Exposição de Motivos
Enfrentamos um momento de grande complexidade e incerteza, considerando a evidência científica existente, mas tendo consciência de tudo o que ainda é desconhecido da comunidade científica sobre o coronavírus. Um momento que exige que tudo seja feito para combater a COVID 19, minimizando os seus impactos na saúde e na vida dos portugueses.
A situação criada em Portugal pelo desenvolvimento do surto do COVID-19 coloca como primeira prioridade a adoção de medidas de prevenção e de alargamento da capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde, visando o combate ao seu alastramento e a resposta clínica.
A situação que o país e o Mundo atravessam, com medidas excecionais para situações excecionais, não poderá servir de argumento dos patrões para o atropelo dos direitos e garantias dos trabalhadores. Não pode ser usado e instrumentalizado para, aproveitando legítimas inquietações, servir de pretexto para o agravamento da exploração e para o ataque aos direitos dos trabalhadores.
Os últimos dias dão um perigoso sinal de até onde sectores patronais estão dispostos a ir espezinhando os direitos dos trabalhadores. Indiciando um percurso que a não ser travado lançará as relações laborais numa verdadeira “lei da selva”, tem-se assistido à multiplicação de atropelos de direitos e arbitrariedades.
Os despedimentos selvagens de milhares de trabalhadores, de que são particular exemplo os que têm vínculos precários, nomeadamente as Empresas de Trabalho Temporário e trabalhadores em período experimental; a colocação de trabalhadores em férias forçadas; a alteração unilateral de horários; a redução de rendimentos por via do Lay-off e também pelo corte de prémios e subsídios, entre os quais o subsídio de refeição, designadamente a quem é colocado em teletrabalho; a recusa do exercício dos direitos parentais; são exemplos que ilustram a ofensiva em curso contra os trabalhadores, os seus salários, os seus direitos e o seu emprego.
De acordo com dados do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), existem atualmente no nosso país cerca de 225 empresas licenciadas para o exercício da atividade de trabalho temporário.
Em Portugal, e à semelhança de outros países, o recurso ao trabalho temporário tem vindo a aumentar e o peso crescente do trabalho temporário no emprego total é significativo. Dados da Pordata revelam que em 2018 a percentagem de trabalhadores com contrato de trabalho temporário correspondia a 22% do total de trabalhadores empregados.
O recurso a Empresas de Trabalho Temporário para recrutamento de trabalhadores que respondem a necessidades permanentes das empresas utilizadoras passou de exceção a regra.
Sucessivas alterações à legislação laboral tiveram como objetivo a generalização da precariedade, a degradação das condições de trabalho e tentativa de liquidação de direitos laborais e sociais. Disto são prova, medidas como o embaratecimento e facilitação dos despedimentos, aumento do horário de trabalho e o agravamento das condições de articulação entre a vida pessoal, familiar e profissional.
Hoje no nosso país existirão mais de 1 milhão e 200 mil trabalhadores com vínculos precários: contratos a termo em desrespeito pela lei, uso abusivo de recibos verdes, trabalho encapotado pelo regime de prestação de serviços, bolsas de investigação ou estágios profissionais e trabalho temporário sem observância de regras, são as formas dominantes da precariedade laboral, que apenas têm como elemento comum a precariedade e a insegurança de vínculos laborais associadas à limitação de direitos fundamentais. Aos períodos contínuos ou descontinuados de precariedade de vínculo juntam-se, quase sempre, longos e repetidos períodos de desemprego.
A precariedade laboral significa também precariedade da proteção social. E os últimos tempos têm demonstrado isso mesmo: com o pretexto do COVID-19 são milhares os trabalhadores de empresas de trabalho temporário que foram despedidos, muitos sem direito a qualquer tipo de proteção social por não cumprirem o prazo de garantia para acederem ao subsídio de desemprego.
A iniciativa do PCP é no sentido de garantir proteção social a estes trabalhadores, sem prejuízo do continuado combate à precariedade, com vista à sua erradicação, e da luta que importa continuar a fazer para que a todas as necessidades permanentes correspondam vínculos efetivos.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei garante um mecanismo de apoio extraordinário de acesso ao subsídio de desemprego aos trabalhadores de empresas de trabalho temporário até à cessação das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia SARS-CoV-2.
Artigo 2.º
Acesso ao subsídio de desemprego
- Os trabalhadores temporários cujo contrato de trabalho cesse durante a vigência das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia SARS-CoV-2 têm acesso ao subsídio de desemprego, independentemente do prazo de garantia.
- O apoio previsto no número anterior tem duração de 30 dias, sendo renovado automaticamente até à cessação das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia SARS-CoV-2 ou ao fim da situação de desemprego.
Artigo 3.º
Transferência de verbas para a Segurança Social
Para cumprimento do disposto no artigo anterior, o Governo procede à transferência para a Segurança Social das verbas correspondentes.
Artigo 4.º
Entrada em vigor e vigência
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e vigora até à cessação das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia SARS-CoV-2.