A nova Linha de Alta Velocidade entre o Porto e Lisboa corresponde a uma necessidade nacional bem identificada há cerca de 30 anos. Ao longo destas décadas, o PCP tem apoiado todas as iniciativas destinadas à sua construção – e continuará a fazê-lo.
Mas, verdade seja dita, não tem sido por falta de apoio parlamentar que esta – e outras infraestruturas – vão derrapando no tempo, com a sua concretização sempre discutida na véspera de eleições e sempre adiada após as mesmas.
Agora aparece (outra vez) a conversa dos que querem mais estudos.
Se os Senhores Deputados fizerem a fineza de procurar no site da Infraestruturas de Portugal na Internet, encontram estudos de sobra, acerca da Alta Velocidade e dos seus projetos no nosso país. São de 2005, 2008, 2009, 2011.
E se esses estudos servem agora para alguma coisa, é para demonstrar que o problema nunca é a falta de estudos! Ou melhor, a falta de estudos é uma razão para não se fazer as coisas, até ao momento em que os estudos se fazem. Depois arranja-se outra razão.
E quando finalmente se chega a uma decisão sobre os projetos, é a execução e a concretização que fica a marcar passo! E assim se vão arrastando e adiando sistematicamente os investimentos.
O plano Ferrovia 2020 foi lançado em 2016, e devia ter sido concluído no final de 2021 – mas a Infraestruturas de Portugal (IP) admitiu já que o programa de investimentos só estará totalmente executado no início de 2025!
Dirão que alguém rogou uma praga sobre o investimento público em Portugal. De tal maneira que, na última década, entre 2012 e 2022, Portugal foi o segundo país da União Europeia com menor investimento público face ao PIB (logo a seguir à Irlanda).
Mas não é enguiço nem é azar – é política!
O que tem faltado é a vontade política, do PS e dos partidos da direita, de investir os recursos públicos na construção de uma rede de infraestruturas capaz de potenciar o desenvolvimento económico e social do país.
Mas ao mesmo tempo que apoia o desenvolvimento deste projeto, o PCP alerta para a necessidade de uma consideração fundamental quanto à transparência do processo, bem como de introduzir três alterações estruturais e realizar uma ação complementar, que em muito contribuiriam para que o mesmo melhor se concretizasse.
O impacto globalmente muito positivo da Linha de Alta Velocidade (LAV) Porto – Lisboa não deixa de induzir, pelo menos nas fases de projeto e construção, inquietações nas populações afetadas ao verem muitas vezes frustrado o investimento de uma vida, financeiro e emotivo, que julgavam seguro e de longo prazo, seja pelo efeito de barreira ou por via da destruição do edificado e/ou pela ocupação total ou parcial de terrenos.
E destaca-se o contributo das Autarquias Locais e das populações, essencial para maximizar os impactos positivos e minimizar os impactos negativos, sendo para o efeito, particularmente relevante o fornecimento de informação atempada e transparente.
As pessoas têm direito à informação. O silêncio da Infraestruturas de Portugal e de outras entidades gera incerteza e insegurança nas populações. A atempada consideração do contributo local permite ainda que onde alguns podem ver apenas um problema, outros possam apontar soluções que eliminem esse problema e ainda beneficiem toda a localidade ou região afetada.
A ação complementar que julgamos absolutamente necessária é a conclusão do Plano Ferroviário Nacional. O Governo tomou a iniciativa de apresentar uma proposta de Plano Ferroviário Nacional, e de o sujeitar à discussão pública. O PCP apresentou publicamente a sua avaliação desse plano, que aqui não desenvolveremos, mas onde destacou um conjunto de qualidades e de falhas do mesmo. Mas há, pelos vistos, uma dificuldade em finalizar esse processo.
As questões estruturais que reputamos de essenciais são três.
A primeira é a necessidade de abandonar o modelo PPP para a construção desta infraestrutura.
É preciso aprender com as más experiências e opções, como foram as PPP rodoviárias (que têm sugado os recursos nacionais há mais de 20 anos, com gastos anuais superiores a mil milhões de euros), e como foi a péssima experiência com a PPP da LAV Lisboa – Évora (onde o país está ameaçado de ter de pagar 220 milhões de euros por uma infraestrutura que nunca foi construída porque o Tribunal de Contas chumbou o contrato e porque a cegueira do governo PSD/CDS nunca lhes permitiu ver a importância para o país dessa ligação ferroviária).
Está perfeitamente identificado que a base da verdadeira corrupção que assola o país está, nomeadamente, situado na proliferação desse tipo de contratos entre o Estado e os grupos económicos e as multinacionais.
A segunda questão tem a ver com a chamada fase 6 da obra, na sua ligação a Lisboa a partir do Carregado. Tal como está hoje desenhada, esse é o único troço onde a infraestrutura será a mesma que a da atual Linha do Norte. Exatamente no ponto de maior taxa de ocupação da infraestrutura, e onde o serviço ferroviário já é insuficiente hoje por falta de espaço canal, particularmente o serviço suburbano à Azambuja.
A terceira questão: é preciso ter desde já em conta a necessidade de ligar a rede ferroviária nacional ao Aeroporto Internacional de Lisboa.
O facto do atual Aeroporto não possuir essa ligação é uma das razões que há 50 anos justifica a necessidade de o relocalizar. É que para o resto do país, a falta da ligação ferroviária ao Aeroporto Internacional de Lisboa dificulta, quer a mobilidade dos portugueses, quer a receção de turismo dirigido a essas regiões.
A solução para os dois problemas identificados anteriormente é a mesma, tal como o PCP já propôs publicamente: adotar um traçado que se situe na margem esquerda do Tejo, fazendo a Linha de Alta Velocidade seguir em frente no Carregado até ao Novo Aeroporto de Lisboa nos terrenos públicos do atual Campo de Tiro de Alcochete, e entrar em Lisboa através da Terceira Travessia do Tejo entre o Barreiro e Lisboa.
Esta solução permitiria uma Linha de Alta Velocidade direta a Lisboa sem constrangimentos de velocidade (que o atual projeto tem nos últimos 31 quilómetros), com a infraestrutura a ficar integrada na infraestrutura aeroportuária, permitindo serviços – de tipo intercidades – para o Aeroporto a partir de todo o país, sem a necessidade de passar por Lisboa e muito menos de intercambiar para outros modos de transporte em Lisboa.
Por outro lado, esta solução permitiria aumentar a oferta na Linha da Azambuja, mesmo sem quadruplicar a via em Vila Franca de Xira, como o atual projeto prevê com impactos inaceitáveis sobre a cidade e a população, o que conjugado com algum investimento na modernização das estações, poderia elevar a Linha da Azambuja, que serve a zona Oriental de Loures, e os Concelhos de Vila Franca e da Azambuja, a uma oferta ferroviária suburbana de qualidade.
Por último, esta solução implica igualmente que se avance, finalmente, com a construção da TTT em modo rodoferroviário, uma infraestrutura essencial para a Rede Ferroviária Nacional (e assim está corretamente identificada na atual proposta de Plano Ferroviário Nacional) quer para as ligações internacionais, nomeadamente a Madrid, quer para as ligações nacionais Norte-Sul, quer para a rede Metropolitana de Lisboa, particularmente nos concelhos do Barreiro, da Moita, Palmela e Setúbal.
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
O investimento público de qualidade, reprodutivo, potenciador da modernização das infraestruturas nacionais, potenciador da indústria e da produção nacional, faz falta como pão para a boca para a nossa economia, para o nosso desenvolvimento, para a nossa soberania.
Já ontem era tarde para avançar com estes investimentos. Mas é preciso aprender com a experiência concreta do nosso país. Aprender com o que tem sido o negócio ruinoso das PPP. Aprender com o resultado de decisões tomadas nas costas das populações locais, ignorando os seus interesses e aspirações.
É preciso arrepiar caminho. É mesmo caso para dizer – Basta de conversa! É preciso uma outra política. Uma política patriótica e de esquerda, que faça o país avançar para uma vida melhor!