O recurso a empesas de trabalho temporário e ao regime de outsourcing por parte de grandes grupos económicos, de telecomunicações, energia, seguros e finanças, entre outros, para assegurar serviços de centros de contacto, atendimento ao cliente e tratamento de informação tem sido crescente nas últimas décadas, no nosso país e um pouco por todo o mundo. Em Portugal, existem 77 empresas (ACP, Adecco, AdvanceCare, Alphanumeric, Altitude Software, Armatis-lc, Arvato, Avaya, Axa Partners, Bliss Natura, Bosch Communication Center, Brainfocus, Caixa Geral de Depósitos, Chubb, Collab, Concentrix, Connecta, Crédito Agrícola, CTT – Correios de Portugal, Deep Center, Deloitte, DHL Express, Dimension Data, EDP Comercial, EDP Soluções Comerciais, Egor, Emergia, Europ Assistance, Galp Energia, Genesys, GMtel, GO Connection, Goldenergy, Gotelecom, G9 Telecom, Grupês, Happy Work, Hash Technology, Iberdrola, InPar, Jerónimo Martins, Kelly Services, Konecta Portugal, LeasePlan, Lumidee, ManpowerGroup Solutions, Mcall, Medicare, MEO, Metlife, Millenniumbcp, Montepio Geral, Necomplus, Newspring Services, NOS, Novo Banco, Oney - Instituição Financeira de Crédito, OralMED Saúde, Plantronics, Prosegur, Randstad, Reditus, RHmais, Salesforce, Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, SantanderTotta, Seguradoras Unidas, SIBS Processos, Sitel Portugal, Talkdesk, Teleperformance Portugal, Transcom, uCall, Vodafone, Webhelp, Yves Rocher e Zurich), representando 12 setores da economia, cerca de 80 mil trabalhadores, com um volume de negócios de 1.165.901.029€, dados da a Associação Portuguesa de Contact Centers.
O recurso a empresas para subcontratação de trabalhadores tem um duplo objetivo: manter uma política de recrutamento de trabalhadores através de um modelo de baixos salários e precariedade para assegurar necessidades permanentes das empresas utilizadoras, e reproduzir a total desresponsabilização sobre as condições socio-laborais destes trabalhadores. Esta fórmula permite acumular lucros significativos, pois trata-se de assegurar um serviço especializado com custos muito baixos, sempre numa lógica de nivelamento por baixo.
A possibilidade de contratação de trabalhadores com nível de especialização assinalável através de salários muito baixos (próximos do salário mínimo), o não reconhecimento dos direitos existentes em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, a generalização da precariedade e a ausência de qualquer perspetiva de progressão na carreira (que não existe) explica a opção por esta forma de subcontratação por parte dos grupos económicos.
Os lucros das empresas utilizadoras e recrutadoras são proporcionais ao agravamento da exploração, degradação das condições de higiene e segurança no trabalho, intensificação brutal dos ritmos e métodos de trabalho e impactos na saúde física e psicológica dos trabalhadores.
Desde há vários anos, décadas mesmo, o PCP tem denunciado diversos e reiterados problemas, irregularidades e ilegalidades com que têm sido confrontados os trabalhadores dos centros de contacto.
Estes trabalhadores passam anos e décadas a responder a necessidades permanentes de grandes empresas e grupos económicos, sempre mudando entre diferentes empresas de prestação de serviços, sem nunca ter um vínculo efetivo com a empresa a quem asseguram serviços indispensáveis. Outros problemas denunciados pelos trabalhadores e suas estruturas representativas são a transferência constante entre empresas prestadoras de serviços e empresas de trabalho temporário; a repressão e assédio sobre trabalhadores que reivindicam os seus direitos; desrespeito pela antiguidade no posto de trabalho para efeitos de progressão; uso abusivo dos contratos de formação-estágio, que executam tarefas iguais aos operadores; péssimas condições de higiene e segurança no trabalho, problemas de higienização dos headsets, teclados e ratos dos computadores; generalização de problemas de saúde associados a cansaço físico e psicológico, tendinites, otites, amigdalites, doenças músculo-esqueléticas; intensificação de ritmos de trabalho insuportáveis, com tarefas rotinadas e monótonas. Para além disto, uma parte muito significativa dos locais de trabalha funciona em espaços mal iluminados e climatizados, com impactos na saúde física e psicológica dos trabalhadores.
Neste contexto, é determinante assumir como prioritário o combate à precariedade, assegurando que necessidades permanentes das empresas utilizadoras destes trabalhadores não podem ser “terciarizadas”, nem objeto de recurso a empresas de trabalho temporário, assumindo a contratação efetiva de todos os trabalhadores que respondem a necessidades permanentes.
Por outro lado, assumir o respeito integral pelos períodos de pausas e descanso mais longos e regulares, bem como reduzir o horário de trabalho e assegurar ritmos de trabalho adequados ao desempenho das funções. Assim como, assegurar equipamentos e instrumentos de trabalho pessoais e intransmissíveis, higienizados e em condições de funcionamento adequadas.
Por fim, mas não menos importante a criação e regulamentação da profissão de operador de centro de contactos, incluindo reconhecimento das categorias profissionais adequadas, com respetiva formação especializada, garantindo a todos os trabalhadores os meios adequados ao desenvolvimento da sua formação geral e técnico-profissional.
O PCP entende que é inadiável a valorização destes trabalhadores, nomeadamente através do aumento dos salários e de outras compensações remuneratórias que decorrem da natureza das funções e do regime de trabalho prestado, do combate à precariedade, da urgente melhoria das condições de pausa e descanso, das condições de trabalho.
Assim, e tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do Artigo 156.º e nº 5 do artigo 166º da Constituição e da alínea b) do número 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Resolução:
Resolução
1. Proceda à criação e regulamentação da profissão de operador de centro de contactos, incluindo reconhecimento das categorias profissionais adequadas;
2. Assegure que as empresas cumprem a obrigação de assegurar formação especializada e remunerada;
3. Realize uma ação inspetiva em todo o território nacional visando o cumprimento da lei e a fiscalização das condições de trabalho, tomando todas as diligências sancionatórias subsequentes;
4. Elabore no prazo de seis meses, através da ACT, um Relatório sobre condições de Higiene, Saúde, Segurança e Condições de Trabalho no sector dos Call e Contact Center, monitorizando:
4.1. Número de trabalhadores efetivos nas empresas de trabalho temporário e número de trabalhadores nas empresas de outsourcing/prestadoras de serviço;
4.2. Número de trabalhadores efetivos nas empresas utilizadoras;
4.3. Dados desagregados por idade, sexo, categoria profissional, antiguidade, remunerações e vínculo contratual;
4.4. Nível de cumprimento das pausas e períodos de descanso;
4.5. Higiene dos instrumentos e locais de trabalho;
4.6. Cumprimento enquadramento legal relativo à prevenção e reparação de doenças profissionais e acidentes de trabalho;
5. Inste ao reforço dos cuidados de saúde, semestralmente, nomeadamente exames médicos de optometria, oftalmologia, otorrinolaringologia, musculo-esqueléticas;
6. Torne obrigatório assegurar a cada trabalhador equipamento próprio pessoal e intransmissível.
Assembleia da República, 24 de janeiro de 2019