Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

A Moção de Censura do PCP é a resposta para o desastre destas políticas

No debate temático subordinado ao tema da educação, convocado pelo PCP na Assembleia da República, ficou claro que a instabilidade volta às escolas, com professores desmotivados e exaustos intelectual, profissional e emocionalmente, virando professores contra professores, virando pais contra professores.
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Debate sobre a situação na escola pública e o novo ano letivo — mega-agrupamento, reorganização curricular e despedimentos nas escolas
Sr. Presidente,
Sr. Ministro da Educação,
Apesar da excitação do Sr. Deputado Nuno Magalhães, quero colocar-lhe duas perguntas.
A primeira sobre a Parque Escolar. Tendo em conta mais um relatório do Tribunal de Contas que confirma todas as ilegalidades e que a Parque Escolar serviu para muita coisa que não só a recuperação do parque escolar português, sobretudo confirma que a recuperação e o investimento do parque escolar português não dependem daquela solução empresarial e muito menos de uma solução que sirva outros interesses, colocamos a pergunta, Sr. Ministro: quando é que o Governo vai ouvir o PCP e vai extinguir, de uma vez por todas, a Parque Escolar?
Sr. Ministro, o segundo conjunto de questões tem a ver com o empobrecimento da escola pública quanto ao seu funcionamento e à sua qualidade.
O Sr. Ministro já hoje nos disse que a escola pública não é só para aprender a ler, a escrever e a contar. Pergunto: como é que justifica essa afirmação perante a reorganização curricular que está proposta pelo Governo? Como é que pretende justificar essa afirmação quando os senhores eliminam a formação na área das expressões, nomeadamente a Educação Visual e Tecnológica e a Educação Tecnológica? Como é que justifica essa afirmação perante o empobrecimento da formação nas áreas das ciências experimentais com os cortes e os desdobramentos? Como é que justifica essa afirmação com a extinção nas áreas curriculares não disciplinares como a Formação Cívica ou com a desvalorização da Educação Física? Como é que, afinal de contas, os senhores impõem estes ajustamentos curriculares ao sabor dos cortes da troica e, ainda assim, o Sr. Ministro fala de uma escola pública de qualidade?
Sr. Ministro, como é que o Sr. Ministro pode falar de qualidade na escola pública, de preocupação com a qualidade da escola pública quando aumentam o número de alunos por turma, quando concentram alunos em mega-agrupamentos com menos meios, menos professores e menos funcionários.
Como é que os senhores continuam a falar de aumento da qualidade da escola pública quando impõem cortes no financiamento no Programa Operacional Potencial Humano (POPH) por exemplo no ensino artístico, com a imposição dos cortes aos conservatórios regionais ou no plano integrado de educação e de formação, no financiamento aos planos curriculares alternativos, no financiamento dos territórios educativos de intervenção prioritária (TEIP)? Como é que o Sr. Ministro continua a falar de investimento e da preocupação do Governo com a qualidade da escola pública quando tomam todas estas medidas?
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:
No encerramento deste debate, promovido pelo PCP, confirma-se a justeza do seu agendamento, a justeza e a necessidade desta discussão que aqui fizemos, e importa registar as profundas contradições entre o discurso do Governo e a sua prática política.
Confirmou-se, hoje, que temos um Governo que, no discurso, fala de investimento na escola pública mas, na prática, institui a instabilidade como regra nas escolas, constitui mega-agrupamentos para poupar dinheiro, despedindo professores e funcionários, reduzindo os meios ao dispor da escola pública.
Um Governo que, na prática, corta o financiamento ao ensino artístico, nomeadamente aos conservatórios regionais, corta o financiamento ao PIEF (Programa Integrado de Educação e Formação), aos percursos curriculares alternativos, aos Cursos de Educação e Formação de Adultos, aos TEIP, e, afinal de contas, fala de investimento quando se propõe despedir milhares de professores.
Sr.as e Srs. Deputados, expoente máximo destas contradições entre o discurso e a prática é o facto de o CDS, em abril de 2010, ter apresentado nesta Assembleia da República o projeto de resolução n.º 104/XI, que recomendava a integração excecional dos docentes contratados com mais de 10 anos de serviço, quando, afinal de contas, integrou no Governo um Secretário de Estado que veio hoje aqui anunciar a justeza do despedimento dos professores contratados.
Temos um Governo que enche o discurso com a preocupação da qualidade da escola pública mas, na prática, promove o aumento do número de alunos por turma, concentra alunos em mega-agrupamentos com menos meios, menos professores e menos funcionários, empobrece curriculae, corta desdobramentos nas áreas de ciências experimentais, corta formação nas áreas das expressões e extingue áreas curriculares não disciplinares.
Temos um Governo que, afinal de contas, promove o empobrecimento da qualidade da educação pública mas, depois, espanta-se com o facto de os jovens não conhecerem a História como deviam, não exercitarem a sua língua materna com a qualidade com que deviam. Espanta-se com tudo isso quando, na prática, empobrece a qualidade da escola pública.
Temos um Governo que fala de democracia nas escolas mas que, afinal de contas, acentua as desigualdades entre ricos e pobres, aumentando os custos com a educação e cortando na ação social escolar.
Temos um Governo que prepara o início do próximo ano letivo de forma ilegal, enviando para as escolas — e desminta isso, Sr. Ministro, se não for assim — matrizes curriculares que não têm cobertura legal, impondo às escolas a prática de ilegalidades, impondo às escolas um tipo de autonomia «pela arreata» e propondo alterações à gestão que diminuem a participação e a democracia.
Temos um Governo que propõe medidas securitárias estigmatizantes e socialmente discriminatórias, com a revisão do Estatuto do Aluno, mas que não poupa nos adjetivos sobre a democracia.
A verdade, Sr. Ministro, é que a política educativa deste Governo cumpre, no plano ideológico, a ofensiva económica, social e política que o Governo tem em curso.
A verdade é que os senhores, tal como empobrecem o povo e roubam os trabalhadores, fazem o mesmo à escola pública, que devia estar ao serviço do povo e dos filhos dos trabalhadores. Tal como não querem cidadãos que lutem pelos seus direitos degradam a qualidade da educação e da escola pública, para que tenhamos, amanhã, cidadãos incapazes de perceberem a realidade que os rodeia e de agirem sobre ela, transformando-a.
Os senhores, que tem interesse no desemprego para cumprir os objetivos de redução dos salários e de agravamento da exploração, promovem, também no plano da política educativa, os despedimentos de professores e de funcionários.
E a prova disto, Sr. Ministro, é que os senhores querem transformar a escola pública num instituto público de formação profissional, a prova disso é o seu discurso, Sr. Ministro, sobre a empregabilidade, uma vez mais.
Sr. Ministro, se a empregabilidade fosse o único critério e fundamento do ensino educativo, o que seria dos nossos atores, dos encenadores, dos cineastas, dos escritores, dos filósofos?!
O que seria de toda essa gente que contribui ativamente para que tenhamos um País mais desenvolvido?!
A empregabilidade, Sr. Ministro, era critério e fundamento nos séculos XVII e XVIII, quando os aprendizes iam para as corporações de ofício aprender um mister.
É esse o fundamento desta política educativa.
Os senhores querem impor ao País um retrocesso social e civilizacional, e é por isso que a luta contra a vossa política e contra o vosso Governo é uma luta pelo progresso e pelo desenvolvimento do País.
É por isso que, na segunda-feira, a discussão que vamos ter, nesta Assembleia da República, da moção de censura, apresentada pelo PCP, é também uma discussão em função do progresso e do desenvolvimento do País, contra o retrocesso que os senhores nos querem impor.
Aquela moção de censura, que vamos discutir na segunda-feira, justifica-se porque é ela própria um instrumento de combate a esse projeto de retrocesso social e civilizacional que o Governo quer impor.

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