Exposição de motivos
A Tapada das Necessidades, além de ser um dos mais singulares e valiosos refúgios verdes da cidade de Lisboa, tem um valor histórico, cultural e ambiental para o País.
Na Tapada das Necessidades estão sedeados serviços da República com funções de soberania e instituições de caráter estratégico, como o Ministério dos Negócios Estrangeiros, no Palácio das Necessidades, ou o Instituto de Defesa Nacional (IDN), no Picadeiro Militar da Tapada, e ainda a Casa do Regalo, onde se instalou o gabinete do antigo Presidente da República Jorge Sampaio, aí exercendo, até ao seu falecimento, funções de Alto Representante da ONU para a Aliança das Civilizações e de Enviado Especial do Secretário-geral da ONU para a Luta Contra a Tuberculose.
Tendo em conta, não apenas o valor histórico, cultural e ambiental, mas também esta dimensão estratégica daquele local, é inaceitável o atual estado de degradação prolongada do seu conjunto edificado e natural, bem como quaisquer tentativas para a entrega da gestão deste espaço a entidades privadas.
Em 2008, foi celebrado um Protocolo entre o Ministério da Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas e a Câmara Municipal de Lisboa, que transferiu as competências de “gestão, reabilitação, manutenção e utilização da Tapada das Necessidades” para a Câmara Municipal de Lisboa.
A Tapada e o Palácio das Necessidades estão classificados como sendo de Interesse Público e parcialmente incluídos na Zona de Proteção do Aqueduto das Águas Livres, o que obriga, nos termos do artigo 53.º da Lei de Bases do Património Cultural, ao estabelecimento de um Plano de Pormenor de Salvaguarda no qual se apresentem as orientações estratégicas para a sua preservação e valorização.
A Câmara Municipal de Lisboa, sem ter dado este passo, avançou para a abertura de um concurso público de concessão do espaço público da Tapada e firmou o respetivo contrato a 7 de julho de 2016. Por outro lado, fez aprovar o projeto de licenciamento da entidade vencedora do procedimento de concessão da Tapada, a empresa “Banana Café Emporium”, para obras que preveem a demolição da parte central do antigo Jardim Zoológico e de diversos edifícios do topo norte da Tapada, além da construção de um restaurante com lotação de 100 lugares, um quiosque e um edifício multiusos, onde se prevê um auditório para 200 pessoas. O projeto licenciado pela Câmara Municipal de Lisboa afeta profundamente as características da Tapada com novos equipamentos privados de utilização massiva.
O projeto desta concessão foi alvo de forte contestação, por parte da população e de grupos organizados, que se mobilizaram, como os Amigos da Tapada, levando a cabo uma Petição ‘Em Defesa da Tapada das Necessidades’, subscrita por mais de 12 mil cidadãos e entregue à Assembleia da República.
Após a oposição pública ao projeto, a Câmara Municipal de Lisboa apresentou o ‘Anteplano de Salvaguarda da Tapada das Necessidades’, iniciativa que surgiu tardiamente e de forma condicionada pelo compromisso para futura exploração e utilização comercial da Tapada, sem o enquadramento de uma estratégia global de intervenção, ligada à salvaguarda e requalificação do seu património.
O conteúdo do Anteplano de Salvaguarda da Tapada das Necessidades, esteve em discussão pública, de 1 de junho a 30 de julho de 2021, tendo esta sido amplamente participada por cidadãos, especialistas e entidades coletivas. Os resultados desta participação foram publicados no Relatório de Acompanhamento tornado público em maio de 2022, do qual consta, entre outros aspetos, a objeção à construção dos equipamentos de utilização massiva, previstos na concessão, o faseamento dos projetos de reabilitação necessários e as medidas cautelares baseadas no estado de conservação atual, para a preservação e manutenção preventivas do património botânico e paisagístico existente.
O estado de degradação da Tapada não deixa dúvidas de que a Câmara Municipal de Lisboa, durante mais de uma década, incumpriu com as suas obrigações na gestão, requalificação e manutenção da Tapada, atribuídas ao abrigo do protocolo estabelecido entre esta e o Estado.
A importância de ter um Plano de Salvaguarda em curso é medida pela capacidade de planear e garantir uma direção ética e justa em relação ao futuro da Tapada, o que torna evidente a necessidade de revogação de uma concessão prévia ao Plano e que não serve o interesse e o uso público da Tapada.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte
Resolução
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo que:
- Perante o reiterado incumprimento das obrigações da Câmara Municipal de Lisboa (CML), avalie a revogação do protocolo, celebrado em 2008 pelo Ministério da Agricultura, que transferiu as competências de “gestão, reabilitação, manutenção e utilização da Tapada das Necessidades” para a CML;
- Tendo em conta o valor histórico, cultural e ambiental, assim como a dimensão estratégica daquele espaço para o País, impeça qualquer concessão da sua gestão a entidades privadas, promovendo um Plano de Salvaguarda, que tenha em conta o resultado da participação pública tornado público em maio de 2022, e que garanta a reabilitação e a salvaguarda do interesse e usufruto públicos da Tapada das Necessidades.