Projecto de Resolução N.º 108/XVI/1.ª

Recomenda ao Governo a valorização dos baldios eliminando os cortes na elegibilidade das áreas de baldios para efeito de atribuição de apoios

Exposição de motivos

Durante séculos, os baldios forneceram às populações bens e serviços fundamentais à sua sobrevivência no quadro de uma complementaridade entre a agricultura, pecuária e floresta de subsistência, a par do seu uso na pastorícia e na produção agrícola.

Com as mudanças políticas, sociais, económicas e culturais, os baldios, mantendo muitas das utilizações tradicionais, adquiriram novos recursos e potencialidades que fazem deles novas fontes de riqueza das comunidades rurais.

Os baldios mantêm um papel fundamental na conservação da biodiversidade em ecossistemas ancestrais, na preservação de águas e do coberto vegetal e no sequestro de carbono, desempenhando um papel crucial como travão ao despovoamento das comunidades rurais, assegurando e reforçando a vida comunitária e a atividade económica.

A gestão democrática dos baldios pelas populações, tornada possível com a Revolução de Abril, constitui um enorme potencial para o seu melhor aproveitamento e num poderoso entrave à sua alienação, competindo aos compartes administrar com eficiência as potencialidades económicas atuais e futuras destes territórios de propriedade comunitária e assegurar que os largos milhares de hectares de áreas serranas do norte e centro do país sob sua gestão tenham floresta com gestão ativa e assegurem o pastoreio de gado quer dos matos quer do sob coberto do arvoredo , contribuindo ativamente para reduzir o flagelo dos fogos florestais, a erosão das montanhas, para a melhoraria da paisagem, a regulação dos ciclos da água e do carbono, a biodiversidade, a produção de materiais lenhosos, resinas, frutos silvestres, cogumelos, mel e outros recursos e contribuir para o desenvolvimento e a qualidade de vida das populações.

É consensual a importância e o papel que os territórios sob gestão comunitária – os baldios – têm em todas as dimensões (social, ambiental e económica). No entanto, e em matéria de atribuição de apoios no âmbito da PAC, os baldios e os seus compartes saem fortemente penalizados, seja pela forma como as áreas são contabilizadas, seja pelas regras que lhes são aplicadas.

Atualmente no PEPAC, para efeitos das chamadas ajudas diretas à agricultura, as áreas de baldios são apenas contabilizadas para efeitos de pastoreio – são consideradas “prática local”. A estas áreas é aplicado um coeficiente de redução de 50% na elegibilidade, ou seja, por cada hectare declarado só é pago metade.

Aquele coeficiente de redução foi determinado em 2014 pelo Governo PSD/CDS, supostamente para compensar algumas áreas que poderiam ter problemas de elegibilidade, devido à especificidade daqueles territórios. Se nessa altura não fazia sentido a aplicação de tal coeficiente de redução, hoje faz ainda menos, já que em 2023 foi realizado um trabalho de fotointerpretação sobre todas as áreas de baldias candidatas ao pedido único de ajudas (PU), do qual foram expurgados todos os elementos que poderiam causar problemas à sua elegibilidade.

Já as regras impostas pelo Governo português para reconhecer a distribuição das áreas dos baldios servem apenas o propósito de dificultar ainda mais o reconhecimento devido. A obrigação de apresentação de documentos, que ainda não podem ser apresentados porque o ICNF ainda os não analisou/aprovou, a obrigação de submissão de elementos que vão muito além do que é necessário, como, por exemplo, a apresentação do relatório e contas do Baldio, ou ainda a própria obrigatoriedade de apresentação de residência fiscal, que entra em conflito com a definição de comparte presente na Lei, são elementos que dificultam, ou impedem, os baldios de acederem aos apoios a que têm direito.

Acresce ainda que tais áreas não são elegíveis para qualquer eco regime, o que, por si só, representou uma perda no valor da ajuda aos agricultores da ordem dos 70%.

Toda esta situação constitui uma perda brutal nos rendimentos dos compartes que praticam agricultura em zonas de minifúndio e de montanha, num regime silvo-pastoril, e que necessitam do baldio para apascentar os seus animais. Estima-se que só aplicação do coeficiente de redução se traduza numa perda anual superior a 25 milhões de euros que deixam de ser atribuídos aos agricultores nomeadamente da região Norte, sendo, por isso, sonegados à economia das zonas rurais onde existem baldios.

Tal como anteriormente reconhecido, a utilização dos territórios dos baldios, a presença dos compartes e o processo dinâmico de gestão dos territórios comunitários assegurado pelos Agrupamentos de Baldios, são elementos fundamentais para a adequada gestão da floresta, para a presença das “gentes” nos territórios rurais de minifúndio e para a defesa da floresta contra incêndios.

O PCP considera urgente a valorização dos baldios e a reversão dos cortes a que estes territórios estão a ser sujeitos, por via das novas regras impostas pelo PEPAC.

Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais em vigor, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, resolve recomendar ao Governo que valorize os baldios concretizando as seguintes medidas:

  1. Proceder à eliminação do coeficiente de redução da elegibilidade das áreas de baldio em todo o PEPAC, designadamente para as medidas do Eixo A e Manutenção da Atividade Agrícola em Zonas Desfavorecidas;
  2. Flexibilizar as regras de elegibilidade para efeito de apoio dos agricultores que utilizam as áreas de baldio e flexibilizar os procedimentos de reconhecimento da distribuição das áreas;
  3. Permitir a elegibilidade das áreas de baldio aos ecorregimes, ou criar medidas compensatórias à perda rendimento;
  4. Isente as áreas baldias do Pagamento de IMI, qualquer que seja a utilização económica do seu território, em parcelas isoladas ou no seu todo.
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