Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

As medidas anunciadas pelo Governo no sentido da autonomia das escolas

Sr.ª Presidente,
Sr. Deputado Michael Seufert,
Hoje, o senhor substituiu dois «verbos de encher», que é o mérito e a excelência, por autonomia e liberdade de escolha. E veio dizer que este Governo está apostado em desmantelar a escola pública e favorecer a escola privada. «Trocado por miúdos» foi mais ou menos disto que tratou a declaração política do CDS.
É que o PCP sabe bem que o ataque à escola pública de qualidade para todos não começou agora, começou com Governos anteriores, designadamente com a anterior Ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues, que tomaram medidas com impactos gravíssimos no despedimento de milhares de professores, na constituição de mega-agrupamentos e no aumento do número de alunos por turma. Portanto, é verdade que o ataque à escola pública de Abril não começou com este Governo, mas também é verdade, Sr. Deputado, que a redução drástica do financiamento à escola pública e o favorecimento à escola privada foi profundamente acentuada desde 2011. Na verdade, entre 2011 e 2014 o Governo PSD/CDS reduziu em 1330 milhões o financiamento à escola pública.
Importa dizer, Sr. Deputado, que a liberdade de escolha não se faz só através do cheque-ensino, tal como a privatização e a mercantilização da educação e da escola pública não se faz só através do cheque-ensino. O Sr. Deputado sabe bem que, ao não autorizar a abertura de turmas na escola pública, mas autorizando a abertura de turmas na escola privada, o Governo está a privatizar a educação!
Está a gerar desemprego na escola pública e a favorecer a escola privada.
Veja bem, Sr. Deputado, que na semana passada rejeitou aqui uma proposta do PCP para a vinculação extraordinária dos professores do ensino artístico, mas o seu Ministro fez agora um despacho a dizer que na escola privada aquele ensino pode abrir, tendo emitido uma autorização para tal!
Portanto, do que se trata aqui é de uma opção política relativamente ao que deve ser beneficiado e ao que deve ser destruído.
Ora, este Governo tem objetivamente uma política educativa de desmantelamento da escola pública, com o desmantelamento das suas condições materiais e humanas e, acima de tudo, com o desmantelamento do seu papel. A escola pública consagrada na Constituição não é um pacote mínimo de serviços! A escola pública consagrada na Constituição é um pilar da democracia e é com isso que este Governo quer acabar. Quer acabar com o papel fundamental da escola pública para todos, independentemente das condições económicas e sociais dos alunos. Quer que os alunos sejam encaminhados para vias de primeira e para vias de segunda, em função do rendimento da sua família.
Quer, também por esta via, fazer um ajuste de contas com o 25 de Abril.
É por isso que pode «encher a boca» cada vez que quiser com a questão da autonomia. O que as escolas nos dizem é que registam a falta de professores e que transmitem essa falta de professores ao Ministério, mas não recebem autorização financeira para os contratar. Ou seja, reconhecem que há falta de funcionários, que há falta de psicólogos, que há hoje milhares de alunos na educação especial sem os apoios de que precisam e que são referenciados ao Ministério da Educação, mas — veja-se bem —, mesmo com os contratos de autonomia, o Ministério da Educação não autoriza a contratação dos meios materiais e humanos adequados.
Por isso é que sabemos bem, Sr. Deputado, que por detrás desse discurso da autonomia e da liberdade de escolha só está um objetivo, que é o do desmantelar da escola pública enquanto instrumento de emancipação individual e coletiva de um País, um pilar essencial para a defesa do regime democrático!

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