E é uma política tudo menos responsável, porque tem a irresponsabilidade de o fazer no preciso momento em que, mais do que nunca, é preciso salvar os serviços públicos.
E em particular na Saúde. A irresponsabilidade do Governo em recusar soluções que fixem médicos e outros profissionais, tem dado espaço ao cerco dos grupos privados, que levam os médicos para degradar o SNS e ficarem com cada vez maior domínio sobre os cuidados de saúde.
Também na Educação, a irresponsabilidade do Governo em continuar a negar o tempo de serviço aos professores, entre outros, tem contribuído para que muitos se afastem da carreira docente, o que origina a falta de professores nas escolas.
3. Um Orçamento que continua a empobrecer o país
Este Orçamento, pelas escolhas que faz, continua a empobrecer o país.
O crescimento anémico previsto para 2024, de 1,5%, é o resultado deste modelo de baixos salários, baixa incorporação tecnológica, desindustrialização e monocultura do turismo, abdicação de uma aposta na produção nacional.
De uma política que esquece os sectores produtivos e as micro, pequenas e médias empresas, que não são apoiadas nem protegidas, e por isso são esmagadas pelo domínio monopolista dos grupos económicos da energia, dos combustíveis, da banca, da grande distribuição.
É o resultado das políticas neo-liberais, das privatizações, que este Governo insiste em continuar no caso da TAP.
É o resultado da submissão às imposições da União Europeia e do Euro.
É o resultado de uma política orçamental que tem como prioridade absoluta uma redução demasiado acelerada do défice e da dívida, que é apresentada como um grande trunfo, mas que é na verdade um enorme fator de atraso, porque é feita à custa de deixar investimento público por fazer.
O país precisa de romper com estas opções, que atrasam a economia, que expulsam os jovens, que empobrecem quem trabalha, que degradam os serviços públicos, em contraste com os lucros milionários de uma minoria.
Precisa de salários e pensões dignos; de garantir o direito à habitação; precisa de mais justiça fiscal e de serviços públicos universais, como base constitucional para uma maior justiça social e progresso; precisa de mais produção nacional, e para isso de mais soberania: soberania na política orçamental, na política monetária, no controlo público dos sectores estratégicos da economia.
Precisa de soluções para os problemas, e de uma alternativa, patriótica e de esquerda, que o PCP, em confronto com esta Proposta de Orçamento, não deixará de trazer para a discussão na especialidade.