Projecto de Lei N.º 125/XIII/1.ª

Extingue o Arsenal do Alfeite, S.A. e determina a reintegração do Arsenal do Alfeite na orgânica da Marinha

Extingue o Arsenal do Alfeite, S.A. e determina a reintegração do Arsenal do Alfeite na orgânica da Marinha

Exposição de motivos

O Decreto-lei n.º 32/2009, de 5 de Fevereiro, extinguiu o Arsenal do Alfeite enquanto órgão de execução de serviços da Marinha e procedeu à sua transformação em sociedade anónima de capitais públicos (Arsenal do Alfeite, S.A.), integrada na EMPORDEF.

No preâmbulo desse diploma, foi invocada a necessidade de melhorar a “capacidade de gestão autónoma e flexível dos meios disponíveis e necessários para levar a cabo a reestruturação e modernização do seu aparelho industrial, não só para satisfazer melhor as crescentes exigências técnicas e tecnológicas dos novos meios navais, como também para pôr o seu conhecimento ao serviço de outros potenciais clientes nacionais e internacionais, em termos competitivos”.

No entanto, passados sete anos sobre a criação da Arsenal do Alfeite S.A., o balanço é marcadamente negativo. Na verdade, as melhorias que decorreriam da dita “empresarialização” não se fizeram sentir, e bem pelo contrário, a sua evolução foi no sentido da degradação das capacidades do Arsenal do Alfeite tendo em conta o objetivo central da sua existência.

A opção tomada em 2009 desconsiderou a razão de existir do Arsenal do Alfeite, que é a sua relação indissolúvel com a Marinha Portuguesa. O Arsenal do Alfeite, que sucedeu em 1937 ao Arsenal da Marinha sedeado em Lisboa, foi criado para servir a Marinha Portuguesa, enquanto unidade industrial vocacionada para a manutenção dos navios da Marinha, dotada de capacidade para a construção de navios de pequeno porte, e com possibilidades de prestar serviços a entidades externas, nacionais e estrangeiras, quer públicas (designadamente à marinha de outros Estados) quer do sector privado (designadamente marinha mercante e de recreio).

A chamada “empresarialização” assentou no pressuposto de uma relação cliente/fornecedor entre a Marinha e o Arsenal. Porém, a Marinha não pode ser um mero cliente do Arsenal. Não apenas por ser quase o único, dado que a captação de outros clientes não deu até à data os resultados que se anunciavam, mas fundamentalmente porque o Arsenal foi criado para a Marinha. Não há Arsenal sem a Marinha e não há Marinha sem o Arsenal.

Assim, o PCP considera que a solução adequada e segura, para o Arsenal e para a Marinha, é a sua reintegração orgânica. O Arsenal deve ser um estabelecimento fabril das Forças Armadas, integrado na Administração Direta do Estado sob tutela do Ministério da Defesa Nacional e na orgânica da Marinha, como sempre foi até 2009. E esta opção não constitui um retrocesso relativamente às medidas de modernização e de captação de clientes por parte dessa estrutura empresarial, antes pelo contrário.

É indispensável a concretização de uma estratégia de modernização do Estaleiro, com a realização dos necessários investimentos que permitam ao Arsenal enfrentar os novos desafios e de que são alguns exemplos a dragagem da bacia de manobras; a reparação da Doca Flutuante; da Ponte-Cais; das muralhas; a continuação da manutenção do plano inclinado (estrutura com cerca de 80 anos); a remodelação/reparação do parque de gruas automóveis, tratores, empilhadores e carros elétricos, etc.

É imperioso garantir que todas as operações de manutenção dos submarinos da Marinha Portuguesa, incluindo as que implicam docagem, venham a realizadas no Arsenal, aproveitando a reconhecida capacidade e experiência nesta área, bem como a formação já ministrada no estrangeiro a alguns trabalhadores. No mesmo sentido, há que rejeitar e combater frontalmente a imposição de eventuais condições contratuais, lesivas dos interesses nacionais, entre o Estado Português e o consórcio fabricante destes submarinos que, a existirem, devem ser denunciadas ou renegociadas.

É urgente a reversão dos efeitos da operação financeira efetuada há anos pela EMPORDEF, a qual resultou na canalização para outros fins da verba predestinada à modernização do Arsenal, e a aplicação imediata dessa mesma verba nas necessárias intervenções, reequipamentos e aquisição de ferramentas para o Arsenal do Alfeite. Em 2009, aquando da transformação do Arsenal do Alfeite em “SA”, foram prometidos 35 milhões de euros de capitalização do Estado e o recurso ao crédito para um financiamento de igual montante. Na verdade, o que aconteceu foi a “transferência” para o exterior de 18 milhões, que não chegaram sequer a ser usados pelo Arsenal.

Tal acima se referiu, o Arsenal do Alfeite carece de investimento com vista à modernização das suas infraestruturas, na recuperação dos seus edifícios e na compra de materiais de laboração, ferramentas – mas, não menos importante, carece de medidas de fundo ao nível dos recursos humanos, na valorização dos sues conhecimentos e das suas carreiras, na transmissão de décadas de experiencia e conhecimento a gerações mais jovens, situação antagónica aos dias de hoje, para assim se poder continuar a impor como estaleiro de referência nacional e internacional que sempre foi e pretende continuar a ser. As capacidades do Arsenal são fundamentais para a Marinha e que os trabalhadores do Arsenal têm dado provas notáveis de dedicação, qualificação e profissionalismo.

É imperioso combater a precariedade e a subcontratação e defender o emprego estável e com direitos, com a tomada de medidas que concretizem a aplicação de vínculo efetivo a todos os trabalhadores – sublinhando-se aqui a importância da reposição do regime de contrato de trabalho em funções públicas, até tendo em conta a experiência desastrosa para os trabalhadores que constituiu o regime de “acordo de cedência de interesse público”. Por outro lado, importa que, em todas as situações em que tal seja possível, as necessidades de pessoal no Estaleiro sejam supridas, antes de mais, com os trabalhadores em situação dita de «Requalificação». Tal opção é, não só da mais elementar justiça, como a solução mais adequada para o pleno aproveitamento das potencialidades, das capacidades e do conhecimento dos trabalhadores arsenalistas.

As opções políticas e legislativas no tocante ao Arsenal do Alfeite não podem deixar de ter em conta o que foi a experiência concreta do país neste sector das indústrias navais e de defesa – designadamente nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, também integrados no grupo EMPORDEF. Os ENVC, que asseguraram a construção dos Navios de Patrulha Oceânica (NPO) para a Marinha Portuguesa e que foram uma empresa de referência da construção naval em Portugal, e construíram apenas uma pequena parte do que estava previsto que construíssem para a Marinha, foram extintos e foram concessionadas as respetivas instalações, saldando-se pela destruição de postos de trabalho e de direitos dos trabalhadores dos Estaleiros.

Entretanto, com a extinção dos ENVC, foi anunciada publicamente pelo então Ministro da Defesa Nacional a extinção do grupo EMPORDEF – decisão cuja concretização tem vindo a ser preparada. No caso do Arsenal do Alfeite, excluída que deve ser, em absoluto, a possibilidade de privatização, só resta a internalização, a qual, só pode logicamente ser concretizada com a reintegração na Marinha. Foi essa a proposta feita pela primeira vez pelo PCP em 2013 com a apresentação do Projeto de Lei n.º 354/XII.

É essa a proposta que, com razões acrescidas, agora se apresenta, sete anos após a publicação do diploma que veio impor a passagem do Arsenal do Alfeite a sociedade anónima.

Assim, ao abrigo da alínea b) do Artigo 156.º da Constituição da República e da alínea b) do número 1 do Artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Extinção da Arsenal do Alfeite, S.A.

Pela presente lei, é extinta a sociedade anónima de capitais públicos “Arsenal do Alfeite S.A.”, e determinada a reintegração dessa estrutura empresarial no âmbito da Marinha.

Artigo 2.º
Processo de extinção

A extinção da “Arsenal do Alfeite S.A.”, efetua-se com a transmissão de todo o património ativo e passivo da sociedade para a Marinha.

Artigo 3.º
Natureza jurídica

O Arsenal do Alfeite é um estabelecimento fabril das Forças Armadas, integrado na administração direta do Estado como órgão de execução de serviços da Marinha.

Artigo 4.º
Estatuto do pessoal

1 – Os militares do quadro permanente, no ativo ou na situação de reserva na efetividade de serviço, podem prestar serviço no Arsenal do Alfeite em comissão normal, nos termos do Estatuto dos Militares das Forças Armadas.
2 – O estatuto profissional dos trabalhadores civis do Arsenal do Alfeite rege-se pelo regime de contrato de trabalho em funções públicas.

Artigo 5.º
Regulamentação

O Governo, no prazo de 180 dias após a aprovação da presente lei, promove as alterações à Lei Orgânica da Marinha necessárias à sua execução, ouvido o Chefe de Estado Maior da Armada.

Artigo 6.º
Norma revogatória

São revogados os Decretos-Leis n.º 32/2009 e n.º 33/2009, de 5 de Fevereiro.

Assembleia da República, em 5 de fevereiro de 2016

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