Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

PCP apresenta projecto para financiar a produção cinematográfica nacional

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Procede à primeira alteração à Lei n.º 55/2012, de 6 de setembro, que estabelece os princípios de ação do Estado no quadro do fomento, desenvolvimento e proteção da arte do cinema e das atividades cinematográficas e audiovisuais e ao Decreto-Lei n.º 9/2013, de 24 de janeiro, que regula a liquidação, a cobrança, o pagamento e a fiscalização das taxas previstas na Lei n.º 55/2012, de 6 de setembro
(proposta de lei n.º 192/XII/3.ª)
Estabelece os princípios do financiamento da produção cinematográfica nacional e da Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema — e assegura o financiamento correspondente aos anos de 2012 e 2013 (PCP)
(projeto de lei n.º 509/XII/3.ª)

Sr.ª Presidente,
Sr. Secretário de Estado da Cultura,
Nós já vimos este filme de o Governo vir aqui dizer que resolve tudo com uma proposta de lei, porque, em 2012, fez exatamente o mesmo número.
Vinha resolver tudo, apesar de haver uma lei em vigor que o próprio Governo não cumpria, a pretexto de ter uma lei nova, e agora faz o mesmo, mas faz mais um jeitinho e, além de vir aqui dizer, novamente, que vai resolver tudo com uma proposta de lei, à semelhança do que fez no ano passado, introduz uma pequena alteração, quase cirúrgica.
Sem prejuízo daquilo que ainda aprofundarei na intervenção que farei em representação do Grupo Parlamentar do PCP, aproveito para lhe perguntar já, como pedido de esclarecimento à sua intervenção, o seguinte: é verdade que o seu Governo pretende perdoar 13 milhões de euros da dívida que não foi liquidada pelas operadoras, grandes empresas de telecomunicações, comunicações e serviços de televisão em Portugal, numa altura em que diz que tem de se libertar do próprio património, como no caso dos quadros de Miró, a pretexto de 35 milhões de euros, porque não pode abdicar de 35 milhões de euros?! O Governo que diz isto é o mesmo que vem agora propor-nos que se elimine o n.º 3 do artigo 27.º da Lei do Cinema, que diz que as empresas têm de pagar o ano de 2012?! É verdade que o Governo pretende dar a estas empresas, de mão beijada, 13 milhões de euros, que é o correspondente a esta verba, Sr. Secretário de Estado?
(…)
Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresenta hoje um projeto de lei de alteração da Lei do Cinema, porque essa Lei, tal como o PCP denunciara desde o primeiro momento, foi apenas o pretexto que o Governo teve para justificar o injustificável: o não financiamento à produção cinematográfica por um período de dois anos.
Há quase dois anos, o Governo e a maioria PSD/CDS faziam toda uma campanha de propaganda em torno da Lei do Cinema, uma lei que viria, diziam, resolver todos os problemas da produção cinematográfica, em Portugal.
Na verdade, tal como o PCP sempre dissera, o Governo nunca quis cumprir essa Lei e nunca mexeu um dedo para que ela fosse cumprida.
O PCP denunciou a manobra, alertou os profissionais do setor e criticou a opção do Governo pela desresponsabilização total do Estado. A secundarização do direito à produção cultural e artística, nomeadamente no cinema, é o caminho da política de direita e é um caminho que condena as artes e a cultura a viverem na dependência das aspirações e desígnios dos grandes grupos económicos, que acentua a exploração do trabalho artístico e impõe uma política do gosto determinada pelo monopólio da distribuição.
O PCP propõe um regime de financiamento público que consiste na responsabilização do Estado pelos custos de funcionamento do ICA (Instituto do Cinema e Audiovisual) e da Cinemateca, libertando outros recursos para o apoio à produção e para o investimento da Cinemateca na modernização do ANIM (Arquivo Nacional das Imagens em Movimento) e na sua própria programação.
É um regime de financiamento misto, assegurado em partes iguais pelo Estado e pela cobrança de taxas a operadores de serviços de televisão, que tem como objetivo o efetivo apoio à produção cinematográfica e o investimento nos meios e serviços da Cinemateca.
A proposta do PCP estabelece ainda que o Estado procede à cobrança dos valores em dívida pelas operadoras, correspondentes aos anos de 2012 e 2013, e que avança, através de financiamento público, a verba esperada para 2013, enquanto ao mesmo tempo concretiza a cobrança coerciva junto das operadoras.
Na proposta do PCP, o Governo deve assegurar a transferência das verbas até ao final de março de cada ano, independentemente de ter ou não conseguido, até essa data, a liquidação da dívida por parte das operadoras e sem prejuízo de realizar as cobranças a qualquer hora.
Mas o Governo, que, por sua vontade, talvez vendesse o cinema português em leilão, apresenta uma proposta de lei que repete a fórmula. E nós já vimos este filme.
O mesmo Governo que dizia, em 2012, que resolveria nesse mesmo ano todos os problemas do cinema é o que agora nos vem dizer que resolverá tudo com uma lei que perdoa dívida, diminui encargos e mantém tudo o resto na mesma.
É absolutamente escandaloso e inadmissível que o mesmo Governo que diz que não pode deixar de arrecadar 35 milhões, com a venda do património artístico contido nas obras de Miró, venha agora perdoar, sem qualquer espécie de hesitação, uma dívida de 13 milhões de euros às operadoras de televisão.
É absolutamente escandaloso e inadmissível que o mesmo Governo que impõe aos portugueses, contra a sua vontade coletiva, um roubo de milhares de milhões de euros em salários, subsídios, pensões e feriados, trema perante o confronto com os operadores de televisão!
Ainda há pouco, o CDS dizia que não se podem aprovar taxas contra as operadoras. Pena é que não diga o mesmo quanto aos salários e pensões retirados à força aos trabalhadores portugueses. Para esses, já não há problema algum com o contencioso!
Para impor o roubo aos trabalhadores, a destruição dos serviços públicos, diz que é preciso mão-de-ferro e inflexibilidade total; para obviar ao confronto com as operadoras, muda a lei, diminui-lhes os encargos, perdoa-lhes milhões em dívidas e premeia o infrator!
É o Governo dos grupos económicos que, sobre os trabalhadores em luta pelos salários, lança o corpo de intervenção, mas a uma empresa que deve milhões faz o jeito de lhe alterar a lei!
É por termos este Governo que toda a arte e toda a produção cinematográfica em Portugal se deve, única e exclusivamente, aos produtores, realizadores e todos os restantes profissionais criativos e técnicos, que, apesar do Governo e da política que os empurra para fora do País, insistem em lutar pela cultura aqui, em Portugal.
A política que queremos dá aos artistas e técnicos a possibilidade de trabalharem, com um Governo patriótico e de esquerda e não, como faz este Governo, com um Governo subservie

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