Intervenção de Paulo Sá, Deputado, Sessão Pública «Por uma política fiscal ao serviço do povo e do País»

«A política fiscal alternativa, proposta pelo PCP ao povo português, rompe com o favorecimento do grande capital e alivia os impostos que recaem sobre os trabalhadores e o povo»

«A política fiscal alternativa, proposta pelo PCP ao povo português, rompe com o favorecimento do grande capital e alivia os impostos que recaem sobre os trabalhadores e o povo»

Caros amigos e camaradas,

Os impostos, além do objetivo central de financiamento das funções do Estado, têm também uma função redistributiva que visa garantir uma repartição mais justa e equitativa da riqueza nacional.

Contudo, a repartição mais justa e equitativa da riqueza nacional por via dos impostos não foi a opção de sucessivos governos de PS, PSD e CDS, que aplicaram uma política fiscal de sentido contrário, de favorecimento dos grupos económicos, das grandes empresas e das grandes fortunas, ao mesmo tempo de oneravam excessivamente os trabalhadores, os reformados e pensionistas, as famílias e os micro e pequenos empresários.

Estas opções da política de direita foram levadas mais longe pelo anterior Governo PSD/CDS que afetou parcelas crescentes dos impostos ao pagamento dos juros da dívida pública, ao financiamento das parcerias público-privadas e às ajudas de Estado à banca privada, com sacrifício do investimento público e do gasto com os serviços públicos e as funções sociais do Estado.

Também do lado da arrecadação dos impostos, a opção do anterior Governo foi a de acentuar o favorecimento do grande capital com a diminuição da taxa IRC e a multiplicação de generosos benefícios fiscais aos grupos económicos e às grandes empresas, enquanto impunha um brutal saque fiscal sobre os rendimentos do trabalho e o consumo das famílias.

Da parte do PCP, esta injusta e iníqua política fiscal mereceu sempre uma forte denúncia e um decidido combate. Opusemo-nos a todas e cada uma das medidas fiscais que acentuaram o desequilíbrio na distribuição da riqueza e apresentámos propostas para uma política fiscal alternativa que, garantindo o financiamento do Estado e o cumprimento das suas funções, em particular das funções sociais, desonerava os trabalhadores e as famílias e tributava o grande capital de forma adequada.

Relativamente à desoneração fiscal dos trabalhadores e das famílias, propusemos em sede de IRS a criação de 10 escalões de tributação do rendimento, a redução significativa das taxas nos escalões mais baixos e intermédios, a eliminação da sobretaxa e o aumento da regressividade das deduções à coleta. Propusemos ainda o englobamento de todos os rendimentos, para garantir que a tributação incidia sobre os rendimentos reais, impedindo que os rendimentos financeiros e prediais muito elevados fossem tributados abaixo do que deviam. Em sede do IVA, propusemos a redução da taxa normal de 23% para 21% e o alargamento dos bens essenciais tributado a 6%, incluindo a energia elétrica, o gás natural e o gás de botija. Quanto ao IMI, defendemos a manutenção de uma cláusula de salvaguarda das famílias que limitasse o aumento do imposto a pagar em cada ano.

Para as micro e pequenas empresas propusemos, em sede de IRC, a criação de uma taxa mais reduzida para lucros mais baixos e a eliminação do pagamento especial por conta e a sua substituição por um regime simplificado de apuramento do lucro tributável. Avançámos, ainda, com propostas de alargamento do regime de IVA de caixa a todas as microempresas e de redução do IVA na restauração para 13%.

Paralelamente a estas propostas de desoneração fiscal dos trabalhadores, das famílias e das micro e pequenas empresas, avançamos também com um conjunto de propostas visando uma tributação mais adequada dos lucros dos grupos económicos, das grandes empresas e das grandes fortunas.

Em sede de IRC, propusemos a reposição da taxa normal de 25% e a criação de uma nova taxa de 35% para lucros acima dos três milhões de euros. Propusemos ainda um conjunto de normas que impedem o planeamento fiscal por parte dos grupos económicos e financeiros, tributando os rendimentos no território em que foram gerados e utilizando os resultados contabilísticos para o apuramento da taxa de IRC e não os chamados resultados ou lucros coletáveis.

Em sede de IRS, propusemos o aumento a taxa do imposto para os rendimentos mais elevados, enquanto no IVA, defendemos uma nova taxa de 25% para bens e serviços de luxo.

Propusemos ainda a criação de novos impostos visando a tributação do grande capital e o combate à especulação financeira: um imposto sobre as transações financeiras e um imposto sobre património mobiliário de valor mais elevado.

Estas e outras propostas do PCP, que conduziriam a uma política fiscal mais justa ao mesmo tempo que garantiriam um reforço da receita fiscal para fazer face às necessidades de desenvolvimento do país, foram sucessivamente rejeitadas pelo PSD e CDS, mas também pelo PS.

Caros amigos e camaradas,

A derrota do Governo PSD/CDS e da sua política de exploração e empobrecimento nas eleições legislativas de outubro de 2015 e o início de uma nova fase na vida política nacional, permitiu, com a intervenção e o contributo decisivo do PCP, alguns avanços em matéria fiscal.

Referimo-nos, por exemplo, à eliminação da sobretaxa de IRS e ao alargamento da dedução das despesas de educação, à redução da taxa do IVA na restauração para 13%, à redução da taxa máxima do IMI para 0,45% e à manutenção da cláusula de salvaguarda, assim como o alargamento da isenção para famílias de rendimentos muitos baixos e à reavaliação do valor patrimonial dos prédios rústicos de maior dimensão em sede de IMI, à redução do Pagamento Especial por Conta a partir de 2017 e a sua eliminação definitiva dentro de dois anos, à introdução de um novo imposto sobre património imobiliário de valor mais elevado e à limitação de alguns benefícios fiscais para o grande capital.

Apesar de positivas e de apontarem no sentido correto, estas medidas são limitadas e insuficientes, ficando aquém daquilo que seria possível e desejável. Não por falta de proposta e intervenção do PCP, mas porque o PS e o seu Governo se recusam a enfrentar os interesses do grande capital e mantêm o país amarrado a todos os constrangimentos e condicionalismos impostos pela União Europeia. Tal opção tem impedido avanços mais significativos em matéria fiscal e mantém, no essencial, as orientações da política de direita.

É preciso avançar mais decididamente na política fiscal, assegurando mais justiça e equidade.

Ainda por corrigir está uma parte significativa do brutal aumento de impostos sobre os rendimentos do trabalho levado a cabo pelo anterior Governo PSD/CDS, que, em apenas um ano, se traduziu num aumento da receita em mais de 3.200 milhões de euros.

A eliminação da sobretaxa foi apenas um primeiro passo, que reverteu apenas cerca de um quarto do saque fiscal; este passo, que avaliamos como positivo e para o qual contribuímos, deve ter continuidade já no Orçamento do Estado para 2018, por via do aumento do número de escalões e da redução das taxas nos escalões mais baixos e intermédios. Tal desoneração deve, na ótica do PCP, ser acompanhada por uma tributação mais adequada dos rendimentos mais altos por via da incorporação da taxa adicional de solidariedade na estrutura de escalões e do agravamento das taxas de IRS para rendimentos coletáveis superiores a 80 mil euros.

Em 2015, no âmbito da reforma do IRS, o anterior Governo prosseguiu o saque fiscal contra os rendimentos do trabalho por via da desindexação do mínimo de existência do salário mínimo nacional e da sua fixação em 8.500 euros. Tal medida constituiu um mecanismo de saque fiscal de efeito retardado, visando apenas os trabalhadores de menores rendimentos. É um mecanismo de efeito retardado porque, com os sucessivos aumentos do salário mínimo nacional, o impacto negativo sobre os rendimentos mais baixos irá crescer até que, eventualmente, quando o salário mínimo atingir um determinado patamar, este mecanismo deixará de produzir qualquer efeito. Esta medida do anterior Governo revela bem a sua opção de classe, pois prejudica seriamente os trabalhadores mais pobres e não afeta, de forma alguma os rendimentos do trabalho de montante mais elevado.

De acordo com uma estimativa, em 2016, os trabalhadores de rendimentos mais baixos terão pago de IRS cerca de 110 milhões de euros adicionais devido à desindexação do mínimo de existência do salário mínimo nacional. Este é o valor, em 2016, do enorme aumento de impostos do anterior Governo dirigido aos trabalhadores mais pobres. Para o PCP, a resposta à situação colocada pelo congelamento do mínimo de existência, já no Orçamento do Estado para 2018, é uma medida elementar de justiça fiscal.

Após o regresso do IVA na restauração para os 13% (ainda que não na totalidade dos bens e serviços do sector) também deveremos caminhar no sentido de reduzir o IVA de bens e serviços essenciais, como é o caso da eletricidade e o gás natural, assim como dos bens culturais, nomeadamente o dos instrumentos musicais.

Por outro lado, é essencial reavaliar a tendência, que se mantém de governos anteriores, de assegurar aumentos de receita fiscal através de impostos indiretos que reduzem rendimento disponível às famílias e retiram competitividade às atividades económicas em geral.

No que diz respeito à tributação mais adequada das grandes empresas, o PCP continuará a bater-se, no imediato, pelo aumento da taxa do 3.º escalão da derrama estadual em pelo menos 2 pontos percentuais.

Pela mão do anterior Governo PSD/CDS, as grandes empresas beneficiaram de uma redução da taxa nominal do IRC, primeiro de 25 para 23%, depois para 21%. Se numa primeira fase, a derrama estadual para lucros tributáveis superiores a 35 milhões de euros foi aumentada em dois pontos percentuais, compensando a descida da taxa nominal também em dois pontos percentuais, numa segunda fase, quando a taxa de IRC desceu para 21% em 2015, o anterior Governo optou por não atualizar o 3.º escalão da derrama estadual. Tal opção traduziu-se num benefício injustificável para as grandes empresas, que, todos os anos, apresentam lucros milionários, de centenas de milhões de euros, podendo e devendo pagar mais impostos.

Para o PCP, o aumento da derrama estadual para estas grandes empresas é uma medida inadiável, que deve ser acompanhada da redução ou eliminação de benefícios fiscais que reduzam o fosso entre lucros tributáveis e lucros contabilísticos.

Noutro sentido, empenhar-nos-emos pela efetivação de uma medida dirigida às micro e pequenas empresas, que o PCP vem propondo há muitos anos e que, na atual fase da vida política nacional, foi, finalmente, aprovada: a eliminação do Pagamento Especial por Conta e a sua substituição por um regime simplificado de determinação da matéria coletável em IRC baseado em coeficientes técnico-económicos. Tal medida é uma reivindicação antiga das micro e pequenas empresas, que fez o seu caminho pela ação persistente do PCP. No período de transição, até à entrada em vigor do novo regime simplificado, também por proposta do PCP, as micro e pequenas empresas verão a sua fatura do Pagamento Especial por Conta reduzida.

Há muito tempo que o PCP vem propondo, como elemento fundamental de uma política fiscal mais justa e adequada às necessidades de desenvolvimento do país, a criação de um novo imposto dirigido ao património de valor mais elevado. No atual quadro político, no Orçamento do Estado para 2017, com o contributo do PCP, avançou já um imposto sobre património imobiliário de valor superior a 600 mil euros, desenhado como um adicional ao IMI. Mas de fora ficou a vertente mobiliária! Entende o PCP que um imposto sobre património não pode deixar de incluir a componente mobiliária. É por esse objetivo que nos temos batido e continuaremos a bater!

Caros amigos e camaradas,

A política fiscal levada a cabo nas últimas décadas acentuou a injustiça na distribuição da riqueza nacional. À diminuição da parcela da riqueza distribuída em salários, acresceu uma redução das reformas e pensões, assim como de apoios sociais. Também os rendimentos dos micro e pequenos empresários diminuíram em consequência de uma fiscalidade que os discriminou negativamente.

A política fiscal alternativa, proposta pelo PCP ao povo português, rompe com o favorecimento do grande capital e alivia os impostos que recaem sobre os trabalhadores e o povo, ao mesmo tempo que garante uma evolução da tributação que permite aumentar o investimento público e assegurar o financiamento adequado das funções do Estado, em particular das suas funções sociais na saúde, na educação, na proteção social e na cultura. É esta política fiscal alternativa que melhor serve os interesses de Portugal e dos portugueses. É por esta fiscal que o PCP continuará a lutar!

  • Economia e Aparelho Produtivo