Exposição de motivos
Atualmente e em diversos países da Europa – incluindo na União Europeia – são preocupantes os graves ataques aos valores e direitos democráticos, que se verificam no plano político, económico, social e cultural.
Neste quadro, é particularmente perigosa a campanha que, sob os mais diversos pretextos, visa descredibilizar as conquistas democráticas e direitos históricos alcançados por décadas de lutas. Uma campanha que, utilizando a aparente denúncia dos problemas sentidos pelos povos e escamoteando as suas verdadeiras causas, transporta consigo não apenas a ameaça de maiores derivas reacionárias, mas de conceções e práticas fascizantes – como o discurso contra os partidos políticos em geral ou os sindicatos e outras organizações sociais e políticas. Uma campanha que, sob a falsa capa de ideias que se insinuam como 'inovadoras' e que escondem os seus verdadeiros objetivos antidemocráticos e reacionários, tenta cavalgar e instrumentalizar justas reivindicações e anseios, para melhor expandir a sua influência.
Sabemos que a extrema-direita e o fascismo – que foram derrotados pela luta dos povos no século XX – estão a surgir de novo na Europa.
Em diversos países, forças de extrema-direita – e os seus valores retrógrados – são promovidas por grandes interesses económicos, alcançando importantes resultados eleitorais, sendo que algumas daquelas forças participam já em governos.
Com diferenças e até contradições entre si, estas forças procuram dividendos políticos das consequências das políticas de brutal agudização das desigualdades sociais, de ataque a direitos, de promoção da precariedade laboral e do empobrecimento, de um futuro sem perspetivas e sem esperança.
O ressurgimento da extrema-direita, de forças fascistas, dos seus valores reacionários não é, nem espontâneo, nem inocente. Como a história nos ensina, estas forças são utilizadas – nomeadamente em períodos de crise – por grandes interesses económicos e financeiros para combater aqueles que efetiva, coerente e organizadamente se batem em defesa dos direitos e do progresso social, da soberania, da democracia, da paz.
Só as forças do progresso, as forças que lutam pelos direitos laborais e sociais, bem como pela soberania dos povos, podem ser o bastião da resistência à extrema-direita e ao fascismo e de que só através do fortalecimento daquelas será possível travar-lhes o passo.
É neste quadro político que cada vez mais se requer a mobilização dos amantes da democracia para dar combate ao ressurgimento das conceções e projetos mais reacionários e promover uma participação política que responda efetivamente aos problemas e anseios das pessoas e dos povos que clamam por justiça e paz.
Neste contexto, torna-se imperioso não deixar cair no esquecimento a luta dos antifascistas que dedicaram as suas vidas, e muitos entregue a própria vida, pela liberdade e pela democracia.
Exemplo positivo desta indispensável tarefa de salvaguardar a memória histórica é toda a vitoriosa batalha política para que o Forte de Peniche – prisão símbolo da repressão fascista em Portugal, onde tanto se sofreu e onde tanto se lutou – não fosse transformado numa pousada turística, mas sim num Museu da Liberdade e da Resistência.
Importa também desenvolver semelhante intervenção relativamente a outras prisões onde o fascismo português encarcerou e assassinou vários resistentes antifascistas, como o Campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, ou os Fortes de São João Baptista e São Sebastião, nos Açores, entre outras. Também na Região Autónoma da Madeira existem lugares da memória da resistência e dos resistentes ao regime fascista. O edifício onde a PIDE/DGS, a polícia política do regime, se instalou e desenvolveu toda a sua força repressiva, à Rua da Carreira, na cidade do Funchal, é um dos lugares simbólicos que deve dar lugar a um memorial aos resistentes antifascistas na Madeira.
O edifício onde tem funcionado o Centro de Recrutamento Militar é património do Estado e está desocupado e sem uso funcional. Aquele edifício no centro da cidade do Funchal constitui um amplo espaço que poderá reunir condições, a par da sua referência simbólica que ainda se atribui àquele espaço pelo uso repressivo que teve durante o regime fascista, para passar a ter uma função favorável à memória histórica e à pedagogia democrática. Neste sentido, aquele edifício que ainda está dependente do Ministério da Defesa deverá ser considerado como lugar histórico destinado ao avivar da memória coletiva, onde todos aqueles que nunca viveram o horror do fascismo poderão tomar contacto com aqueles que o combateram e que exortam a continuar a resistir e a lutar pelas liberdades democráticas e pelos direitos conquistados com o 25 de Abril de 1974 – que pôs fim a 48 anos de ditadura fascista em Portugal. Aquele edifício na Região Autónoma da Madeira deverá contribuir para o multiplicar e diversificar iniciativas cívicas em defesa dos valores democráticos.
Na verdade, a Democracia, para que seja defendida, precisa de lugares memoriais do que foram os mais abnegados esforços dos lutadores pela conquista da Democracia no nosso País.
A relevância dos lugares memoriais do antifascismo e a correspondente evocação não se coloca como um ritual saudosista, mas como lugares e momentos altos de afirmação de que o povo português não quer voltar ao passado, aos tempos negros do fascismo.
Assim, manter viva a memória coletiva é tarefa necessária, porque o combate ao perigo do fascismo, com velhas e novas 'roupagens', exige que não se ignorem as lições da História. Precisamos muito da unidade de todos os democratas para que não esmoreça a consciência antifascista perante os enormes perigos com que o mundo está confrontado, pois, só esta unidade e luta comum pode fazer face à extrema-direita e garantir os direitos e as liberdades democráticas aos povos.
É neste contexto, e para a mais elevada afirmação da importância da luta pela Democracia, que se justifica que na Região Autónoma da Madeira possa ser criado um Centro de Documentação sobre a Resistência e os Resistentes Antifascistas.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte
Resolução
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo que:
- Concretize a transferência para a Região Autónoma da Madeira do edifício que é património do Estado, onde tem funcionado na rua da Carreira, na cidade do Funchal, o Centro de Recrutamento Militar e que seja recuperado, requalificado e valorizado, enquanto património nacional dedicado à resistência antifascista e à luta pela liberdade e pela democracia;
- Assegure com o Governo Regional da Madeira que no edifício em causa se efetive a instalação de um memorial aos Resistentes Antifascistas;
- Promova a criação no edifício referenciado de um Centro de Documentação sobre a Resistência e os Resistentes Antifascistas.