Projecto de Resolução N.º 107/XVII/1.ª

Garantia de uma verdadeira Educação Inclusiva na Escola Pública

Exposição de Motivos

A Constituição da República Portuguesa consagra o direito a todos à Educação, tendo o Estado a incumbência de garantir que esse direito se efetua em igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativo. Deste modo, deverá ser assegurada a universalidade e gratuitidade através de uma rede pública de estabelecimentos de ensino e educação com as valências adequadas e necessárias à concretização do direito à Educação.

As Normas das Nações Unidas sobre a Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiência (1993), a Declaração de Salamanca (1994), a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006) são instrumentos jurídicos internacionais, subscritos pelo Estado Português, que vinculam o Governo a garantir dignidade na vida das pessoas com deficiência, nomeadamente das crianças e jovens, bem como a igualdade de direitos no acesso e sucesso escolar para todas as crianças, jovens e adultos com deficiência, e a responsabilidade do Estado nessa matéria.

Os princípios vertidos num conjunto de instrumentos internacionais e em legislação nacional, bem como na Lei de Bases do Sistema Educativo e na Constituição da República, não têm tido a necessária tradução concreta, na vida de todos os dias, das crianças e jovens com necessidades educativas específicas (NEE) e com deficiência, designadamente no que se refere ao direito à Educação.

Ao longo dos anos, sucessivos governos foram responsáveis pelo desinvestimento na escola pública que tem significado menos condições para garantir a todos o devido acesso e sucesso em condições de igualdade. O PCP considera que importa dar passos firmes e concretizar medidas que garantam a efetiva e plena inclusão das crianças e jovens com necessidades educativas específicas e com deficiência em todo o ensino obrigatório. O cumprimento deste direito implica a garantia dos necessários meios humanos, materiais, técnicos e pedagógicos que respondam às necessidades de todas e de cada uma das crianças e jovens.

O PCP tem-se batido, ao longo dos anos pelo necessário reforço de docentes de Educação Especial, mas também de assistentes operacionais, psicólogos, intérpretes de Língua Gestual, terapeutas ocupacionais, terapeutas da fala e outros profissionais de Educação e de Educação Especial cuja presença nas escolas é imprescindível para a garantia do direito à Educação. Profissionais que devem ter um vínculo estável e devem ser devidamente valorizados. No Parecer n.º 7/2018, o Conselho Nacional de Educação recomenda “um reforço adequado nas escolas de recursos humanos, materiais e organizacionais” ao mesmo tempo que recomendam que a Intervenção Precoce seja considerada como um grupo de recrutamento de docentes. Recomendação que foi reiterada na resposta ao pedido de informação no âmbito da discussão da Petição 120/XVI/1.ª – Por uma inclusão efetiva nas escolas.

De acordo com o levantamento efetuado pela FENPROF, em janeiro de 2025, um dos principais obstáculos à concretização do direito à educação das crianças e jovens com necessidades educativas específicas é, efetivamente, a falta de recursos humanos nas escolas, tendo em conta que “80% dos AE/ENA considera que não tem os recursos necessários para levar por diante uma educação verdadeiramente inclusiva”. De acordo com as conclusões desse estudo, “64% dos Agrupamentos de Escolas/Escolas não Agrupadas (AE/ENA) afirmam que o número de docentes de Educação especial é insuficiente para dar resposta aos alunos que têm necessidades educativas específicas” e que “74% dos AE/ENA referem que já solicitaram mais docentes de Educação Especial ao Ministério da Educação, Ciência e Inovação, (MECI) mas não obtiveram resposta.”

Relativamente aos assistentes operacionais, “73% dos AE/ENA afirmam que o número é insuficiente face às necessidades existentes”. A falta de formação específica também é um dos problemas, sendo que apenas “1,8% tem formação adequada para trabalhar com os alunos com necessidades educativas específicas e que o MECI e AE/ENA não proporcionam a necessária formação de forma gratuita.”

No que concerne aos técnicos especializados, “77% dos AE/ENA refere que o número não é suficiente e que são necessários (…) para dar a resposta adequada a todos os alunos, nomeadamente, psicólogos, terapeutas da fala, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, medidores sociais, assistentes sociais, psicomotricistas, entre outros.”

Uma outra denuncia refere-se à constituição de turmas, que tendo em conta o mesmo estudo, do total das turmas consideradas no levantamento, 23% violam as normas estabelecidas para a sua constituição. Em alguns AE/ENA não é respeitado o número máximo de alunos que as turmas têm como limite se integrarem um ou dois alunos com necessidade de turma reduzida; noutros não se respeita o número de alunos com NEE em cada turma; e noutros casos, em 5% das situações identificadas no levantamento, nenhuma das normas é verificada.

Estas conclusões são secundadas pelo relatório promovido pelo Movimento Inclusão Efetiva, onde destacam que há uma falta de recursos humanos, físicos e financeiros, problemas a nível da relação entre escola e a família e/ou equipa médica. Referem ainda que “não existe equidade e igualdade de oportunidades entre distritos, nem dentro do mesmo distrito”, tendo em conta a transferência de competências e os recursos financeiros específicos de cada autarquia.

Para o PCP, a educação inclusiva deve promover em igualdade de oportunidades, o acesso e o sucesso educativo, a autonomia, a inclusão familiar, educativa e social, a estabilidade emocional, o desenvolvimento das possibilidades de comunicação físicas e intelectuais, a superação dos obstáculos e dos seus impactos, a preparação para o prosseguimento de estudos ou de uma adequada formação profissional e da integração na vida socioprofissional das crianças com necessidades educativas específicas.

Com o presente Projeto de Resolução o PCP pretende que a educação inclusiva se efetive plenamente na Escola, com o financiamento e recursos adequados e necessários garantindo:

  • A contratação de todos os trabalhadores necessários, com formação adequada;
  • A criação do grupo de recrutamento de Intervenção Precoce;
  • O reforço do número de horas de apoios diretos em educação inclusiva, de intervenção terapêutica e na coadjuvação ao docente titular, entre outros;
  • A revisão do rácio relativo ao número de alunos por turma e do relativo ao número de assistentes operacionais por escola;
  • A aquisição e produção dos recursos materiais e pedagógicos adequados ao processo de ensino aprendizagem das crianças e jovens com NEE.

Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomendar ao Governo que:

  1. Proceda à contratação do número adequado de trabalhadores afetos à educação inclusiva, designadamente, docentes de educação especial, assistentes operacionais e técnicos especializados;
  2. Crie o que Grupo de Recrutamento de Intervenção Precoce;
  3. Garanta a formação específica a todos os trabalhadores afetos à educação inclusiva, incluindo os trabalhadores das valências de alimentação, bibliotecas, serviços académicos, reprografias, entre outros;
  4. Garanta a formação pedagógica específica para professores, nomeadamente em instrumentos de avaliação dinâmica, planos educacionais individualizados, planos de transição entre disciplinas e ciclos, procedimentos de inovação e intervenção pedagógico-clínica, práticas e estratégias de inclusão efetiva;
  5. Aumente o número de horas de apoios diretos em educação inclusiva, de intervenção terapêutica e na coadjuvação ao docente titular, entre outros;
  6. Promova a realização de ações de formação junto das comunidades escolares relativa a temática da educação inclusiva, nomeadamente a aplicação da legislação específica;
  7. Reveja os rácios do número de alunos por turma, designadamente reduzindo o número de alunos no caso de turmas com alunos com necessidades educativas específicas (NEE), garantindo um máximo de dois alunos com NEE por turma;
  8. Reveja o rácio do número de assistentes operacionais por escola;
  9. Proceda à aquisição dos recursos materiais e pedagógicos adequados ao processo de ensino aprendizagem das crianças e jovens com NEE;
  10. Proceda à produção de materiais pedagógicos adaptados e apoios suplementares às aulas;
  11. Crie mecanismos que facilitem a transição do ensino secundário para o ensino superior, permitindo a preparação atempada da Instituição de Ensino Superior;
  12. Aprove um Regime Jurídico de Educação Inclusiva para o Ensino Superior;
  13. Garanta a plena acessibilidade comunicacional e informativa em todos os serviços (físicos e online) das Escolas;
  14. Tendo em conta o previsto nos pontos anteriores, garanta a dotação orçamental adequada, nomeadamente no que se refere à eliminação das barreiras arquitetónicas, à contratação dos profissionais necessários e à garantia dos materiais pedagógicos adequados às necessidades destes estudantes.
  • Educação e Ciência
  • Assembleia da República
  • educação inclusiva
  • Escola Pública