1 – Quando se provou e é reconhecido o papel insubstituível do Serviço Nacional de Saúde (SNS) na resposta ao surto epidémico e se comprovou que é a única resposta capaz de garantir o direito à saúde, o momento que vivemos é decisivo para o futuro. Dois caminhos estão em decisão nos próximos tempos: a defesa e reforço do SNS para garantir em pleno o direito à saúde, com a aplicação de um plano de emergência para o seu fortalecimento; ou o definhamento do SNS e das suas estruturas, canalizando os fundos públicos do seu financiamento para engrossar os lucros e o poder dos grupos monopolistas da saúde, promovendo o negócio da doença, destruindo de facto o SNS, como serviço nacional de saúde, e pondo em causa o direito à saúde. A opção tem de ser feita e sem ambiguidades pelo reforço do SNS.
Quando cresce a campanha dos grupos económicos do negócio da doença, dos seus representantes políticos e propagandistas, incluindo os sectores reaccionários que sempre quiseram a destruição do SNS, é profundamente criticável que a ministra da Saúde venha publicamente questionar a capacidade de o serviço público responder a outras necessidades, nomeadamente de recuperação dos doentes em lista de espera, alimentando assim a campanha contra o SNS e favorecendo os interesses dos grupos monopolistas da saúde.
O que se impõe não é questionar a capacidade do SNS em responder às necessidades do povo português na prestação de cuidados de saúde, mas sim concretizar as medidas necessárias, há muito identificadas, de reforço do serviço público. Não é aceitável transferir milhares de milhões de euros para quem faz da doença um negócio e usará esse dinheiro para contratar profissionais do SNS pondo em causa o seu funcionamento. O que se impõe é canalizar as verbas que se querem entregar aos privados para investir no SNS, incluindo para valorizar as remunerações e carreiras dos seus profissionais e contratar os que são necessários. Um aspecto é a contratualização temporária e limitada de serviços privados, outra é o salto qualitativo de substituição estrutural do SNS pelos grupos do negócio da doença.
Está em marcha uma grande operação para atacar o SNS e comprometer o seu futuro. A prevalecer a opção pelo favorecimento dos grupos monopolistas, facilmente se perceberá que SNS teríamos quando se sair da fase do surto epidémico.
2 – Sendo verdade que os portugueses sempre tiveram no SNS a garantia do acesso à saúde – apesar da destruição de parte significativa das suas capacidades de prestação de cuidados, devido ao subfinanciamento a que foi sujeito ao longo dos anos, à desvalorização e redução do número de profissionais, ao desinvestimento em equipamentos, particularmente entre 2011 e 2015, mas também ao aumento da promiscuidade entre o público e o privado – o combate ao surto epidémico trouxe uma maior consciência colectiva da importância e papel decisivos do SNS.
O PCP sublinha o facto de ser precisamente numa altura em que caiu por terra o mito das vantagens da gestão privada e da empresarialização que a ministra da Saúde se apresse, não a defender a necessidade da existência de um serviço público universal, geral, e gratuito, dotado de todos os meios necessários, mas a colocar em causa a capacidade do SNS, dando assim a mão aos privados que se esconderam durante os últimos dois meses e viram a sua actividade reduzida de forma muito significativa.
3 – Se foi possível adoptar um plano de emergência para responder aos impactos do vírus, também é possível concretizar um plano de emergência para fortalecer a resposta geral do SNS no plano hospitalar, dos cuidados de saúde primários e da saúde pública. É isso que se impõe.
O PCP reforça a exigência da concretização de um plano de emergência que, partindo de uma análise rigorosa do trabalho realizado nestes últimos dois meses, das necessidades identificadas e dos meios necessários para combater o surto epidémico e regularizar a actividade normal do SNS, não deixando ninguém para trás, inclua como medidas prioritárias: a disponibilização dos meios financeiros necessários; a contratação dos profissionais necessários para regularizar o funcionamento das unidades do SNS, bem como a sua valorização profissional, salarial e das carreiras; a abertura de milhares de camas que foram encerradas e o reforço das unidades de cuidados intensivos; a aquisição de novos equipamentos; o fim da promiscuidade entre o público e o privado, e um programa que promova o regresso de muitos profissionais à exclusividade no serviço público; que se faça uma aposta forte nos cuidados de saúde primários que, tal como a situação actual confirmou, pode dar um grande contributo à resolução de muitos problemas sem o recurso às unidades hospitalares, libertando-as para os casos mais exigentes a requererem especialização.
O SNS revelou-se imprescindível no tratamento dos milhares de doentes afectados pela COVID-19, que encontraram no serviço público, não em seguradoras ou na prestação de cuidados entregues aos grupos monopolistas, o acesso ao direito à saúde. É com esta capacidade de resposta do SNS, que se exige ver reforçada, que, não apenas em situações agudas como as que vivemos mas em todas as outras circunstâncias, o povo português deve poder contar.