Intervenção de Paula Santos, Presidente do Grupo Parlamentar e membro da Comissão Política do Comité Central, Sessão Pública «A situação do país, o Orçamento do Estado e a política alternativa»

Um Orçamento de empobrecimento para os trabalhadores e o povo

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Camaradas e amigos,

Quando a atual situação do País exige soluções no Orçamento de Estado e para lá dele, para dar resposta aos problemas que afetam os trabalhadores, o povo e o Pais, em especial o aumento geral dos salários para todos os trabalhadores e das pensões, o controlo e fixação de preços de bens essenciais, a tributação dos lucros dos grupos económicos, o reforço dos serviços públicos, designadamente do Serviço Nacional de Saúde, da Escola Pública e da Segurança Social, a garantia do direito à habitação, o reforço do investimento público e a promoção da produção nacional, o Governo opta pelo caminho contrário. Propõe um Orçamento do Estado que não responde aos problemas, como nele incluí um conjunto de opções, extremamente negativas, cujos únicos beneficiários são os grupos económicos.

Mais uma vez o Governo prioriza o défice e a dívida, numa clara submissão aos critérios impostos pelo Euro e pela União Europeia, negando aos trabalhadores, aos reformados e pensionistas a recuperação do poder de compra perdido, negando direitos sociais e o direito ao desenvolvimento do País. A obsessão pela redução do défice e da dívida, representa o desvio de recursos públicos que poderiam e deveriam ser canalizados para reforçar rendimentos, os serviços públicos, para o investimento público e a dinamização do aparelho produtivo.

A proposta de Orçamento prevê para 2023 um crescimento de 1,3% e uma inflação de 4% que poderão não ter tradução na realidade. Na discussão do Orçamento do Estado para 2022, já com o galopante crescimento da inflação, o Governo referia que esta era temporária e não estrutural, para justificar a não adoção das medidas necessárias para a enfrentar. A realidade tratou-se de desmentir o Governo. Em 2023, o Governo pretende aplicar a mesma receita para não ter de avançar com medidas para enfrentar a elevada inflação. Por outro lado, o Governo continua a ignorar o sério risco de estagnação económica ou até mesmo de recessão, como já está a ser apontado para alguns países europeus.

Conjugada com o designado “acordo de rendimentos”, a proposta de Orçamento do Estado prossegue uma opção de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores e insiste na continuada perda de poder de compra dos trabalhadores e dos reformados e pensionistas. É uma proposta que aprofunda o empobrecimento da esmagadora maioria da população, ao assumir, de forma muito evidente a degradação do valor real dos salários e ao impedir o aumento das pensões a que os reformados e pensionistas tinham direito de acordo com a legislação em vigor sobre a atualização de pensões.

Ao mesmo tempo que o Governo prolonga a perda de poder de compra aos trabalhadores e aos reformados e pensionistas, não só tributa extraordinariamente os lucros dos grupos económicos, como decide atribuir mais benefícios fiscais, reduções de IRC e transferência de recursos públicos para as grandes empresas.

Fica claro que no confronto entre trabalho e capital, o Governo opta por favorecer o capital em detrimento do trabalho.

As alterações que introduz no IRS são para passar ao lado dos problemas dos salários. Não atualiza os limites dos escalões do IRS à taxa de inflação, nem avança com o englobamento obrigatório para os rendimentos mais elevados. As alterações no IRC, nomeadamente o alargamento para 50 mil euros para a taxa reduzida de IRC não tem impacto significativo nas micro, pequenas e medias empresas e as medidas de redução de IRC previstas são sobretudo dirigidas às grandes empresas. 

O fim do limite temporal para o reporte de prejuízos fiscais possibilita que os grupos económicos reduzam drasticamente os impostos que têm a pagar. Esta medida constitui uma reversão das medidas adotadas na nova fase da vida política nacional em matéria de justiça fiscal, revelando tal como sempre o afirmámos que o PS não alterou a sua natureza de classe, o que se tinha alterado tinham sido as circunstâncias. 

É uma proposta que agrava as desigualdades e as injustiças fiscais. As contas certas que o Governo tanto se regozija, são as contas certas para os grupos económicos, que se aproveitam da guerra e das sanções, para aumentar a exploração e a acumulação de riqueza à custa do empobrecimento dos trabalhadores e dos reformados e pensionistas.

Como se já não bastasse, o Governo anunciou a afetação de três mil milhões de euros para a energia, dirigidos sobretudo aos grandes consumidores empresariais, deixando de fora as MPME e os consumidores domésticos. Ao invés de intervir sobre o controlo de margens e fixação de preços que impeçam os preços especulativos na energia, o Governo decide transferir 3 mil milhões de euros para os grupos económicos da área da energia, financiamento diretamente os chorudos lucros de empresas como a EDP, Endesa, Iberdrola, GALP, entre outras. 

Só em Parcerias Público Privadas, o Governo prevê transferir 1.274 milhões de euros para os grupos privados. 

É, portanto, uma proposta que evidencia a recusa do Governo em enfrentar os interesses dos grupos económicos.

Nesta proposta não se vislumbram medidas de valorização das carreiras dos trabalhadores da Administração Pública, a contabilização de todo o tempo de serviço nas carreiras especiais, nem a contabilização de todos os pontos para efeitos de progressão. As despesas com pessoal previstas não permitem reforçar o número de trabalhadores nos serviços públicos, onde se verifica uma enorme carência, ao mesmo tempo que opta pela manutenção da precariedade laboral e pelo recurso à externalização de serviços. 

Contrariamente ao anunciado pelo Governo, a proposta de Orçamento mantém baixos níveis de investimento público, face ao que seria necessário para relançar a economia e melhorar os serviços públicos, deixando o essencial do investimento no âmbito dos fundos comunitários. Nem mesmo com baixos níveis de investimento o Governo consegue executar o que estava orçamento em 2022, prevendo execução abaixo em mais de mil milhões de euros. A saúde é um exemplo paradigmático da não concretização do investimento previsto – dos 864,5 milhões de euros para investimento em 2022, foram concretizados até agosto 135,5 milhões de euros e estima executar 383,9 milhões de euros até final de 2022 (pouco mais de 40%), objetivo que se revela ser irrealista, dado que isso significaria executar em quatro meses mais do que foi executado em oito meses.  

Promover a produção nacional, apoiar os setores produtivos, em particular a pequena agricultura e a pesca costeira e artesanal e apoiar as MPME, reduzir a dependência externa e substituir importações, absolutamente estratégico para o nosso desenvolvimento, está ausente desta proposta.

Quando é cada vez mais necessário reforçar a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde, o Governo opta pelo alargamento do financiamento aos grupos privados da doença, com mais de 9.700 milhões de euros para a aquisição de serviços de saúde. Significa isto, que o aumento de verbas no programa da Saúde são para transferir para os grupos privados. Simultaneamente as despesas com pessoal têm só um acréscimo de 2,9%, o que nem sequer cobre o que o Governo anunciou para os salários na Administração Pública, e impossibilita a valorização das carreiras e dos direitos dos profissionais de saúde, assim como a contratação de profissionais de saúde.

Um mês depois do início do ano letivo, cerca de 38 mil estudantes continuam sem ter professor a todas as disciplinas. Perante a enorme carência de professores, na proposta de Orçamento do Estado não constam medidas para assegurar que todos os alunos tenham todos os professores.

Também não contempla respostas para reforçar a ação social escolar no ensino básico e secundário e no ensino superior, num quadro de agravamento das condições de vida das famílias. E quanto ao alojamento estudantil, o alargamento do complemento de alojamento às famílias que auferem o salário mínimo nacional é manifestamente insuficiente.

O Governo insiste na desresponsabilização do Governo na garantia de direitos constitucionais, sobretudo na educação e na saúde, prosseguindo a intenção de transferir encargos para as autarquias.

Na Segurança Social, a proposta não dá resposta à necessidade de assegurar a gratuitidade da creche para todos as crianças, a universalidade do abono de família, assim como o alargamento do acesso e dos montantes de diversas prestações sociais, nomeadamente da prestação social para a inclusão ou do subsídio de desemprego. 

A proposta de Orçamento fica bem longe do objetivo de alocar 1% do orçamento para a cultura. Considerando a medida cultura, no valor de 432,3 milhões de euros, esta representa 0,37% do Orçamento do Estado, bem demonstrativo da desvalorização da cultura pelo Governo.

Face às crescentes dificuldades no acesso à habitação por um lado e por outro os impactos do aumento acelerado das taxas de juro no crédito à habitação e os elevados valores de renda praticados no arrendamento, a proposta de Orçamento do Estado não dá a resposta necessária. O Governo propõe a redução da retenção da fonte das famílias com crédito à habitação, esquece-se é de dizer que no acerto do IRS em 2024, estas poderão ter redução no reembolso ou poderão ter mesmo que pagar

Apesar da propaganda do Governo, a proposta de Orçamento não traz estabilidade, mas sim empobrecimento, não traz confiança e compromete o futuro. Compromisso só mesmo com os interesses dos grupos económicos.

É uma proposta que desvaloriza o trabalho e os trabalhadores, impõe a continuada perda de poder de compra, agrava injustiças e desigualdades, promove a especulação e a acumulação de lucros pelos grupos económicos, prossegue a degradação de serviços públicos e não protege o direito à habitação. 

É por isso uma proposta de orçamento que conta com a oposição do PCP, conta com o nosso firme combate e conta com a nossa intervenção e proposta, para responder aos problemas que afetam os trabalhadores, o povo e o País.

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