Projecto de Resolução N.º 1262/XII/4.ª

Recomenda ao Governo a resolução urgente dos problemas com que estão confrontados os Serviços de Urgência

Recomenda ao Governo a resolução urgente dos problemas com que estão confrontados os Serviços de Urgência

Há muito tempo que os serviços de urgência hospitalares estão confrontados com problemas de sobrelotação e rutura. Esta é uma situação que não é nova, não é decorrente dos picos de frio ou calor, ou ainda de invernos ou verões muito rigorosos. Por isso, contrariamente ao que o Governo vem propalando não se trata de uma situação pontual. É como o PCP o tem vindo a afirmar uma situação estrutural e que, como os últimos dois meses o comprovam, tem-se agravado.

A situação das urgências hospitalares não pode ser dissociada, antes decorre, das opções políticas que sucessivos governos e, particularmente o atual, têm feito em termos do desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde por via dos cortes no financiamento e no investimento, do encerramentos de serviços de proximidade, nomeadamente, ao nível dos cuidados de saúde primários, dos Serviços de Atendimento Permanente, das concentrações de serviços e valências hospitalares e pela não contratação dos profissionais em falta, assim como da redução de camas hospitalares.

No decurso desta legislatura, o Governo, prosseguindo a política do anterior executivo, apostou no encerramento e ou redução do horário de funcionamento das unidades de saúde familiar, dos centros e extensões de saúde. Podiam ser dados vários exemplos mas concentremo-nos nos últimos casos conhecidos – encerramento de várias unidades de saúde familiar que estavam a funcionar em horário alargado (USF da Aguda, Gaia; USF Manuel Rocha Peixoto, Braga; USF Novos Rumos, Vizela; USF em Anta, Espinho; USF Terras de Santa Maria, Santa Maria da Feira). Estes encerramentos ocorrem precisamente no momento em que o Governo emite orientações para que os cuidados de saúde primários alarguem o seu horário de funcionamento.

A par da redução dos serviços dos cuidados de saúde primários junta-se a carência de médicos de família. De acordo com os dados oficiais existe mais de um milhão e quatrocentos mil portugueses sem médico de família.

A carência de respostas de proximidade e a falta de médicos de família empurra os portugueses para os serviços de urgência hospitalares
Para a situação de rutura dos serviços de urgência concorre, igualmente, a enorme carência de profissionais de saúde, mormente de médicos, enfermeiros, assistentes operacionais, assistentes técnicos, técnicos de diagnóstico e terapêutica assim como o elevado grau de exaustão a que estes profissionais estão sujeitos, como foi recentemente reconhecido pela Presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares.

O caos instalado nas urgências hospitalares não radica apenas nos factos acima enunciados, resulta claramente da opção do Governo de encerrar camas nos hospitais. Nos últimos anos e, de acordo com a resposta enviada pelo Ministério da Saúde a uma pergunta do GPPCP, houve o encerramento de mais de 900 camas. Camas que, tal como a realidade de todos os dias o demonstram, fazem falta. Sobre a redução de camas, não podemos deixar de mencionar o que foi referido pelo Ministro da Saúde na audição que decorreu na Comissão de Saúde da Assembleia da República. Disse o Ministro que as camas estão nos hospitais e nos respetivos serviços mesmo quando não estão a funcionar. É verdade que as camas estão lá, mas há um aspeto muito relevante que o Ministro omitiu deliberadamente na sua resposta- é que quando as camas são encerradas há imediatamente uma redução no número de profissionais afetos a esses serviços e enfermarias e quando se reativam não é fácil, num espaço curto de tempo, organizar os serviços de molde a completar as equipas de profissionais. A opção de redução de camas é, como aliás tem sido a orientação geral do Governo para as Funções Sociais do Estado e para a saúde em particular cortar e reduzir na despesa.

Tem sido reconhecido por vários profissionais de saúde e pelos administradores hospitalares que os doentes chegam em situações de maior fragilidade e com estados de saúde mais débeis. Estados de saúde que não são unicamente explicados, como o Governo tenta fazer, pelo aumento da idade e envelhecimento da população mas decorrem claramente do facto de os portugueses estarem mais pobres por força da redução dos rendimentos (cortes nas reformas e pensões) que os impede de tomar a medicação que necessitam, de se alimentar convenientemente e até aquecer as habitações.

Para o PCP a resolução dos problemas com que se confrontam os serviços de urgência não se compadece com medidas remediativas, conjunturais e avulsas como aquelas que têm sido enunciadas pelo Governo. A resolução destes problemas exigem respostas e medidas estruturais que têm obrigatoriamente por passar pelo reforço dos cuidados de saúde primários, pela contratação dos profissionais em falta e pela valorização social e profissional dos trabalhadores da saúde integrando-os em carreiras e promovendo a estabilidade, erradicar do SNS e, particularmente dos serviços de urgência o recurso à contratação de empresas de trabalho temporário, apostar na constituição de equipas médicas que integrem profissionais em diferentes níveis de desenvolvimento (médicos internos, médicos especialistas) e dote os serviços de urgência de condições materiais que permitam prestar aos utentes um atendimento de qualidade.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo que:

a) Garanta a estabilidade das equipas de profissionais afetas aos serviços de urgência por via da contratação dos profissionais em falta, integrando-os nas respetivas carreiras e com vínculo público;

b) Melhore as condições de trabalho dos profissionais de saúde, reponha os seus direitos e dignifique as suas carreiras, proporcionando uma efetiva valorização profissional e progressão na carreira, para evitar a saída precoce do Serviço Nacional de Saúde, assim como a sua emigração.

c) Elimine a precariedade e restabeleça o vínculo público a todos os profissionais de saúde que exerçam funções em unidades de saúde do SNS, independentemente do atual vínculo laboral.

d) Desenvolva uma verdadeira articulação entre os cuidados de saúde primários e os cuidados hospitalares de modo a permitir uma resposta mais célere, integrada e eficaz aos utentes do SNS.

e) Garanta a existência de pelo menos um serviço de atendimento permanente por Concelho, mantendo em funcionamento os atualmente existentes e instalando aqueles cuja necessidade se justifique considerando o número de habitantes e as características da população baseadas nos estudos epidemiológicos.

f) Erradique o recurso sistemático e abusivo aos médicos em internato médico para suprir as carências das escalas de serviço de médicos nos serviços de urgência e garanta o funcionamento nos serviços de urgência dos hospitais e centros hospitalares de uma equipa integrada por médicos internos e especialistas, de acordo com as melhores práticas clínicas.

g) Dote os serviços de urgência de condições materiais que permitam prestar aos utentes um atendimento de qualidade.

h) Proceda à reabertura das camas encerradas nos últimos três anos permitindo desta forma que os utentes que necessitem de ficar internados sejam encaminhados para os respetivos serviços evitando que fiquem no serviço de urgência para além do tempo considerado necessário pela equipa médica para observação e realização do diagnóstico.

Assembleia da República, em 13 de Fevereiro de 2015

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