Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"Querem continuar o caminho para o desastre, mas serão impedidos pelo povo"

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[Debate com o Primeiro-Ministro que respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados]

Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Permita-me que volte à questão suscitada pelo anúncio do Sr. Ministro da Economia, de encetar a negociação de um novo programa que, do nosso ponto de vista, de cautelar nada tem e que, a ser concretizado, será um programa da troica sob a batuta de uma dupla: União Europeia e Banco Central Europeu. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro aproximou-se um pouco disso, nesta parte final da sua intervenção, quando relembrou o tratado orçamental, a que junto a governação económica, a Estratégia 2020, ou seja, o espartilho que se coloca a Portugal, em termos de plano, para o futuro próximo.

Mas, ainda assim, permita-me que registe as contradições existentes entre a afirmação do Sr. Ministro da Economia, as suas declarações e as do Vice-Primeiro-Ministro.

Dizia o Sr. Primeiro-Ministro, recentemente, no Algarve, que, depois de junho de 2014, ainda vamos ter cá a troica, que eles vão continuar a aterrar na Portela — creio que foi esta a sua expressão.

O Sr. Primeiro-Ministro disse isso, mas, simultaneamente, o Vice-Primeiro-Ministro, para justificar a carga de sacrifícios que está hoje a atingir os portugueses, dizia que eram sacrifícios que valiam a pena, porque nos iriam libertar, e libertar Portugal, da troica e dos senhores da troica. Estou a citar de memória, mas creio que não estou a falhar muito.

Depois, veio o Ministro da Economia dizer que, enfim, é preciso encetar negociações sobre um programa cautelar e, depois, seguro… — que raio de nome!…
De qualquer forma, Sr. Primeiro-Ministro, quem é que está a enganar quem? É que esta é a questão que se coloca. Pode dizer-se que há acerto total de posições, mas a verdade é que o discurso é diferente.

Do nosso ponto de vista, emende-se a mão, chamemos-lhe o nome que quisermos — «segundo resgate», «programa cautelar», «programa seguro» —, que, no fundo, do que se trata é do reconhecimento do fracasso, da injustiça desta política que está a afundar o nosso País, de que o novo ciclo e a retoma anunciada pelo Governo não passam de propaganda, de que o sofrimento e os sacrifícios que se abateram sobre os portugueses serviram uns poucos, mas não resolveram nenhum dos grandes problemas do País.

Mais um sinal, citando o Sr. Deputado Nuno Magalhães: diz o Eurostat que a dívida pública portuguesa, no 2.º semestre, sobe para 131% do PIB. As estatísticas valem o que valem, mas o Sr. Primeiro-Ministro dirá alguma coisa sobre este sinal.

Aquilo que é importante dizer é que, no fundo, todas estas manobras, estas contradições, estas posições aparentemente antagónicas visam, no essencial, esconder aquilo que está em causa. Procurarão todas as justificações para continuar este caminho para o desastre, de perpetuação da dependência. É isto mesmo que está em causa, Sr. Primeiro-Ministro!

(…)

Sr. Primeiro-Ministro, a explicação que deu foi brilhante: enfim, pode ser que sim, pode ser que não, talvez…

Portanto, ficamos com esta resposta precisa e concisa do Sr. Primeiro-Ministro, que replicou com uma tripla às questões colocadas.

Sr. Primeiro-Ministro, a propósito do Banif, e porque o referiu, o senhor está em condições de garantir que este caso não se irá transformar num novo BPN? Apesar das diferenças — quero aqui sublinhar que o Banif não se trata de um caso com contornos de polícia —, o senhor está em condições de garantir que os portugueses não vão ser chamados de novo a pagar um outro buraco num banco?

Dos 1100 milhões que recebeu do Estado, quanto é que o Banif já devolveu? E o que é que o Governo já exigiu quanto à devolução desse dinheiro?

Sabe, Sr. Primeiro-Ministro, muitas vezes fazemos críticas duras, denunciamos a natureza da vossa política… Um Governo que foi tão célere a cobrar aos desempregados e aos doentes os respetivos subsídios é o mesmo que tem mãos largas, mãos rotas para os amigos. Isso tem um nome concreto: é uma política para servir os grandes, os poderosos, atacando quem menos tem e menos pode!

É por isso mesmo que consideramos que o que este Governo está a fazer é o Estado mínimo para quem trabalhou ou quem trabalha e o Estado máximo para os poderosos, para o grande capital. Isso é que marca a natureza deste Governo.

(…)

Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Retiro a parte dos amigos, mas não retiro a pergunta, porque não me respondeu quanto é que o Banif devolveu ao Estado em relação aos compromissos que assumiu.

Mas gostaria de colocar-lhe uma última questão, mesmo sabendo que não tem tempo para me responder, sobre o facto de termos assistido a manifestações de justa indignação das populações do interior do País, que todos os dias veem desaparecer serviços públicos essenciais para o seu viver e importantes, também, para garantir emprego nas suas terras. Depois de escolas, de centros de saúde, de tribunais, são as repartições de finanças que o Governo pretende encerrar — mais de centena e meia.

Dou-lhe um exemplo, que é próximo da sua terra de origem: em Valpaços, com o encerramento de repartição, as pessoas terão de ir a Vila Real. Sabe bem quanto é que isso custa.

Em Portalegre, das 14 repartições sobrarão 2; em Beja, das 14 repartições sobrarão 2; e temos também o exemplo de Évora.

Poderíamos dar aqui vários exemplos que demonstram, afinal, que com este Governo já não se é só penalizado por razões de origem social, mas também pelo sítio onde se nasceu.

Sr. Primeiro-Ministro, o que é que ganha o País com esta política de desertificação do interior? Porquê esta cegueira que varre tudo e todos, independentemente das consequências? Que conceção tem o Sr. Primeiro-Ministro da coesão social e territorial deste País?

Sr. Primeiro-Ministro, é por isso que nós dizemos tantas vezes que esta política tem de ser interrompida e este Governo travado, senão dá cabo do resto.

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