Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

Regime jurídico da educação especial

(projecto de lei n.º 160/XI/1.ª)
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Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
No espírito da Constituição e da Lei de Bases do Sistema Educativo, preconiza-se a escola inclusiva e democrática como incumbência do Estado. Contudo, a política educativa de sucessivos governos, e em especial dos últimos governos do PS, vai no sentido oposto. Exemplo disto são as medidas tomadas na educação especial, em aberto confronto com experiências inovadoras no plano social, nacional e internacional.
O PS impôs o Decreto-Lei n.º 3/2008 e a adopção da classificação internacional de funcionalidade e saúde, excluindo mais de 21 000 alunos do acesso a apoios especializados.
O projecto de lei que hoje o PCP apresenta preconiza uma reforma profunda da escola pública, desde o ensino pré-primário até ao ensino superior, dos currículos, da avaliação, da pedagogia, dos meios humanos, de turmas reduzidas, de formação de professores, de constituição de equipas multidisciplinares com diversas valências técnicas, de equipas multi-profissionais para a intervenção precoce na infância, de adequação dos edifícios e equipamentos, de ajudas técnicas, de financiamentos de acção social escolar orientada para uma efectiva igualdade de oportunidades, de organização e gestão democrática da vida escolar e dos recursos educativos.
Propomos a criação do instituto nacional de educação inclusiva com o objectivo de dirigir e coordenar todos os serviços que se destinam à educação de crianças e jovens com necessidades educativas especiais. Introduzimos um apoio específico para os alunos com necessidades educativas especiais que frequentam o ensino superior público, através de gabinetes de apoio à inclusão. Entendemos que a referenciação dos alunos com necessidades educativas especiais deve ser feita com intervenção dos pais, do docente da educação especial, do director de turma ou qualquer membro do conselho de turma e dos serviços de saúde ou da segurança social. No processo avaliativo do aluno defendemos a colaboração do docente da educação especial sempre que necessária, da equipa multidisciplinar ou da equipa de apoio técnico e de orientação pedagógica do Centro de Recursos para a Inclusão.
A desvalorização do ensino especial é a desvalorização da escola pública. A política de subfinanciamento de escolas e de degradação das condições de trabalho e de redução do número de profissionais do sector reflecte-se com particular gravidade nas crianças e jovens com necessidades educativas especiais. É necessária uma ruptura com esta política educativa e a concretização efectiva da escola inclusiva e democrática.
É esta a proposta que o PCP aqui apresenta e que espera que tenha o acolhimento desta Assembleia.
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Era tão bom, Srs. Deputados do Partido Socialista, que a realidade nas escolas fosse a que «pintaram»!
Era tão bom que a realidade fosse essa! Era tão bom que existissem professores do ensino especial!
Não, não existem em número suficiente.
Era tão bom que existissem professores do ensino especial a acompanhar meninos em turmas com menos alunos, em vez de turmas com mais de 25 alunos! Era tão bom que existissem terapeutas, psicólogos e equipas multidisciplinares a acompanhar todos os alunos com necessidades educativas especiais!
Era bom, mas não é verdade.
Como o PCP conhece o dia-a-dia das escolas, como o PCP reuniu com pais, com alunos, com associações e sabe que a realidade não é esse dia-a-dia «cor-de-rosa», é um dia-a-dia de dificuldades, de alunos que foram afastados das suas casas e têm de percorrer dezenas de quilómetros para poderem usufruir da sua escola de referência, entendemos que é prioritário intervir sobre estes problemas.
Bem podem vir os Grupos Parlamentares do CDS e do PSD dizer que é preciso consensos que os milhares de famílias de alunos com necessidades educativas especiais e os próprios alunos bem podem esperar, enquanto esta situação se degrada e assume níveis de dignidade humana que não podem ser sustentáveis numa democracia.
O PCP visitou, recentemente, a Escola Básica Marquesa de Alorna, onde havia uma auxiliar que tinha como tarefa fundamental acompanhar estes alunos mas também, sob sua responsabilidade directa, tinha o acompanhamento de um corredor de salas e de toda a contingência relativa à gripe A.
Por isso, pergunto aos Deputados do Partido Socialista se, de facto, entendem que a escola inclusiva e democrática é a escola que não é dotada pelo Estado dos recursos materiais e financeiros para garantir a inclusão e a democracia.
É preciso dizer também ao Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata que o Grupo Parlamentar do PCP participa no grupo de trabalho do ensino especial, porque entende que é fundamental, prioritário e também um dever dar contributos nesta matéria, mas também entende que chegou a hora de intervir sobre o problema.
Aliás, o Grupo Parlamentar do PSD não estava preocupado com a extemporaneidade da intervenção quando, na legislatura anterior, apresentou uma apreciação parlamentar deste Decreto-Lei.
Passada uma legislatura é que parece que estão preocupados com a extemporaneidade da intervenção!
O PCP entende que os problemas são actuais e, por isso, é prioritário intervir sobre eles, porque existe vontade política da parte do PCP e de outros partidos para o fazer.
A pergunta que hoje aqui deixamos é esta: assumem os outros grupos parlamentares este compromisso para com os milhares de famílias com alunos com necessidades educativas especiais ou, mais uma vez, vão estar do lado do Partido Socialista a aguardar sentados a aplicação desta reforma, tão necessária à escola inclusiva e democrática?

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