No debate realizado hoje na Assembleia da República em torno da pobreza e das desigualdades sociais, Jorge Machado afirmou que o governo não fracassou no combate à pobreza porque nunca foi essa a intenção, antes pelo contrário, o objectivo é concentrar a riqueza em meia duzia de grupos económicos e para isso é preciso empobrecer milhares de portugueses.
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Interpelação sobre pobreza e desigualdades sociais
(interpelação n.º 16/XII/3.ª)
Sr.ª Presidente,
Sr. Deputado Vieira da Silva,
Consideramos este debate extremamente importante.
É verdade que o Governo PSD/CDS-PP é responsável por um dos maiores agravamentos da pobreza no nosso País, em que 24,7% de risco de pobreza marcam uma página negra na história do nosso País. Estamos de acordo que a pobreza resulta dos cortes nas prestações sociais, do corte nos salários e do desemprego, mas, face à sua intervenção, impõe-se neste momento perguntar o que é que o Partido Socialista vai fazer. É um momento de clarificação.
O PCP assume o compromisso com o povo de devolver todos os direitos que foram roubados — salários, pensões, alterações à legislação laboral, proteção social —, mas também entendemos que é preciso ir mais longe e corrigir muitas das malfeitorias do anterior Governo PS.
Assim, Sr. Deputado Vieira da Silva, a pergunta que lhe faço é muito simples: que compromissos assume o Partido Socialista? Vai repor o que o PSD e o CDS-PP retiraram? Vai devolver os direitos dos trabalhadores? É que em muitas matérias de direito laboral o PS anda de mãos dadas com o PSD e o CDS-PP, como aconteceu, nomeadamente, há duas semanas, aquando da votação da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, no corte do trabalho suplementar, só a título de exemplo.
Vai o PS revogar o Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, do Governo PS, e a sua condição de recursos, que impediu, e impede, milhares de pessoas de receberem importantes prestações sociais? Vai recuperar os níveis de proteção no desemprego, revogando os Decretos-Leis n.os 220/2006, de 3 de novembro, e 72/2010, de 18 de junho, do Governo PS, que alteraram para pior as regras de atribuição do subsídio de desemprego?
No fundo, vai o PS, ou não, renunciar ao PEC 4 e à sua assinatura no pacto de agressão, bem como aos cortes nas pensões, nos salários e nos direitos que estes representavam? Ainda defende o PS aquilo que constava do PEC 4, que, entre outras medidas, previa um corte nas pensões de 425 milhões de euros, cortes na educação de 510 milhões de euros, cortes em prestações sociais de 340 milhões de euros, isto é, mais do mesmo, o mesmo que hoje o PSD e o CDS-PP estão a fazer?
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Ministro,
O senhor, desde que tomou posse, assume exatamente o mesmo discurso, não altera absolutamente nada. É um discurso de propaganda, com falsidades, que se desfaz que nem um castelo de cartas quando confrontado com a realidade.
O Sr. Ministro fala dos idosos, mas, ontem mesmo, milhares de reformados foram confrontados com o novo corte nas pensões de 37 €, 40 €, com o alargamento da CES.
O Sr. Ministro fala do rendimento social de inserção e diz que foram 500 000 — nem nas estatísticas acerta, Sr. Ministro! Os dados da própria segurança social referem que, em 2010, havia 404 000 e não os 500 000 de que fala.
Mais, o Sr. Ministro fala da pobreza dos reformados e diz que ela está a diminuir quando o INE diz precisamente o contrário, ou seja, que se agravou para os 22,4%.
Sr. Ministro, os dados do INE sobre os riscos de pobreza referem que 10,5% dos trabalhadores correm risco de pobreza. São milhares de trabalhadores que empobrecem trabalhando.
Sr. Ministro, a discussão em torno do salário mínimo nacional não está desligada desta questão. 485 € brutos é uma vergonha nacional, é um dos mais baixos salários mínimos da Europa. Há mais de 500 000 trabalhadores que levam para casa, depois de um mês inteiro de trabalho, 432 € líquidos, que é o que sobra depois dos impostos. Sr. Ministro — se quiser prestar atenção, se efetivamente quiser ouvir o debate —, 432 € não chegam para fazer face ao custo de vida.
Em face disto, gostaria de focar dois aspetos. Primeiro, o Governo não cumpriu o acordo de concertação social, à imagem do que fez o PS, que obrigava a que o salário mínimo nacional fosse, em 2011, de 500 €. E não o cumpriu porque não quis, porque nada impedia o Governo de o cumprir.
Segundo, gostaríamos de saber se o Governo se prepara ou não para, usando o aumento do salário mínimo nacional como moeda de troca, aplicar novas medidas de cortes nos rendimentos do trabalho, sendo o ataque à contratação coletiva o principal alvo.
No fundo, aumentam o salário mínimo nacional para retirar 100 € ou 200 € à generalidade dos trabalhadores, dando com uma mão e tirando com a outra, por via do ataque aos direitos de quem trabalha.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Ministro,
Srs. Deputados,
Ao contrário do que todos os dados indicam — a dívida aumentou para 130%, o défice continua elevado, o desemprego atingiu 1,4 milhões de trabalhadores portugueses, a pobreza atinge 2,6 milhões de portugueses —, apesar de todos estes dados, afirmamos que o Governo não fracassou, não fracassou no combate à pobreza porque nunca foi essa a intenção.
O Governo nunca teve a intenção de diminuir a pobreza no nosso País, antes pelo contrário; o objetivo é concentrar a riqueza em meia dúzia de grupos económicos e, por isso e para isso, é preciso empobrecer milhares de portugueses.
A verdade é que, num ano em que os portugueses passaram cada vez mais fome, em 2013, a EDP registou 105 milhões de euros de lucro, a Portucel, registou 210 milhões, o BES registou 517 milhões, a Galp registou 510 milhões, a Sonae registou 319 milhões, a Jerónimo Martins registou 382 milhões. Os lucros sempre a aumentar e as três maiores fortunas pessoais aumentaram em 17% a sua riqueza.
Portanto, está comprovado que o objetivo é concentrar a riqueza à custa de milhares e milhares de portugueses a passar fome.
Como o Governo não consegue justificar isto, por um lado, tenta negar a realidade e, por outro, recorre à falsidade.
Na semana passada, o Sr. Ministro Paulo Portas recorreu à mentira dos 100 000 euros relativamente aos cortes no rendimento social de inserção e hoje tivemos o Ministro Mota Soares a dizer que existiam 500 000 beneficiários de rendimento social de inserção, coisa que nunca existiu.
No nosso País, a pobreza apenas vai ser combatida quando houver uma melhor distribuição de riqueza, e isso, infelizmente, não é com este Governo de desgraça nacional, pois promove a sua concentração.