Projecto de Resolução N.º 304/XIII/1.ª

Pelo Reforço dos apoios aos cuidadores informais

Pelo Reforço dos apoios aos cuidadores informais

A prestação de cuidados de saúde aparece na literatura científica divida em duas tipologias: cuidados de saúde prestados por cuidadores formais e os cuidados de saúde prestados por cuidadores informais. Os primeiros são concedidos pelos profissionais de saúde inseridos nos cuidados primários de saúde, hospitalares e continuados. Os segundos são realizados pelos familiares, amigos ou vizinhos e ocorrem no domicílio e visam assegurar a continuidade dos cuidados ao doente, ao idoso, à pessoa com deficiência ou ao acidentado do trabalho. O cuidador informal não é remunerado pelo cuidado que presta.

De acordo com Pereira (2011) os cuidadores informais preenchem as lacunas dos serviços oficiais de saúde, providenciando, no contexto Europeu, cerca de 80% de todos os cuidados prestados à pessoa dependente.

A dependência pode decorrer do processo de envelhecimento, de deficiência, da doença crónica, rara e doença mental.

Os dados do Instituto Nacional de Estatística publicados em 2013 revelam que Portugal tornou-se um país envelhecido. Entre os anos de 2008- 2013 o “índice de envelhecimento em Portugal era de 136 idosos por cada 100 jovens em 2013, sendo o Alentejo a região mais envelhecida e a Região Autónoma dos Açores a menos envelhecida. Entre 2008 e 2013 observou-se o aumento deste índice, tanto em Portugal como em todas as regiões NUTS II”. O envelhecimento demográfico traduz-se em termos da pirâmide etária no seguinte: “estreitamento da base da pirâmide etária – que traduz a redução dos efetivos populacionais jovens, como resultado da baixa da natalidade –; alargamento do topo da pirâmide – que corresponde ao acréscimo no número de pessoas idosas, devido ao aumento da longevidade”.

O aumento da população idosa não pode, no caso português, dissociar-se dos progressos alcançados com a Revolução de Abril. Foram os avanços ao nível das políticas de saúde e da proteção social, com particular incidência sobre a segurança social, que possibilitaram a melhoria das condições de vida e, por esta via que as pessoas vivessem mais anos e, sobretudo em condições de dignidade. Condições que nos últimos quatro anos foram muito agravadas, tal como é comprovado pelos dados divulgados pelo INE relativos ao ano de 2014. Nesse ano, a taxa de risco de pobreza entre os idosos foi de 17,1% em 2014, um aumento em dois pontos percentuais face a 2013.

O processo de envelhecimento implica alterações a nível biológico, psicológico e social que exigem a disponibilização de serviços públicos e profissionais devidamente qualificados e preparados que permitam às pessoas mais velhas ter uma vida com dignidade. A prestação de cuidados formais é complementada senão mesmo prioritariamente fornecidas pelos familiares / cuidadores informais.

A dependência não decorre apenas do processo de envelhecimento da população, as doenças crónicas, os acidentes vasculares cerebrais, as doenças oncológicas, as sequelas dos acidentes de viação, de acidentes de trabalho e outras doenças e a deficiência obrigam à prestação de cuidados diários e regulares prestados pelos cuidadores informais.

Segundo vários investigadores (Sarmento, Pinto e Monteiro (2010); McKee, et al. (2003, citado por Figueiredo, Lima & Sousa, 2009), os cuidadores informais são na esmagadora maioria familiares, pelo que o cuidado é prestado 24 horas por dia, 365 dias por ano.

É defendido por vários investigadores, e os estudos realizados no nosso país junto de cuidados informais demonstram, que o papel desempenhado pelo cuidador é complexo e envolve a prestação de múltiplos cuidados desde os cuidados de higiene, alimentação, vestuário, eliminação, mobilização; de apoio terapêutico, vigilância, acompanhamento a consultas, gestão financeira, da medicação e do lar, até aos cuidados emocionais.

Dada a multiplicidade de tarefas a prestar e à exigência das mesmas (a prestação de cuidados é um processo complexo e dinâmico que varia no tempo), os estudos revelam que a prestação de cuidados é “extremamente desgastante e, normalmente, acarreta um aumento do stress e da sobrecarga por parte de quem o exerce”.

Um estudo realizado em Portugal por Ricardo Melo, Marília Rua, Célia Santos de 2014, publicado na revista de Enfermagem Referência, relativo às necessidades do cuidador informal revela que os principais fatores causadores da sobrecarga são “falta de tempo; a tensão; a dependência constante do familiar; o receio do futuro e as restrições na vida familiar”. É, ainda, apontada a ausência de tempo que o cuidador dispõe para si próprio como um fator de sobrecarga e inibidor na prestação de cuidados de saúde.

Para além das consequências atrás mencionadas, há estudos que apontam para as repercussões a nível socioeconómico. Segundo Gonçalves (2014) a “sobrecarga socioeconómica resulta essencialmente da redução dos contactos sociais e alterações na vida profissional” e a autora acrescenta ainda que os “ cuidadores geralmente têm bastantes problemas em conciliar o cuidado do familiar ao trabalho fora de casa, e muitos deles têm que abandonar ou reduzir as horas de trabalho”. Isto repercute-se no rendimento familiar.

Segundo Saraiva (2011) “nas últimas décadas os serviços de saúde têm tentado co-responsabilizar a família, ou cuidadores informais, na prestação de cuidados aos doentes crónicos, fazendo sobressair a importância da relação que se estabelece com os mesmos, de os dotar de ferramentas (informação, supervisão) e de competências para assegurar a continuidade de cuidados no domicílio”, todavia, as estruturas públicas são escassas e dispõem de um número reduzido de equipas que permitam a concretização deste desiderato.

Em Portugal, a Unidade de Cuidados na Comunidade (UCC) prevista no n.º 2 do Artigo 7º, do Decreto-lei n.º 28/2008, de 22 de Fevereiro, faz intervenção integrada com indivíduos dependentes e famílias/cuidadores no âmbito da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI). Porém, a sua atuação não se esgota aqui englobando uma multiplicidade de áreas de intervenção que impede uma dedicação exclusiva ao trabalho com os cuidadores informais além do mais o seu número é escasso. Dados da Administração Central do Sistema de Saúde estavam em atividade no ano de 2013, 186 UCC a nível nacional.

Existe ainda no âmbito da Rede Nacional dos Cuidados Continuados Integrados equipas de cuidados continuados integrados (ECCI). Estas equipas existem em todos os agrupamentos de centro de saúde, mas, tal como as UCC são insuficientes.

No que concerne aos apoios económicos e sociais, a segurança social prevê a atribuição de um subsídio para assistência a filho com deficiência ou doença crónica. Este subsídio é “atribuído por um período até 6 meses que pode ser prolongado até ao limite de 4 anos” cujo montante tem um “limite máximo de 838,44 EUR, que corresponde a 2 vezes o valor do indexante dos apoios sociais (IAS) e um limite mínimo [cujo] valor diário não pode ser inferior a 11,18 EUR que corresponde a 80% de 1/30 do IAS (IAS = 419,22 EUR)”, assim como subsídio de assistência à 3ª pessoa. Esta prestação tem como destinatários “Pessoas (crianças ou adultos) com deficiência que necessitem de acompanhamento permanente de uma 3.ª pessoa”. Trata-se de uma “prestação mensal em dinheiro que se destina a compensar as famílias com descendentes, a receber abono de família com bonificação por deficiência ou subsídio mensal vitalício, que estejam em situação de dependência e que necessitem do acompanhamento permanente de 3.ª pessoa”, cujo montante está fixado no valor de 88,37 EUR. Este montante é muito parco para todas as tarefas e funções executadas pelos cuidadores.

Existe ainda o complemento por dependência. De acordo com a informação disponibilizada no sítio eletrónico da Segurança Social trata-se de “uma prestação em dinheiro atribuída aos cidadãos (…) que se encontrem em situação de dependência e que precisam da ajuda de outra pessoa para satisfazer as necessidades básicas da vida quotidiana”, nomeadamente “[r]ealização dos serviços domésticos; [a]poio na alimentação; [a]poio à locomoção; [a]poio nos cuidados de higiene”. Os montantes do Complemento por Dependência correspondem a uma percentagem do valor da Pensão Social e variam de acordo com o grau de dependência e do tipo de beneficiário/ pensionista, ou seja, se é pensionista / beneficiário do regime geral ou pensionistas ou beneficiários do Regime Especial das Atividades Agrícolas, do Regime não Contributivo e Regimes Equiparados, sendo que os valores oscilam entre os 91,05 € e os 182,11 €, montantes diminutos para fazer face às necessidades da pessoa com dependência.

No nosso país não existe informação precisa sobre o número de cuidadores informais, nem estão definidos os apoios a ser disponibilizados, pelo que urge a tomada de medidas que criem condições para que os cuidadores informais possam desenvolver de forma mais adequada e informada a prestação de cuidados e simultaneamente sejam minimizados os fatores negativos decorrentes da realização desta atividade.

Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PCP propõe um conjunto de medidas que visam apoiar o cuidador informal que envolvem a área da saúde, da segurança social e do trabalho.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte

Resolução
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo que:
1. Fomente a dinamização de sessões de formação, aconselhamento e capacitação dirigidas aos cuidadores informais e desenvolvidas pelos profissionais de saúde, dos diversos níveis de cuidados (primário, hospitalares e continuados);
2. Reforce as Unidades de Cuidados na Comunidade em meios humanos, técnicos e materiais, que permitam um acompanhamento mais próximo da pessoa dependente e um aprofundamento do apoio aos cuidados informais;
3. Assegure através dos cuidados de saúde primários o apoio psico–social aos cuidadores minimizando o desgaste físico, psicológico e impactos sociais decorrentes desta função;
4. Promova a obrigatoriedade da entidade patronal adequar o horário de trabalho e as funções a desempenhar às especificidades concretas do cuidador informal;
5. Elimine a condição de recursos para efeitos de atribuição dos subsídios sociais, prevista no Decreto-Lei nº 91/2009, de 9 de abril, e a indexação do seu limite a 100% do valor do IAS;
6. Proceda ao alargamento das condições de acesso e aos montantes das prestações sociais disponibilizadas aos cuidadores informais;
7. Disponibilize camas que permitam acolher a pessoa dependente para possibilitar o descanso do cuidador.

Assembleia da República, em 6 de maio de 2016

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