Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

«Um crescimento económico sustentável exige uma ruptura com o poder do capital monopolista»

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Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Antes de me referir ao tema em debate neste debate quinzenal, gostaria de saudar as mulheres portuguesas neste dia de comemoração mundial e aproveitar a oportunidade para reafirmar a nossa preocupação quanto à situação da mulher portuguesa, isto é, em relação aos baixos salários, à precariedade, à desregulação dos horários, às discriminações e à violência de que são vítimas no trabalho ou na sociedade, nomeadamente na maternidade, e os seus problemas sempre por resolver. Isto apesar dos avanços alcançados com a Revolução de Abril.

Invoco: há 43 anos negociávamos o contrato coletivo dos metalúrgicos. Tinha lá uma norma em que se afirmava, nessa cláusula, que qualquer mulher que trabalhasse o mesmo ou melhor do que os homens receberia sempre menos 10% no seu salário.

A norma foi revogada, mas, hoje, continuamos a deparar-nos com muitas situações em que as mulheres continuam a ser prejudicadas ao nível dos seus salários.

A igualdade está longe de ser uma realidade na vida da esmagadora maioria das mulheres portuguesas e há um grande esforço a fazer para combater e prevenir as diversas discriminações de que as mulheres são vítimas no trabalho, na família e na sociedade.

Hoje, é dia de comemoração. Que seja tempo de concretização da igualdade.

O Sr. Primeiro-Ministro trouxe aqui a questão do crescimento económico sustentável do País. É uma questão que nos é cara e que temos, nestes últimos anos de regressão e estagnação económica, bem evidente desde a entrada no euro, colocado no centro da nossa intervenção, em contraponto com as orientações que têm sido dominantes no País.

Sim, precisamos de garantir um crescimento económico, mas ele não se garante de forma sustentada com opções políticas que fazem da redução do défice a questão primeira da ação governativa, não se faz à custa da redução do investimento público, do investimento necessário quer para o desenvolvimento de setores produtivos nacionais, quer para assegurar as infraestruturas necessárias ao desenvolvimento do País, não se garante com a desvalorização da força do trabalho como única variável do ajustamento macroeconómico.

O crescimento sustentado precisa da elevação das condições de vida do povo como alavanca desse crescimento.

Os avanços verificados nesta nova fase da vida política nacional foram a prova provada da importância do trabalho e dos trabalhadores.

Não se garante persistindo nas privatizações, na liberalização de mercados públicos, na desregulamentação de mercados onde dominam as PME (pequenas e médias empresas) mantendo o papel dominante do setor financeiro tal como está. Não caminharemos para o crescimento sustentado se não se fizer a rutura com estes eixos estratégicos, o que significa fazer rutura com o poder do capital monopolista.

A proposta do PCP é pelo desenvolvimento, de que uma das dimensões é o crescimento sustentado. Isto significa, do nosso ponto de vista, a promoção da produção nacional e dos setores produtivos, o apoio ao setor cooperativo e às micro, pequenas e médias empresas, com medidas de apoio financeiro ao investimento e de apoio ao crédito, de redução dos preços dos fatores de produção, nomeadamente na energia e nos combustíveis.

Estamos a pensar nos agricultores, estamos a pensar nos pescadores, que aguardam com expectativa a concretização de algumas medidas que estão perspetivadas.

Sr. Primeiro-Ministro, isto significa também a necessidade da valorização dos salários, do combate à precariedade, da reposição de direitos laborais por alteração das leis de trabalho, a defesa do desenvolvimento qualitativo dos sistemas de saúde, do ensino e da segurança social.

Estas são questões importantes para um crescimento económico sustentável, sobre os quais é importante também ouvir o Governo.

2ª Intervenção

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Sim, existe divergência em relação não só ao tempo como ao modo nestes grandes constrangimentos que hoje existem na nossa economia, tais como a questão do peso da dívida e do serviço da dívida, a questão da necessidade de nos libertarmos da submissão ao euro, a questão, fundamental, da necessidade do controlo público dos setores estratégicos, designadamente da banca, e também na política fiscal queremos justiça fiscal e não a continuação da fraude, da evasão do grande capital a caminho de qualquer offshore.

Sobre os 10 000 milhões de euros que voaram do País para offshore, ainda é necessário apurar por completo a extensão do problema, mas o que já está claro é a confirmação da política de dois pesos e duas medidas do Governo PSD/CDS, que esmagou os trabalhadores e o povo com impostos e obrigações, enquanto deixava sair do País aqueles 10 000 milhões sem controlo tributário, sem tratar de ver se havia fraude, crime ou impostos a pagar.

E digo isto, Sr. Primeiro-Ministro, porque os portugueses — e são mais do que aqueles que se possa pensar — não percebem dos mecanismos e dos esquemas que permitem esta situação, mas sentem que isto é uma pouca-vergonha, que nesta matéria o crime compensa.

Por isso mesmo, Sr. Primeiro-Ministro, consideramos que, tendo em conta este sentimento de indignação — justo — da maioria dos portugueses, é tempo de continuar a averiguar sem fugir à questão de fundo.

Bem podemos inventar mecanismos de controlo, de aperto, mas enquanto existirem os offshore, países como o nosso estão sempre a ser sangrados em vida com esta fuga de capitais, com esta fuga dos lucros ganhos aqui, no nosso País.

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