Mais de 170 quadros da Organização Regional de Setúbal deram corpo à reunião preparatória do XX Congresso do PCP, realizada no dia 14 no salão dos Bombeiros Voluntários da Moita com a presença do Secretário-geral Jerónimo de Sousa. Anteontem ao final do dia realizou-se no Porto uma iniciativa semelhante, que abordaremos com detalhe na próxima edição.
Na intervenção que lançou o debate, o Secretário-geral do Partido começou por apelar à necessidade de «criar as condições para uma maior e mais ampla participação dos militantes comunistas» na preparação do Congresso. A actual situação nacional e internacional e as múltiplas e importantes tarefas que tem diante de si impõem que o Partido não se feche sobre si próprio a preparar o Congresso, antes o faça em profunda ligação à vida e à luta dos trabalhadores e do povo. Esta é, aliás, uma característica marcante e distintiva dos congressos do PCP, garantiu Jerónimo de Sousa.
Se a discussão aprofundada dos grandes temas que marcam a actualidade nacional e internacional é fundamental nesta fase de preparação do Congresso, o Secretário-geral realça que não é menor a importância de debater as questões concretas relacionadas com a actividade quotidiana do Partido. Exemplificando, adiantou que quando uma célula analisa a realidade da sua empresa, aponta caminhos para o reforço do Partido junto dos trabalhadores e procura dinamizar a sua unidade e luta está a dar uma notável contribuição para a preparação do Congresso.
Da mesma forma, acrescentou, a avaliação sobre o papel da comunicação social no condicionamento da opinião, na mistificação sobre a situação do País e do mundo e no silenciamento do PCP e na deturpação das suas posições terá que ser acompanhada por uma outra discussão: a do reforço e aproveitamento dos meios próprios do Partido, a sua imprensa e propaganda. «Se a “mensagem” do Partido não passa, não é pela forma, é pelo conteúdo», afirmou, garantindo que «temos que contar sobretudo com as nossas próprias forças».
Estas e outras questões estão presentes na «resolução do Comité Central sobre a realização do XX Congresso», que baliza o debate no Partido na primeira fase de preparação do Congresso, que prossegue até final de Maio. Para Jerónimo de Sousa, este não é um «documento fechado, que os militantes ou apoiam ou não apoiam, como acontece noutros partidos». Pelo contrário, a resolução do CC contém as «matérias centrais para o debate inicial no Partido», a partir do qual serão construídas as Teses – Projecto de Resolução Política (que será uma vez mais objecto de profundo debate pelo colectivo partidário).
Jerónimo de Sousa aproveitou para lembrar que o Partido tem um sólido património de análise e que não parte do zero para preparar os seus congressos. Outros partidos comunistas houve que apresentavam aos militantes «folhas em branco». Na maior parte dos casos, o resultado foi a sua descaracterização.
Teoria e prática
Lançado o repto pelo Secretário-geral, o debate que se seguiu ficou marcado por diversas intervenções onde ficou clara essa ligação entre o geral e o particular, a análise e a resposta, os perigos e as potencialidades, a organização e a luta. Como salientou um dos oradores, a valorização dos princípios orgânicos do Partido, da democracia interna e do trabalho colectivo implica que se dê combate a expressões de discussão «horizontal» fora dos organismos próprios e com expressão pública, como sucede por exemplo nas redes sociais. A coesão e prestígio do Partido a isso obrigam.
Vários foram os militantes que centraram a sua atenção nos já referidos meios próprios de afirmação do Partido. Um deles, referindo-se à campanha de difusão do Avante! que está em curso, garantiu que «a experiência mostra que quando se vende o jornal de forma organizada, junto dos trabalhadores e do povo, se consegue angariar mais leitores». O aumento da venda, da leitura e do estudo da imprensa do Partido é de «importância crucial» na luta do PCP, salientou.
A tentativa de limitação da afirmação do Partido junto dos trabalhadores e do povo, por parte de empresas e instituições públicas, suscitou a intervenção de outro militante, que foi peremptório ao afirmar que «não podemos permitir o condicionamento da nossa actividade». A experiência recente atesta, aliás, que «quando resistimos e não recuamos conseguimos defender os nossos direitos»: a reposição da propaganda retirada pela Câmara Municipal do Montijo e a livre distribuição de propaganda nas grandes superfícies da região (algo que há uns anos era, no mínimo, problemático) aí estão a comprová-lo. O mesmo orador destacou o importante papel desempenhado pelos boletins e comunicados das células do Partido no reforço da unidade e da luta dos trabalhadores.
De meios próprios, mas financeiros, falou uma dirigente regional do Partido, para quem a independência financeira é essencial desde logo para que seja o PCP a decidir que campanhas levar a cabo e quando o fazer. A campanha de fundos para a aquisição da Quinta do Cabo corre a bom ritmo na região, acrescentou, antes de apelar a um derradeiro esforço colectivo para que os seus objectivos sejam plenamente atingidos.
A intervenção junto dos reformados e dos desempregados, e a necessária organização destas importantes camadas sociais, o trabalho específico junto dos trabalhadores da cultura, a acção das organizações locais na dinamização da luta das populações e o papel do movimento associativo popular foram também assuntos abordados.
Resistir para avançar
A situação internacional suscitou um conjunto de intervenções dos participantes na reunião, que destacaram sobretudo a violência da ofensiva do imperialismo, o condicionamento ideológico e a necessidade de reforçar o movimento comunista internacional e o movimento sindical de classe. Sobre todos estes temas falou, no encerramento dos trabalhos, Jerónimo de Sousa, para quem a actual expressão da crise do capitalismo revela à saciedade que este sistema não é o «fim da história» e que o socialismo é a alternativa. «Mas não basta afirmá-lo», garantiu o dirigente do Partido, que realçou a necessidade de, com a luta diária, criar as condições para construir essa alternativa.
Referindo-se ao contributo do PCP para o reforço do movimento comunista, Jerónimo de Sousa destacou a posição dos comunistas portugueses de valorizar mais o que une os diferentes partidos do que aquilo que os separa. Em seguida, revelou aos presentes o imenso prestígio que tal prática granjeou entre muitos outros partidos comunistas, que se têm vindo a aproximar do PCP.
No que respeita à solidariedade a outros partidos e povos, Jerónimo de Sousa recordou os firmes princípios que norteiam o PCP nestas questões, particularmente ao reconhecer aos povos o direito a decidir do seu destino. Se a ofensiva contra Angola parece desenhada a papel químico da que levou à completa destruição da Líbia, os casos do Brasil e da Venezuela estão relacionados com a resposta dos EUA à «ebulição» na América Latina, decorrente dos processos de emancipação nacional em curso na região.
Em qualquer um destes casos, realçou Jerónimo de Sousa, era muito mais fácil e cómodo para o PCP «assobiar para o lado», como fazem outras forças políticas nacionais. Mas para o PCP os princípios não são algo para usar de acordo com as conveniências, são referências estruturantes da sua intervenção.
Reforçar o Partido e a luta
Mas o maior contributo que o PCP pode dar aos povos que resistem ao imperialismo é reforçar-se e reforçar a luta dos trabalhadores e do povo português, sublinhou o Secretário-geral do Partido apontando o carácter dialéctico entre as dimensões nacional e internacional da luta dos comunistas. Se é evidente que a conjuntura internacional condiciona a política interna, é também verdade que os impactos dos avanços progressistas alcançados num qualquer país não ficam confinados às suas fronteiras.
De avanços, ainda que limitados, falou Jerónimo de Sousa ao recordar o processo que conduziu à actual situação política, que ditou a derrota do governo PSD/CDS e tornou possível reverter alguns dos aspectos mais negativos da política seguida nos últimos quatro anos. Em sua opinião, se são naturais e legítimas dúvidas e inquietações acerca deste processo e do papel nele assumido pelo Partido, é também essencial que se pense «onde estaríamos hoje se o PSD e o CDS tivessem continuado no governo».
Reafirmando que o PCP é «fiel à palavra dada», o Secretário-geral do Partido garantiu que o PS sabe perfeitamente que «não conta com o PCP para fazer retroceder a posição conjunta e para atacar os direitos dos trabalhadores». O seu posicionamento, como até aqui, será apoiar o que favorece os trabalhadores e o povo e rejeitar o que os prejudica.
Publicado no Jornal Avante!