Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
Se a experiência do País em matéria de telecomunicações nos ensina alguma coisa, é que as políticas destas décadas, de privatização, liberalização e oligopólio tiveram consequências desastrosas para as populações e os trabalhadores, para a economia e os sectores produtivos, em particular para as micro, pequenas e médias empresas.
Ao entregar um sector absolutamente estratégico às multinacionais, os governos PS, PSD e CDS sujeitaram o país a uma fatura insuportável, desde logo nos custos exorbitantes que são praticados pelas operadoras de telecomunicações. Mas também traduz no plano social – com a precariedade, a subcontratação, o ataque aos direitos de quem trabalha no sector.
Há uns meses passou por esta Assembleia um secretário de estado que, repetindo a cartilha dos grupos económicos do sector, subiu de tom nas ameaças em torno do regulamento do concurso para a introdução do sistema 5G em Portugal, num ataque à ANACOM sem precedentes por parte de um político.
Mais uma vez ficou demonstrado que essa conversa toda da regulação dos mercados (como alibi para as privatizações!), essas homenagens e louvores às entidades reguladoras – tudo isso cai por terra quando as entidades reguladoras não cumprem à risca o guião que está previsto.
É uma pena que o Governo não esteja cá hoje, mas algum dia havemos de saber se esse lamentável documento que é a «estratégia e calendarização da distribuição da quinta geração de comunicações móveis» (Resolução do Conselho de Ministros 7-A/2020) vai ou não ser revogada e substituída por uma estratégia que faça sentido!
É que o Governo, nessa estratégia para o 5G, perante níveis de cobertura, fiabilidade e disponibilidade da rede 4G que estão hoje escandalosamente aquém do que seria exigível, coloca como objetivo nacional nesta matéria assegurar que o 4G venha a cobrir... as escolas e a linha do Norte. Num prazo a determinar! E com contrapartidas de benefícios aos operadores!
Estamos perante uma opção política de total subserviência para com os grupos económicos que hoje dominam o sector, que é absolutamente inaceitável.
Senhor Presidente, Senhores Deputados,
Esta não é nem pode ser uma guerra entre os grupos económicos que dominam o sector e os grupos económicos que querem entrar. O que está em causa verdadeiramente é a defesa do interesse público face ao poder das multinacionais.
As opções políticas de fundo nesta matéria terão necessariamente de ir além dos mecanismos regulatórios em sede de leilão do espectro. O que é urgente e indispensável para o País neste domínio é a reconstituição de um operador público, que seja efetivamente responsabilizado pela definição e concretização de uma estratégia de modernização e desenvolvimento do sector.
O PCP propõe que o Governo:
Aposte na reconstrução do operador público e num serviço público de telecomunicações que garanta uma oferta de qualidade e economicamente acessível nas comunicações telefónicas, eletrónicas e de televisão, ao invés de um suposto “mercado concorrencial” dominado por um oligopólio de multinacionais.
Cancele o leilão do direito de utilização do Domínio Público sobre o espectro radioelétrico, decretando a sua gestão e exploração pública, e desenvolvendo, quando necessário e se necessário, parcerias com o sector privado, mas sem lhes entregar o controlo e gestão das redes.
Desenvolva, a par da introdução em Portugal do sistema 5G, e no aproveitamento dos sistemas existentes, um Serviço Universal de Comunicações Eletrónicas, apontando como objetivo a redução de preços e, no prazo de dois anos, a cobertura total da população nacional para comunicações móveis de voz e a cobertura do serviço de banda larga móvel a 100 Mbps para 98% do território nacional, abrangendo a totalidade da rede ferroviária nacional e dos IP rodoviários.
Impeça a constituição de um monopólio privado no controlo das redes de estações emissoras e de base atualmente em curso; e consolidar no operador público a gestão e o desenvolvimento desse sistema, a par das redes de fibra ótica, cabos submarinos e outros sistemas críticos, com o envolvimento da atual IP Telecom.
Promova a máxima incorporação nacional no desenvolvimento e aplicação das tecnologias a adotar no processo de introdução dos sistemas 5G, desde logo com a participação e envolvimento do Sistema Científico e Tecnológico Nacional, assim como das empresas nacionais.
É indispensável uma mudança estratégica no desenvolvimento do sector das telecomunicações, no contexto da introdução da tecnologia 5G, considerando a soberania e domínio público sobre o espectro radioelétrico. É esse o sentido da nossa proposta.