Exposição de motivos
O sector da pesca em Portugal enfrenta um conjunto diverso de condicionamentos que se têm vindo a traduzir no declínio do sector, com o abandono do seu exercício por muitos dos profissionais.
Parte significativa desses constrangimentos resulta da subalternização demonstrada por sucessivos governos do PS, PSD e CDS-PP nas negociações no âmbito da Política Comum de Pescas, de que resultaram graves efeitos negativos sobre este sector estratégico da produção nacional, impondo restrições à modernização e sustentabilidade da atividade.
Estas condições negativas têm como reflexo um acentuado desequilíbrio da balança alimentar no que concerne ao pescado uma vez que, sendo Portugal um dos maiores consumidores de peixe a nível mundial, tem apresentado um défice da balança comercial de produtos da pesca superior a mil milhões de euros (dados do INE para os últimos quatro anos).
De facto, uma parte muito significativa do pescado consumido em Portugal, resulta de importações, verificando-se uma redução quase sistemática das capturas ao longo dos últimos 10 anos, com o valor de capturas no continente relativo a 2020, a representar apenas 68 % das capturas registadas em 2011, não chegando a atingir as 100 mil toneladas.
De acordo com os dados mais recentes publicados pelo INE, também entre 2011 e 2019, se reduziu em 11 % o número de pescadores inscritos em portos nacionais, com a perda de 1777 pescadores.
Analisando a frota nacional de pesca pode observar-se que nos últimos 10 anos se perderam, no continente, 660 embarcações, com particular incidência para as relativas à pequena pesca, com menos de 12 m.
Este quadro de abandono da actividade piscatória, que se materializa na redução do valor das capturas de pescado, do número de trabalhadores da pesca e do número de embarcações, resulta de um extenso conjunto de factores, tais como a falta de valorização do pescado na primeira venda em lota, a falta de apoio à perda de rendimentos em situações de paragem imposta por questões de defeso ou por contaminação dos recursos, a falta de revisão em tempo adequado das quotas de pesca que integrem a real situação em que os stocks de recurso se encontram, a deficiente oferta de formação profissional na área das pescas, entre outros.
O PCP tem vindo ao longo do tempo a alertar para a situação do sector da pesca local e costeira e em particular para a pesca do cerco, que veio a sofrer cortes acentuados nas quotas de captura de sardinha até 2021, com as oportunidades de pesca a não refletirem quer os resultados dos cruzeiros científicos realizados, quer as observações e experiência dos próprios pescadores, traduzindo-se no descontentamento generalizado nas comunidades piscatórias do cerco.
Esta restrição impôs até 2021 a quase inatividade da pesca do cerco durante mais de metade de cada ano, situação que não é acompanhada nos apoios devidos em resultados destas imposições. Disto é exemplo os períodos definidos para a obtenção da Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca, a qual apenas é assegurada por um período máximo de 60 dias, período claramente inferior ao que tem vindo a ser estabelecido como paragem forçada por razões de defeso.
Sendo certo que a sustentabilidade dos stocks dos recursos piscícolas é fundamental para garantir a médio e longo prazos a manutenção da pesca, é de igual modo imprescindível a adoção de medidas que permitam a sobrevivência do sector, nomeadamente no que se relaciona com a segurança dos rendimentos e manutenção de postos de trabalho.
A intermitência do exercício da atividade não acompanhada pelos adequados apoios no âmbito da salvaguarda de rendimentos, a vigência de regimes de proteção social insuficientes e desadaptados à realidade do sector da pesca, a falta de formação adequada para os profissionais da pesca e a falta de informação quanto ao estado de conservação dos recursos ou a demora excessiva da integração desta informação na definição das oportunidades de captura de pescado, promovem o abandono da atividade e dificultam a captação de novos efetivos que venham determinar novas dinâmicas.
Sendo inegável que o sector da pesca, nomeadamente da pesca local e costeira, é fundamental para a concretização do desígnio da defesa e incentivo à produção nacional, é preciso desenvolver os mecanismos e medidas necessárias à revisão em alta das quotas de pesca para Portugal bem como os regimes de apoio e compensação pela perda de rendimentos associada aos constrangimentos impostos ao sector, quer por via dos longos períodos de defeso, quer por via da inoperacionalidade das barras, impedindo a navegação em segurança.
Nestes termos, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução
Sendo o sector da pesca, nomeadamente da pesca local e costeira, e em particular a pesca do cerco, um dos elementos relevantes para a concretização do desígnio da defesa e incentivo à produção nacional e ao controlo dos desequilíbrios da balança alimentar nacional, é fundamental desenvolver os mecanismos de apoio para a manutenção e o desenvolvimento do sector, pelo que a Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo o seguinte:
- Seja considerada no âmbito do Orçamento do Estado para 2022 a dotação orçamental necessária para reforçar o orçamento do IPMA para despesas de pessoal destinado a garantir e reforçar a investigação científica dirigida ao conhecimento dos recursos vivos marinhos, eliminando a precariedade laboral associada e a garantir, em permanência, a tripulação e acompanhamento científico adequado afeto à operação dos Navios de Investigação associados a este Instituto.
- Seja instituído um regime de apoio à perda de rendimento dos pescadores ao longo da totalidade dos períodos prolongados de impossibilidade do exercício da profissão, quer devido a longos períodos de defeso das espécies, seja por restrições à navegabilidade devido à deficiente manutenção de portos e barras nacionais.
- Seja previsto no Orçamento do Estado para 2022 o desenvolvimento de um Programa alargado de formação financiada para o sector da pesca destinada reforçar os conhecimentos e a constituir uma alternativa à atividade piscatória regular nos períodos alargados em que a pesca se encontra interdita.