Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

PCP apresenta projecto para defender Laboratórios do Estado

Recomenda ao Governo a salvaguarda dos laboratórios de Estado da estrutura do Ministério da Agricultura e Mar
(projeto de resolução n.º 898/XII/3.ª)

Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
Os laboratórios e estações técnicas do Estado sob tutela do Ministério da Agricultura e Mar devem constituir uma importante rede de apoio à atividade produtiva, à investigação, à sanidade animal e vegetal, à segurança e soberania alimentar.
São três os níveis de problemas provocados pelas opções dos Governos do PSD, do PS e do CDS.
Primeiro: a instabilidade institucional. Cada novo governo procede a uma reorganização: Sevinate Pinto, PSD/CDS, juntou a agricultura e as pescas criando o INIAP (Instituto Nacional de Investigação da Agricultura e das Pescas); Jaime Silva, PS, juntou-lhe mais a veterinária e criou o INRB (Instituto Nacional de Recursos Biológicos); agora, Assunção Cristas, PSD/CDS, voltou a tirar as pescas, que juntou à meteorologia, instituindo o IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera) e criou o INIAV (Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária) com a agricultura e a veterinária. Entretanto, o INIAV esteve nove meses sem presidente e fala-se no encerramento de laboratórios veterinários na Beira Interior, no Algarve e em Trás-os-Montes, sem estar definido o desenho final. Instabilidades que não casam com investigação.
Segundo: o desinvestimento em pessoal. A formação de investigadores e/ou de pessoal só é possível a longo prazo. A não admissão de pessoal, o recurso à precariedade laboral e uma elevada média etária dos investigadores estão a levar os laboratórios à rutura. Estas são carências dramáticas que obrigam investigadores altamente especializados a fazerem trabalho administrativo ou de limpeza ou inviabilizam o funcionamento de equipamentos específicos. A carência de pessoal leva a que se perca uma cultura institucional que é muito importante nestas instituições.
Terceiro: o subfinanciamento e atraso nas transferências têm implicações no funcionamento e modernização de equipamentos e na continuidade dos projetos de investigação, com investigadores a serem pagos pelo Programa Ciência como se de bolseiros se tratassem, com dinheiro de projetos de investigação a pagar salários e, mesmo assim, em atraso, com falta de verbas para equipamentos e consumíveis, como reagentes, água ou luz.
É com os laboratórios e estações tecnológicas nestas condições que o Governo aponta como futuro a prestação de serviços, subalternizando as questões de investigação, experimentação e transferência tecnológica.
Como se os laboratórios de Estado estivessem em condições de concorrer com laboratórios privados internacionais; como se não tivessem um papel importante no cumprimento de planos internacionais de sanidade e segurança alimentar na salvaguarda do material genético que o País precisa para se alimentar, na manutenção do repositório de conhecimento insubstituível; como se o Estado português não gastasse milhões de euros em laboratórios estrangeiros; como se não houvesse agricultores dependentes dos laboratórios das multinacionais que lhes vendem pesticidas.
Os laboratórios são um importante instrumento para a independência e soberanias alimentares. É inadmissível que partidos que tanto falam em reconquistar a soberania contribuam, deste modo, para a destruição da rede de laboratórios de Estado.
(…)
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
Queria registar que o CDS fez um conjunto de valorizações daquilo que era a inscrição das competências dos laboratórios de Estado no projeto do PCP, mas esqueceu-se de uma de que tanto fala, que é a da soberania.
Relativamente ao PSD, é curiosa a intervenção que proferiu dizendo que precisamos de mais pessoal e de mais equipamentos, mas faz-se menos transferência. Apresentou aqui um conjunto de intenções, que não se conhecem, apesar de o Governo já ter dois anos e meio de atividade.
Na realidade, aquilo que conhecemos é que a situação criada nas estações técnicas está a pôr em risco património irrecuperável. São coleções de fungos e de insetos, são coleções de pereiras, macieiras e castanheiros degradadas — atente-se no escândalo de degradação da Estação Vieira Natividade, em Alcobaça —; é património científico material e imaterial de grande importância em ruína; são as imensas dificuldades em manter o banco de germoplasma vegetal quando tem mais de 90% do material genético para alimentação humana; são coleções únicas em Portugal, fundamentais para a manutenção da biodiversidade, que estão nalguns casos sem acompanhamento, ao abandono e podem perder-se irremediavelmente.
Enquanto Portugal abdica de cuidar deste património, desenvolvem-se as tendências para a sua concentração, de que são exemplo a lei das sementes. O nosso País está cada vez mais dependente em matéria de produção alimentar e o Governo decide pôr em risco as estruturas que devem proteger, estudar e salvaguardar o património biológico e genético nacional. Esta situação tem de ser denunciada e o País tem de fazer uma reflexão profunda nestas matérias.
A par destas recomendações, o PCP faz, obviamente, apelo a todos os grupos parlamentares para que a Comissão de Agricultura promova a realização de uma conferência sobre esta urgente questão. A maioria, que afirma as boas intenções, não terá dificuldades em acompanhar esta proposta. Proposta que o PCP apresentará neste sentido, dando também assim resposta à carta aberta de 23 ex-investigadores do INIAV. Os laboratórios são demasiado importantes para o País, para a economia e para a nossa soberania. Não permitiremos que sejam vítimas de opções políticas que não defendem o interesse naciona

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