Exposição de motivos
A realidade do distrito do Porto continua marcada pelo agravamento das dificuldades no acesso à habitação. Com o aprofundamento da liberalização do sector da habitação, acelerou a especulação imobiliária e aumentaram exponencialmente o preço das casas para compra e as rendas. A falta de investimento do Estado em habitação, quer pela reabilitação do parque habitacional público, quer pela construção de mais fogos de habitação, a par da manutenção de um regime de arrendamento urbano liberalizado e sem controlo das taxas de juros para a compra de habitação, têm conduzido à impossibilidade de comprar ou arrendar casa a preços acessíveis.
A afetação de parcelas muito significativas de imóveis ao alojamento turístico, que anteriormente estavam no regime de arrendamento habitacional, veio acelerar e expor de forma evidente este processo. Só em referência ao concelho do Porto constam no Registo Nacional de Alojamento Local 10 542 unidades de alojamento.
Trata-se de uma situação que tem empurrado muitas famílias para fora dos centros urbanos e para as periferias, obrigando a um equilíbrio cada vez mais complexo entre os custos com a habitação e os custos com transportes e deslocações, com impactos na qualidade de vida e no ordenamento do território. Observa-se também o aumento de pessoas em situação de sem-abrigo e de famílias a viver em condições sub-humanas, em espaços com dimensões demasiado exíguas, sobrelotados e sem condições de salubridade.
Os números das autarquias deste distrito, subestimados por critérios que excluem muitos dos que necessitam, apontam para cerca de 10 mil famílias a aguardar por uma habitação social. Em contraponto, são frequentes as notícias sobre a existência de dezenas de milhares de casas devolutas na região.
Neste quadro, e com a conhecida carência de terrenos e património público para a promoção de habitação a custos controlados, é cada vez mais inadmissível que a esmagadora maioria desse património não esteja já disponível.
Em 2021, o governo aprovou a desafetação de alguns edifícios do Ministério da Defesa para o reforço da oferta pública de casas. Desses, quatro estão na cidade do Porto e apenas um iniciou recentemente obras, após sucessivos atrasos, mantendo-se os edifícios do Trem do Ouro, da Casa do Lordelo do Ouro e das oficinas gerais de fardamento, na rua da Boavista, sem qualquer evolução. Por outro lado, o antigo quartel do Monte Pedral, construído em terrenos cedidos pela Câmara Municipal do Porto, foi desafetado, em 2019, do domínio público militar e devolvido a esse Município, tendo o seu executivo anunciado a intenção de aí criar quase 400 fogos, entre outras funções. Alegando falta de meios próprios para executar a totalidade da obra e recorrendo sem êxito às parcerias público-privadas para conceção, construção, conservação e exploração do edificado, tal intenção permanece longe da sua concretização.
A par da carência de habitação a custos controlados, mantém-se a incapacidade de resposta pública aos problemas, pontuais e estruturais, do seu parque habitacional – capacidade que terá ainda necessariamente de ser maior face às necessidades de construção de mais fogos.
No distrito do Porto, há bairros do IHRU com problemas muito sérios de degradação do edificado, particularmente no concelho do Porto e de Vila Nova de Gaia, onde o Bairro do Viso é o exemplo mais gritante, com problemas de infraestruturas, infiltrações, humidade e falta de conforto térmico nas habitações.
O movimento cooperativo, nas duas décadas após a Revolução de Abril, em que se implantou de facto, foi responsável pela construção de mais de 12 mil fogos no distrito do Porto e por uma grande parte dos programas de promoção habitacional a custos controlados. Com o processo de liberalização do sector e o abandono dos apoios do Estado à iniciativa cooperativa, este movimento foi desvirtuando progressivamente o seu carácter, ao ponto de atirar a quase totalidade das habitações construídas ao abrigo de programas de promoção indireta para o mercado imobiliário.
Face a esta situação e além das medidas gerais neste sector, há uma realidade regional que merece uma resposta dirigida e exige que o Governo assuma o investimento público necessário à construção, reabilitação e recuperação urbana, designadamente em relação:
- ao reforço da oferta pública de casas para o mercado de arrendamento a preços controlados, garantindo desde logo a concretização da intervenção em edifícios públicos e a sua disponibilização para o arrendamento;
- à recuperação dos edifícios públicos degradados, com um plano urgente de identificação de patologias no edificado e de problemas junto dos seus moradores, concretizando a reabilitação das suas casas;
- ao levantamento de terrenos públicos a disponibilizar a preços reduzidos para construção a partir de cooperativas de habitação, garantindo a resposta às reais necessidades das famílias e à conceção integrada das urbanizações.
Tal como o PCP tem vindo a sublinhar, o que é indispensável garantir não são os lucros dos bancos e dos fundos imobiliários, mas sim o direito das populações à Habitação.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte
Resolução
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomenda ao Governo que:
- Concretize a intervenção nos quatro edifícios do Porto desafectados pelo Ministério da Defesa em 2021 e a sua disponibilização para o arrendamento ao longo do ano de 2026.
- Articule com a Câmara Municipal do Porto as medidas necessárias para garantir meios para a construção de casas para o arrendamento a preços controlados no antigo quartel de Monte Pedral.
- Execute a reabilitação do património habitacional público do distrito, identificando as necessidades dos bairros do IHRU e concretizando a planificação, o projeto e financiamento das respetivas obras.
- Proceda ao levantamento de terrenos públicos no distrito do Porto a disponibilizar a preços reduzidos para construção a partir de cooperativas de habitação, e tome medidas para garantir o carácter não lucrativo e o controlo associativo do processo de provisão.