Projecto de Resolução N.º 436/XII/-1ª

Recomenda a manutenção e reforço do hospital de S. Paulo em Serpa, assim como uma especial atenção a outras carências da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo

Recomenda a manutenção e reforço do hospital de S. Paulo em Serpa, assim como uma especial atenção a outras carências da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo

Preâmbulo

A petição 71/XII/1ª, pela manutenção e reposição dos serviços do Hospital de S. Paulo em Serpa, descreve bem aquilo que tem sido um processo de encerramento que paulatinamente vai descaracterizando uma unidade hospitalar e sem que haja um momento exato de encerramento, a partir de determinada altura ela não é mais uma unidade hospitalar mas uma outra valência qualquer.

A argumentação inscrita na petição descreve bem as opções que têm vindo a ser tomadas pelo Ministério da Saúde, ao longo de vários anos, e que são assumidas em respostas ao Grupo Parlamentar do PCP e ao pedido de informação da comissão parlamentar no âmbito da elaboração do relatório da petição.

Estas opções políticas, de diferentes governos, conduziram ao encerramento do bloco operatório, da farmácia, de parte dos serviços administrativos, das consultas de especialidade e mais recentemente, do laboratório de análises. Em todos estes encerramentos a argumentação aduzida não indica que os serviços não se justificavam ou que as populações não necessitavam deles.

É, por exemplo, referido que a sala de bloco não cumpria os requisitos técnicos exigidos e que os dois cirurgiões, um faleceu outro aposentou-se. Essas foram as razões que determinaram o encerramento do bloco operatório. Aduz-se à argumentação que a atividade cirúrgica existente não era suficiente para garantir a atualização dos técnicos, o que não é de espantar tendo em conta a situação existente. Mas no concreto, e é isso que importa salientar, o encerramento do bloco operatório aconteceu porque foi essa a opções política, uma vez que a solução poderia ter passado pela requalificação da sala e pelo reforço do número de cirurgiões. Este encerramento não foi fruto de uma inevitabilidade mas de uma opção.

Encerrado o bloco e, consequentemente, o internamento de cirurgia, o hospital de Serpa manteve as consultas de cirurgia e ortopedia com recurso a especialista do hospital de Beja, mas face à carência de especialistas também estas consultas deixaram de se realizar. A problemática do encerramento do internamento de cirurgia e, por essa via, da atividade de cirurgia do hospital e do fim da realização de consultas de espacialidade cirúrgica é relativizada recorrendo à argumentação da distância. O hospital de S. Paulo dista 30 minutos e 30 quilómetros do hospital de Beja, diz o ministério, esquecendo que, podendo o hospital de Serpa dar apoio à sub-região margem esquerda do guadiana, as populações de Amareleja, no concelho de Moura, estão a 60 quilómetros de Serpa e as de Barrancos a 80, o que deita por terra a argumentação da proximidade.

Após o encerramento do internamento de cirurgia este foi reconvertido em internamento de medicina. A partir de 2007 o internamento de medicina foi convertido numa Unidade de Convalescença, passando este tipo de internamento a ser assegurado apenas pelo hospital de Beja. Esta Unidade de Convalescença permitiu uma melhor utilização dos serviços de medicina física e reabilitação. Desde 2009 existem também uma Unidade de Cuidados Paliativos.
Apesar de o ministério continuar a chamar àquela instituição “hospital de Serpa”, neste momento ela é o conjunto de duas unidades, uma de cuidados paliativos, outra de convalescença. Sem descurar a importância daquelas unidades e dos serviços que prestam, denominá-las daquilo que elas não são, pode dar uma noção errada dos recursos disponíveis.

O encerramento do laboratório de análises clinicas do hospital de S. Paulo, mantendo um posto de colheita, foi realizado para otimização da capacidade instalada na Unidade local de Saúde do Baixo Alentejo (ULSBA). Isto é, o laboratório em Serpa tem uma capacidade instalada superior à procura e o laboratório no hospital de Beja está subaproveitado e por essa razão é necessário proceder a uma concentração de serviços. Uma otimização parcial, uma vez que os equipamentos continuam a necessitar de amortização. Uma otimização que afasta serviços de uma comunidade que não tem responsabilidades na decisão sobre o dimensionamento dos laboratórios que foram instalados.

Ainda neste hospital, existe um Serviço Avançado de Urgência, como lhe chama o ministério na resposta ao pedido de informação sobre a petição, ou Serviço de Urgência Avançado, como lhe chama a ULSBA, que é um meio-termo entre no processo de transformação do SAP em SUB. Já não é SAP, mas também não é SUB e não está instalado com todas as valências necessárias a um Serviço de Urgência Básico. Apesar de ter apoio de análises de química seca em permanência, não tem apoio de RX em permanência e tem ao serviço em cada turno apenas um médico e um enfermeiro, ao invés dos dois médicos e dois enfermeiros preconizados para a instalação do SUB. É esse o motivo que leva as entidades responsáveis a classificar estes serviços como Serviço de Urgência Avançada, classificação essa, que não tem correspondente na rede nacional de urgências. Esta situação è comum aos dois Serviços de Urgência Básica que ainda falta instalar no distrito – Serpa e Moura. Como se não bastasse esta indefinição a Reavaliação da Rede Nacional de Emergência e Urgência, da responsabilidade da comissão de reavaliação, preconiza o encerramento do serviço de urgência em Serpa, partindo da premissa que o SUB já se encontra instalado. Se esta situação se confirmasse representaria o encerramento de mais um serviço daquele hospital e mais um retrocesso na prestação de cuidados de saúde no concelho de Serpa.

Não contestamos que a integração do hospital de S. Paulo na ULSBA corresponda a uma necessária racionalização de meios humanos e técnicos, instalações e equipamentos. Não podemos é concordar que essa integração corresponda a encerramento e centralização de serviços, ainda mais no distrito mais extenso do país, que corresponde a cerca de 11% da sua área continental, bastante envelhecido e empobrecido e onde a mobilidade dos cidadãos é uma miragem.

Este desmantelamento do hospital de S. Paulo, em Serpa, não está desligado das dificuldades que as estruturas de saúde enfrentam no distrito de Beja. Orçamentos em que os 78 milhões de euros inscritos no contrato-programa para este ano são manifestamente insuficientes, a que se junta a dificuldade em atrair especialistas clínicos, sendo áreas com a psiquiatria, a anestesia, a medicina interna e a ortopedia especialmente carenciadas, colocam condicionantes às respostas de saúde que é preciso dar a cada dia. E mais uma vez caímos no âmbito das opções políticas, quer quanto ao financiamento do Serviço Nacional de Saúde, quer quanto à falta de uma política de fixação de recursos humanos no interior no país, como já houve outrora o serviço médico à periferia e cujos resultados ainda hoje garantem que muitos cidadãos do interior tenham médico de família.

Cada vez mais se verifica que, aplicar às instituições de saúde lógicas empresariais e por essa via abrir portas para que a saúde se tornasse um negócio, foi um estrondoso erro político.
O desmembramento das unidades e serviços de saúde não pode acontecer como até aqui. De encerramento em encerramento, conclui-se posteriormente que uma unidade está tão amputada que não tem condições para funcionar e aí é reconvertida noutra estrutura. E isto sem o devido planeamento, contra a vontade das populações e ao arrepio da cooperação institucional entre os diferentes níveis de poder, que deve sempre existir.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, a Assembleia da República resolve recomendar ao Governo que:
1. Garanta a existência do Hospital de S. Paulo, em Serpa, enquanto unidade hospitalar, independentemente da existência de outras unidades de prestação de cuidados de saúde;
2. Reforce o hospital de S. Paulo, como unidade hospitalar complementar ao hospital de Beja;
3. Proceda à instalação dos Serviços de Urgência Básica de Serpa e de Moura e rejeite as orientações expressas no documento Reavaliação da Rede Nacional de Emergência e Urgência, na medida em que contrariam decisões recentes tomadas sobre a rede de urgência;
4. Garanta os meios financeiros adequados ao correto funcionamento da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo;
5. Defina uma política de fixação de recursos humanos, nomeadamente especialistas médicos, que permita dar resposta à carência, preocupante, em algumas áreas;
6. Defina, através de um processo de participação das entidades locais e regionais, a rede de estruturas de saúde para o distrito de Beja, numa abordagem que vá da unidade hospitalar à extensão de saúde.

Assembleia da República, em 19 de julho de 2012

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