(projecto de lei n.º 508/XI/2.ª)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
As dificuldades que os portuguesesatravessam, nomeadamente as provocadas pela diminuição dos rendimentos e pelo aumento do custo de vida, exigem que se olhe com muita atenção para os custos das famílias, principalmente para aqueles que lhes são ilegitimamente impostos.
Como todos sabemos, o sector que mais carrega o orçamento familiar dos portugueses é o da saúde. O desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde assume forma no encerramento de serviços e no corte nos apoios para transportes, na crónica falta de meios humanos, na entrega de serviços a entidades privadas que os gerem não com o objectivo de promover a saúde, mas de obter lucros e na «descomparticipação» intensa de medicamentos, habitualmente mascarada de «diminuição de preços» quando na verdade significa um maior gasto.
Os custos com a saúde são, pela acção deste Governo do PS, tendencialmente mais caros e
tendencialmente menos solidários. Quem pode pagar vai ao privado, quem não pode aguenta.
As taxas moderadoras, neste contexto de aumento dos custos com a saúde, representam um acréscimo efectivo para os portugueses.
O novo ano trouxe o aumento da maioria das taxas já existentes em percentagens que podem ir acima dos 4%, valor muito acima da inflação prevista, mas também trouxe novas taxas, como as aplicadas a alguns procedimentos de radiologia, que têm valores superiores a 20 €.
E, se os valores impostos às pessoas não são suficientes para justificar a revogação das taxas, não é infelizmente difícil encontrar outros argumentos para o fazer.
As taxas moderadoras cada vez mais e mais caras contrariam o princípio constitucional de que o acesso à saúde é tendencialmente gratuito.
Neste momento, não só é pago como é tendencialmente cada vez mais caro!
A introdução de taxas com a intenção de moderar o acesso aos cuidados de saúde assume que os portugueses consomem cuidados de saúde de que não precisam.
A utilização racional e necessária do Serviço Nacional de Saúde, que se conseguiria através de eficaz estruturação dos cuidados de saúde primários, é tentada, ao invés, com recurso à punição financeira. Os portugueses pagam mais e não têm melhores cuidados de saúde.
Mas o verdadeiro grande objectivo das taxas moderadores, assumido por Correia de Campos depois de ter sido ministro da saúde, é habituar os portugueses a pagarem para terem acesso aos cuidados de saúde.
Isto foi assumido por alguém que tinha sido governante num governo de um partido que «enche a boca» a falar no Estado social.
Estas são razões bastantes para que o PCP, que sempre esteve contra a introdução de taxas moderadoras e que, em consequência da sua posição, já outras vezes aqui propôs a revogação das mesmas, mais uma vez o volte a fazer, tendo agora também como justificação o agravamento das dificuldades daqueles que têm como fonte de rendimento o seu trabalho ou a sua reforma.
E não se argumente que quem paga é quem pode e que quem não pode não paga. A maioria dos que podem não recorre ao Serviço Nacional de Saúde e a linha que separa os que podem dos que não podem foi ridiculamente empurrada para baixo por este Governo, que se diz de esquerda. É imperativo que, por respeito àqueles que mais sofrem com uma crise pela qual não são responsáveis, se eliminem as taxas moderadoras de acesso aos cuidados de saúde.
(...)
Sr. Presidente,
Quero fazer somente dois comentários.
A Sr.ª Deputada Carla Barros bem pode dizer que o PSD impôs limites à aplicação das taxas moderadoras, mas isso não tira ao PSD a paternidade das taxas moderadoras. Por mais limites que lhes imponha, não consegue esconder isso.
Falou também na proposta do PSD para a eliminação das taxas em cirurgia, curiosamente partindo do princípio de que a cirurgia era algo que caía fora da decisão do doente. No entanto, muitas outras taxas caem fora da decisão do doente e em que esse princípio não é aplicado. Mas uma coisa é certa: durante o governo do PSD, as taxas moderadoras para a cirurgia, para as consultas e para as urgências aumentaram entre 30 a 40%.
A Sr.ª Deputada Luísa Salgueiro, pela maneira como fala e pelas questões que coloca, faz parecer que na saúde está tudo maravilhoso, que a saúde está cor-de-rosa. Mas o que
sabemos é que nem sequer é possível contabilizar o número de portugueses que não têm médico de família — há-de andar pelas centenas de milhar —, assim como o número de idosos que não conseguem aviar a totalidade das receitas médicas porque não têm capacidade financeira para isso e das pessoas que deixam de ir à consulta porque não podem pagar os transportes.
É isto que se sente e se ouve todos os dias, além de que as taxas moderadoras continuam a existir, continuam fixadas, e de que vão também aumentar aqueles serviços aos quais já são cobradas taxas, que estão a ser aumentadas acima da inflação. Esta é que é a realidade.