Destinatário: Ministra do Trabalho Solidariedade e Segurança Social
Enfrentamos um momento de grande complexidade e incerteza, considerando a evidência científica existente, mas tendo consciência de tudo o que ainda é desconhecido da comunidade científica sobre o coronavírus. Um momento que exige que tudo seja feito para combater o COVID 19, minimizando os seus impactos na saúde e na vida dos portugueses.
A situação que o país e o Mundo atravessam, com medidas excecionais para situações excecionais, não poderá servir de argumento dos patrões para o atropelo dos direitos e garantias dos trabalhadores. Não pode ser usado e instrumentalizado para, aproveitando legítimas inquietações, servir de pretexto para o agravamento da exploração e para o ataque aos direitos dos trabalhadores.
Os últimos dias dão um perigoso sinal de até onde sectores patronais estão dispostos a ir espezinhando os direitos dos trabalhadores. Indiciando um percurso que a não ser travado lançará as relações laborais numa verdadeira “lei da selva”, tem-se assistido à multiplicação de atropelos de direitos e arbitrariedades.
De acordo com informação que chegou ao Grupo Parlamentar do PCP, a empresa Bosch Security Systems, SA, em Aveiro, informou os seus trabalhadores que iria encerrar a fábrica por antecipação do período de gozo de férias, sendo que os trabalhadores iriam gozar 5 dias em antecipação das férias de Verão, sendo também cancelados dois dias de férias interpoladas a cada trabalhador a gozar logo de seguida ao gozo dos 5 dias. Como se de uma liberalidade e benefício para os trabalhadores, a empresa “ofereceu” mais 3 dias a gozar no seguimento dos 7 dias anteriores.
O direito a férias dos trabalhadores tem subjacentes os direitos ao descanso e ao lazer, o que, convenhamos, não se concretizam numa situação em que, por determinação legal, os trabalhadores devem estar recolhidos nas suas residências, só devendo sair para deslocações consideradas essenciais. Para mais, o artigo 241.º do Código do Trabalho determina que as férias devem ser marcadas por acordo entre o empregador e o trabalhador, e caso esse acordo não seja alcançado pode o empregador marcar as férias, de forma unilateral, entre os dias 1 de maio e 31 de outubro. Como será fácil de apreender, no caso em análise, nenhuma destas situações se verifica, pelo que estamos perante uma imposição de marcação de férias, perante um gozo de férias forçadas.
A situação que o país enfrenta não poderá, também, ser argumento para que o Estado se demita das suas funções de fiscalização e de garantia do cumprimento e respeito pelos direitos dos trabalhadores.
Assim, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais em vigor, solicitamos ao Governo que, através do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:
- Tem o Governo conhecimento da situação acima descrita de desrespeito pelos direitos dos trabalhadores?
- Tem conhecimento de alguma ação inspetiva da Autoridade para as Condições de Trabalho? Se sim, quais as conclusões?
- Que medidas vai tomar o Governo para assegurar o cumprimento dos direitos dos trabalhadores, nomeadamente a não imposição de férias, bem como a manutenção dos seus postos de trabalho e o cumprimento de todos os direitos laborais durante a situação de pandemia?