Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Tribuna Pública «Salvar o SNS, Garantir a todos o direito à Saúde»

Salvar o SNS, garantir a todos o direito à Saúde

Ver vídeo

''

Estamos aqui reunidos, no Dia Mundial de Saúde, numa iniciativa integrada na Acção Nacional em defesa do Serviço Nacional de Saúde que o PCP está a realizar em todo o País.

Estamos aqui para defender uma das mais importantes conquistas de Abril, neste mês em que se comemoram os 48 anos da Revolução. Uma conquista, o Serviço Nacional de Saúde, que foi inscrita na Constituição e tem sido, ao longo das últimas décadas, o instrumento essencial para garantir o acesso à saúde da população. Foi responsável pela melhoria exponencial dos indicadores de saúde, desde a mortalidade infantil à esperança média de vida, da generalização da vacinação ao acesso a medicamentos essenciais.

Estamos aqui hoje para afirmar que há forças para defender o Serviço Nacional de Saúde do ataque sistemático a que tem sido sujeito e para exigir a sua recuperação e a manutenção do seu carácter geral e universal, devendo caminhar para ser efectivamente gratuito.

O PCP não falta à luta pelos direitos dos portugueses. E não faltará à defesa do Serviço Nacional de Saúde.

O acesso aos cuidados de saúde não pode ser um negócio, um bem que se compra e vende, disponível para quem tem dinheiro e inacessível para os restantes. A saúde é um direito, um bem essencial à vida.

Estamos a viver uma situação, bem patente nos testemunhos que aqui ouvimos, de avolumar das dificuldades do SNS. Isso não acontece por acaso. Acontece porque sucessivos governos, dirigidos pelo PS e pelo PSD, aplicaram políticas para o seu enfraquecimento, abrindo caminho aos grupos económicos privados.

Os grupos económicos privados na saúde sustentam o seu lucro à custa das carências de resposta dos serviços públicos e da transferência directa de recursos do orçamento do SNS e de outras entidades públicas. Só para os hospitais privados as transferências do Estado aumentaram 300% nos últimos 20 anos.

Entretanto as condições de funcionamento do Serviço Nacional de Saúde têm vindo a degradar-se.

Faltam profissionais de saúde, desde médicos e enfermeiros a outros técnicos, administrativos e auxiliares. As suas carreiras são desprezadas, os seus direitos desrespeitados e as remunerações são baixas. O subfinanciamento da saúde é uma constante. Aumenta a descoordenação e a desorganização nos serviços de saúde. O investimento é mínimo e por isso continua a haver instalações degradadas, falta de equipamentos e de materiais.

Nos cuidados primários de saúde, não podemos continuar a ter utentes e profissionais de primeira e de segunda categoria, consoante integrem Unidades de Saúde Familiar ou unidades de formato convencional. Não podem continuar a faltar nos centros de saúde instrumentos mínimos de diagnóstico como um simples raio-x ou meios para a realização de análises clínicas. Precisamos que se concretize a atribuição de médico e enfermeiro de família a todos os utentes, a toda a população, o que hoje não acontece em relação a mais de um milhão de pessoas. Precisamos que o atendimento seja fácil e rápido e que seja possível telefonar e ser atendido.

Nos hospitais, precisamos de mais profissionais, mais investimento em equipamentos e também nos edifícios. Precisamos de recuperar as listas de espera nas consultas, nos exames, nas cirurgias e nos tratamentos. É necessário inverter a desastrosa política de redução de camas de internamento nos hospitais públicos – mais de 4 mil nos últimos anos – que impede uma melhor resposta à realização de cirurgias e dificulta o trabalho dos serviços de urgência. Não é por acaso que, ao mesmo tempo, as camas dos hospitais privados tenham aumentado quase na mesma quantidade.

A propaganda da privatização da saúde quer-nos fazer crer que os privados são melhores na prestação de cuidados de saúde do que o serviço público. Só que os privados recebem os doentes que lhes convêm, nas condições por si determinadas, enquanto que o serviço público deve responder a todas as valências em todo o território para toda a população. Já os privados, quando o caso é complexo, enviam-no para o hospital público. Por outro lado, à medida que se desviam recursos do SNS para os grupos económicos privados, reduzem-se os recursos para a recuperação dos serviços públicos, agravando ainda mais a situação existente.

Quanto mais se entrega a saúde aos privados, mais se põe em risco a saúde da generalidade da população. Muitos ficarão de fora. Não é possível continuar a aumentar as transferências para o setor privado e ao mesmo tempo garantir um Serviço Nacional de Saúde universal e de qualidade.

Estamos num País onde a população já paga muito pela saúde. Em 2019, o pagamento directo de cuidados de saúde pelas pessoas, que na sua maioria resulta de taxas moderadoras e de recurso ao privado por falta de resposta do público, atingiu 40% do total dos gastos.

Muito negativo é também o processo em curso de transferência para os municípios de responsabilidades na área da saúde, com recursos muito inferiores aos necessários, que vai traduzir-se numa ainda maior desresponsabilização do Estado e em condições diferenciadas de acesso aos cuidados, em função das decisões ou dos recursos municipais, desrespeitando a universalidade que a Constituição estabelece como princípio.

De uma coisa temos a certeza. É de que não há melhor forma de defender o direito à saúde dos portugueses do que reforçar o Serviço Nacional de Saúde.

Para isso é absolutamente vital que se garantam, nos hospitais e centros de saúde, os profissionais de saúde necessários para a prestação dos cuidados à população. Isso faz-se valorizando as suas remunerações e carreiras e garantindo boas condições de trabalho.

Precisamos de preservar os médicos e enfermeiros que todos os dias vão abandonando o Serviço Nacional de Saúde, desiludidos com o seu funcionamento e desesperados com as condições de exercício da profissão. Precisamos de atrair muitos dos que saíram e sobretudo os que se vão formando, ano após ano, a quem falta o incentivo para ingressarem no SNS.

Com este objectivo, o PCP acabou de entregar na Assembleia da República três importantes Projectos-de-Lei, que contemplam:

- a implementação do regime de dedicação exclusiva, com carácter opcional, com o aumento em 50% da remuneração base e 25% da contagem de tempo para a progressão na carreira, garantindo desta forma uma remuneração digna, progressão efectiva e condições de trabalho;

- o alargamento de incentivos para a fixação de profissionais de saúde em áreas carenciadas, como o é, nos cuidados primários de saúde, esta região da grande Lisboa onde nos encontramos, com centenas de milhar de pessoas sem médico de família;

- a contagem de todos os pontos para efeitos de descongelamento das carreiras que abrange todos os trabalhadores da Administração Pública.

Estes instrumentos, para além de melhores instalações e equipamentos, são determinantes para que venhamos a ter efectivamente um médico e um enfermeiro de família para todos os cidadãos, promessa sucessivamente não cumprida por vários governos.

Só com mais profissionais de saúde valorizados e motivados podemos salvar o SNS!

O PCP propõe igualmente a aquisição imediata dos equipamentos necessários aos hospitais e centros de saúde, entre os quais aparelhos de raio-x, ecógrafos, TAC ou ressonâncias magnéticas. Uma grande parte das transferências financeiras do SNS para os privados são motivadas por falta de capacidade própria para realizar um conjunto de exames que, com maior eficiência, mais conforto para os utentes e menores gastos, poderiam ser realizados nos serviços públicos. Muitas destas aquisições estavam incluídas no Orçamento do Estado para 2021, por exigência do PCP, e não foram, no fundamental, concretizadas pelo Governo do PS.

O PCP exige que o Ministério da Saúde e o Governo concretizem os investimentos na construção de hospitais e de centros de saúde há muito previstos e adiados, com fortes prejuízos para o atendimento das populações e as condições de trabalho dos profissionais.

Sabemos que só com a luta convergente dos profissionais e das populações se pode salvar o Serviço Nacional de Saúde. É essencial unir esforços para defender esta conquista essencial para o povo português. Sabemos que a existência de um Governo de maioria absoluta coloca especiais exigências à luta por uma política patriótica e de esquerda, por uma política que defenda o direito à saúde, tendo em conta até as especiais responsabilidades do PS, ao longo das últimas décadas, no enfraquecimento do SNS.

Mas a verdade é que com a nossa luta, o esclarecimento e a mobilização das populações, o envolvimento dos trabalhadores da saúde, temos condições para alcançar este objectivo fundamental.

Defender o Serviço Nacional de Saúde é uma exigência do presente e do futuro. Uma exigência da democracia e da justiça social. O PCP cá estará para travar esta batalha!