Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Sobre a situação da Polícia Judiciária

Sr. Presidente, Srs. Deputados:

Antes de entrar na questão de fundo (reapreciação do decreto da Assembleia da República n.º 204/X), queria chamar a atenção para as condições, que consideramos um tanto anómalas, em que estamos a proceder a este debate.

Porquanto, tivemos conhecimento, e creio que, tal como nós, todos os grupos parlamentares, das propostas apresentadas pelos vários grupos parlamentares no exacto instante em que estávamos a iniciar este debate. Não é uma forma adequada de funcionamento desta Assembleia, até porque, obviamente, tratando-se de uma matéria com a importância que tem a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, é indispensável que os grupos parlamentares tenham a possibilidade de apreciar as propostas apresentadas, pelo menos com alguns segundos de antecedência, e isso não aconteceu; já a sessão tinha começado quando as propostas foram distribuídas.

Acontece que há propostas que não se limitam ao expurgo da inconstitucionalidade declarada pelo Tribunal Constitucional mas que, de certa forma, repõem o debate na especialidade. Nós também consideramos que até seria aliciante proceder de novo ao debate na especialidade, mas não é esse o nosso propósito nesta sessão. Esta sessão foi feita, efectivamente, para que a Assembleia pudesse expurgar dois artigos que foram considerados inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional.

Quanto a outros aspectos fundamentais do diploma, reafirmamos a nossa oposição, que foi expressa, aliás, aquando do debate na especialidade e até durante o debate na generalidade.

Consideramos que esta é uma má lei orgânica da Polícia Judiciária e vamos manter esse juízo definitivo mesmo em face do expurgo proposto pelo PS, que é um expurgo minimalista. Do nosso ponto de vista, aquilo que o PS aqui propõe para expurgar a inconstitucionalidade é manifestamente insuficiente.

Consideramos, como aliás dizia a proposta que apresentámos aquando da discussão na especialidade, que não apenas as competências das unidades orgânicas da Polícia Judiciária devem ser estabelecidas por decreto-lei. Também não vemos razão nenhuma para que a respectiva sede e área geográfica de intervenção não sejam estabelecidas nesse mesmo diploma. Não há razão nenhuma para que haja uma distinção, de forma a que, por um lado, o diploma de competências tenha de ser feito por diploma legislativo, como o Tribunal Constitucional, e muito bem, impõe, e, depois, que a sede, a área geográfica e outros aspectos relativos a essas unidades orgânicas sejam estabelecidos por diploma do governo, que fica isento de qualquer fiscalização parlamentar.

Portanto, mais uma vez, o Governo insiste na sua linha de querer isentar questões fundamentais, opções decisivas para o funcionamento da Polícia Judiciária da fiscalização que compete a esta Assembleia efectuar.

Assim, não vemos razão nenhuma para que o Governo não insira na mesma disposição relativa às competências das unidades orgânicas as respectivas sedes e áreas geográficas de actuação. Ou seja, o Governo teima no erro que fez com que esta matéria viesse a ser declarada inconstitucional, insiste no seu propósito de governamentalizar a Polícia Judiciária, fazendo por esquecer a importância decisiva desta força de segurança, desta polícia de investigação criminal para o próprio regime democrático.

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