I
O Hospital de Cantanhede passou para a gestão pública após o 25 de Abril, sob o primado da criação de um serviço público de saúde universal e com cobertura nacional, ficando o Estado a pagar uma renda à respetiva Misericórdia.
O Hospital de Cantanhede responde a uma população de cerca de 60.000 utentes do concelho de Cantanhede, parte do concelho de Mira e uma freguesia do concelho de Montemor-o-Velho.
Quando, após o 25 de Abril, se procedeu à integração destes hospitais nos serviços hospitalares oficiais, muitas das instalações encontravam-se em elevado estado de degradação e com equipamentos obsoletos, o que obrigou o Estado a proceder a requalificações, ampliações e a adquirir equipamentos tecnologicamente mais avançados para providenciar a prestação de cuidados de saúde de qualidade. Tais intervenções implicaram um investimento público de largos milhões, suportado por dinheiros públicos, para benefício da saúde dos utentes.
O Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem sido alvo de políticas de fragilização, descredibilização e desmantelamento enquanto resposta universal, geral e gratuita. É neste contexto que se insere o processo de entrega do Hospital de Cantanhede à Misericórdia, desenvolvido nas costas das populações, dos utentes e dos trabalhadores.
Outra questão importante deste processo é a situação dos profissionais desta unidade hospitalar, pois não está garantida a salvaguarda dos seus direitos sociais e laborais.
II
O anterior Governo PSD/CDS-PP impôs uma reorganização da rede hospitalar, numa opção política de desmantelamento do serviço público visando a redução e concentração de serviços e valências, com o objetivo de reduzir o investimento público e a capacidade de resposta do SNS.
A par deste processo de reorganização hospitalar, o anterior Governo PSD/CDS desenvolveu uma progressiva e expressiva transferência da prestação de cuidados de saúde do setor público para o setor privado. Esta transferência foi evidente, quer por via do estabelecimento e consolidação de Parcerias Público Privadas, quer por via da transferência de montantes avultados, através dos pagamentos da ADSE e de outros subsistemas de saúde, para os grandes grupos económicos do setor da saúde.
Concorre também para o desmantelamento do SNS o Decreto – Lei nº 138/2013, de 9 de outubro, que “estabelece o regime de devolução dos hospitais das misericórdias (…) que foram integrados em 1974 no setor público e que atualmente estão geridos por estabelecimentos ou serviços do Serviço Nacional de Saúde.”
III
Entende o PCP que, na prática, o processo de entrega dos hospitais para as misericórdias constituiu um processo de privatização encapotado, na medida em que estas unidades deixam de ser geridas por uma entidade exclusivamente pública, para serem geridos por entidades privadas, ainda que de solidariedade social.
O PCP considera que é necessário reforçar a capacidade do SNS, dotando-o dos meios humanos, técnicos e financeiros para responder de forma adequada e capaz às necessidades dos utentes e não promover medidas que visam agravar a sua fragilização.
O direito à saúde só será garantido na íntegra a todos os utentes, quando for assumido diretamente por estabelecimentos públicos de saúde integrados no SNS. Para o PCP, só a gestão pública dos hospitais integrados no SNS cumpre os princípios constitucionais, nomeadamente, a universalidade e a qualidade dos cuidados de saúde, independentemente das condições sociais e económicas dos utentes.
Neste sentido, o PCP propõe que o Hospital de Cantanhede se mantenha sob gestão pública, integrado no SNS, para assegurar o direito à saúde a todos os utentes.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:
Resolução
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo que:
a) Mantenha o Hospital de Cantanhede sob gestão integralmente pública;
b) Mantenha todas as valências que são atualmente asseguradas e eventualmente possam vir a ser reforçadas face às necessidades da prestação de cuidados de saúde às populações;
c) Assegure a contratação efetiva de todos os profissionais que respondem às necessidades permanentes de funcionamento do Hospital de Cantanhede;
d) Proceda de imediato à abertura das urgências 24 horas por dia, durante todos os dias da semana.
Assembleia da República, em 15 de janeiro de 2016