Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados O Direito à Saúde consagrado na Constituição Portuguesa foi uma das maiores e mais importantes conquistas de Abril. Direito esse que o Estado tem a obrigação de assegurar à população portuguesa " (...)através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito (...)". Muitos gostariam que fosse tendencialmente pago ! E foi este Serviço Nacional de Saúde que ao longo de mais de duas décadas tem contribuído para a melhoria dos indicadores de saúde das populações, nomeadamente no que se refere à esperança de vida e à mortalidade infantil. A persistência de uma política de inspiração neo-liberal, apesar do empenhado esforço de muitos profissionais que exercem ou exerceram a sua actividade nas instituições do Serviço Nacional de Saúde, conduziu a uma situação de deterioração de muitos serviços, com evidente diminuição da capacidade de resposta e da qualidade dos cuidados prestados. Portugal é o país da União Europeia que tem menos gastos públicos com a saúde, e ao mesmo tempo, aquele em que o encargo financeiro suportado directamente pelos utentes com as despesas de saúde é mais elevado. Sendo a larga maioria da produção de cuidados de saúde da responsabilidade do SNS também é certo que, no que se refere aos meios complementares de diagnóstico, a produção é das mais baixas cabendo uma larga fatia ao sector privado convencionado. Os interesses ilegítimos que se foram instalando na área da saúde e a promiscuidade existente entre o sector privado e o sector público têm constituído um dos maiores obstáculos à resolução dos problemas do SNS. O Governo na anterior Legislatura não pode, não quis ou não soube afrontar os grupos de interesses económicos que interferem na Saúde nem conseguiu inverter a tendência verificada durante os Governos do PSD, fazendo prevalecer uma intervenção clara e inequivocamente empenhada na defesa e melhoria do SNS. E, com a nova equipe ministerial, pouco ou nada se perspectiva de bom, a ver pelas ordens e as contra ordens que se estão a verificar (como recentemente aconteceu com a implementação dos Centros de Responsabilidade Integrados) provocando uma perfeita paralisia do Serviço Nacional de Saúde. E a nossa preocupação ainda é maior quando a actual Ministra da Saúde nas suas afirmações nada refere quanto ao desenvolvimento de formas de organização e gestão das instituições de saúde que garantam a rendibilização dos equipamentos instalados, apontando como soluções o desenvolvimento do sector privado convencionado. O PCP defende o aproveitamento integral da capacidade instalada no SNS e o estabelecimento de um código de conduta que torne ilícito o desvio de doentes para consultórios privados ou o exercício da medicina privada dentro das instituições públicas. E não podemos permitir que se continue a verificar o claro contrabando do dinheiro dos cidadãos. No SNS estão milhões de contos investidos em equipamento, nomeadamente em meios auxiliares de diagnóstico, dinheiro esse que saiu do Orçamento de Estado e foi retirado dos impostos dos cidadãos. Esses mesmos equipamentos não funcionam, não são rentabilizados durante maiores períodos do dia, estão encaixotados durante anos, ou seja, não dão resposta às necessidades dos cidadãos. E, a seguir, o cidadão recorre ao sector privado convencionado que é pago pelo Governo com o dinheiro dos impostos. Como é que se pode compreender que na maioria dos hospitais os aparelhos se encontrem a descansar a partir das 16h00 ? Como é que se pode compreender que 90 % dos exames complementares de diagnóstico solicitados em Centros de Saúde sejam feitos nos convencionados quando os meios já hoje existentes permitiam dar resposta à quase totalidade das solicitações em Raio X, análise clínicas e ecografias. O Serviço Nacional de Saúde, apesar dos ataques que tem sofrido, continua a ter um papel fundamental e insubstituível na garantia do acesso aos cuidados de saúde. A retoma deste projecto por parte do PSD vem no sentido perfeitamente coerente da mais pura linha de "quem quer saúde que a pague". E está na linha da mais pura demagogia. O PCP não aceita que se dividam os portugueses em cidadãos de primeira e de segunda, entre aqueles que podem pagar directamente os custos dos cuidados que lhes são prestados e aqueles, a maioria, que por não terem capacidade económica ficam condenados a um sistema residual. Não é com medidas como esta que se assegura aos cidadãos portugueses, a tal maioria que não pode aceder aos cuidados de saúde privados, a acesso aos cuidados de saúde. Nem a saúde se pode reduzir ao incentivo à prescrição de meios auxiliares de diagnóstico. E a experiência demonstra que também nos consultórios privados e nos serviços com gestão privada se esperam horas pelo atendimento, obrigando os utilizadores a perderem o seu dia de trabalho. Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados O PCP assume a necessidade de criar formas de gestão e de organização dos serviços de saúde por forma a assegurar em tempo útil a resposta em cuidados que os cidadãos necessitam. Esta foi a nossas postura quando apresentámos o Programa Especial de Acesso aos Cuidados de Saúde. Esta é a nossa preocupação quando queremos que o Serviço Nacional de Saúde tenha os profissionais suficientes e indispensáveis à prestação de cuidados em quantidade e qualidade. E defendemos a implementação de medidas legislativas publicadas no fim da anterior legislatura. Estamos certos que poderiam traduzir-- se em novas formas de funcionamento e de rendibilização dos recursos existentes no Serviço Nacional de Saúde. É com apreensão que vemos o Governo condenar ao insucesso todo o trabalho desenvolvido por muitos profissionais de saúde. O Projecto de Lei do PSD hoje em discussão trás, mais uma vez, à ribalta as deficiências do SNS. Todos nós sabemos da carência de enfermeiros e médicos, das listas de espera (só não conhecemos os números reais das mesmas), do pessoal administrativo e auxiliar que por força dos contratos criam grande instabilidade no funcionamento dos serviços de saúde. E todos nós já ouvimos falar dos doentes que são transferidos dos serviços de atendimento permanente para as unidades hospitalares devido à falta de meios auxiliares de diagnóstico na maioria dos centros de saúde e das intermináveis horas de espera porque os equipamentos estão parados. Temos muitas dúvidas se o projecto em apreço visa aumentar a acessibilidade aos cuidados ou se, pelo contrário, não visa alimentar os interesses económicos que intervêm na área dos meios complementares de diagnóstico. E estamos certos que a propalada liberdade de escolha é deveras condicionada pela capacidade económica de uma larga maioria da população portuguesa. E mais, em coerência com o que referi anteriormente, este projecto não define as condições em que as prescrições podem ser efectuadas nem condiciona a prescrição à incapacidade instalada no Serviço Nacional de Saúde. Na mesma linha de coerência dificilmente este projecto pode ter o apoio do Partido Comunista Português porque acreditamos que não resolve o problema do cidadão e do seu acesso aos cuidados de saúde. Termino como o fizemos há cerca de quatro anos, nesta câmara: A solução para a acessibilidade aos cuidados de saúde chama-se Serviço Nacional de Saúde que espera, apenas, que haja vontade política para lhe dar os meios e a dignidade necessárias para cumprir os seus objectivos.