Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Deputados
A proposta de lei n.º 183/VII, que o Governo apresentou a esta Assembleia, pretende definir as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de serviços postais no território nacional, incluindo os internacionais com origem ou destino no território nacional.
No entanto, o seu conteúdo não consegue atingir, a nosso ver, a necessária clarificação dos objectivos que deveriam presidir a matéria de importância fundamental para o País como é a comunicação via postal.
Limita-se o articulado a uma transposição mecanicista para a legislação nacional da Directiva Europeia n.º 97/67/CE, transposição disciplinada, é verdade, mas só de generalidades, ficando o essencial para regulamentação posterior sem definir, como lhe competia, os parâmetros de enquadramento dessa regulamentação
Cheia de fúria liberalizadora e vontade de satisfazer os anseios dos grupos económicos na exploração da parte rentável dos serviços postais portugueses, é evidente, mas esquecendo-se de clarificar as condições para autorizar essa privatização, garantindo a natureza essencial do serviço e a sua especificidade, incluindo a salvaguarda dos direitos de cidadania em matéria de correspondência, da segurança e da protecção de dados pessoais.
Assemelha-se àquele aluno que, sendo capaz de reproduzir num teste teórico qualquer página do manual, que decorou por inteiro, incluindo as vírgulas, não consegue, todavia, executar um único exercício prático, que seja, de aplicação da matéria.
São várias as questões inaceitáveis nesta proposta de lei Em primeiro lugar, o Governo ignorou completamente o serviço público de correios, adaptando por tradução, o chamado "serviço universal" que se trata, de facto, de um serviço mínimo garantido até 2003, com qualidade e custos controlados, embora sem parâmetros definidos, ficando todos os outros serviços sujeitos à concorrência Esta situação não pode deixar de nos trazer à memória automaticamente as experiências "brilhantes" das tarifas da electricidade e das chamadas telefónicas locais.
Não é esta seguramente a forma de tratar um serviço de primeira necessidade para os portugueses individualmente, mas também indispensável ao desenvolvimento regional e às actividades económicas, sociais e culturais.
Em segundo lugar, os CTT - Correios de Portugal, operador público português, embora não reconhecido na proposta de lei como tal, ficarão com a incumbência de prestação do tal serviço mínimo e da gestão e exploração da rede pública, sem o reconhecimento de que se trata de um serviço público e sem a garantia de financiamento de actividades que, como já acontece hoje, venham a revelar-se deficitárias.
Poderá ter acesso a um fundo de compensação de custos de serviço universal proveniente dos prestadores de serviços postais, sem qualquer critério definido à partida quando, como é evidente, se deveria basear numa percentagem da facturação efectuada.
Fica ainda com alguns serviços reservados em regime de exclusivo que, a qualquer altura, o Governo poderá retirar, de modo próprio, ou por iniciativa comunitária, no quadro da liberalização progressiva no sector o que não é, de forma nenhuma, tranquilizador para os CTT, que têm apenas 30% do tráfego médio europeu, com tendência para crescimento em especial no chamado direct mail que, evidentemente, não resistirá à cobiça privatizador assim que atinja valores interessantes.
Em terceiro lugar, a garantia dos direitos dos trabalhadores dos CTT, designadamente no que se refere a manutenção dos postos de trabalho e ao fundo de pensões com o défice actual de cerca de 95 milhões de contos, contratualizado com a empresa para a sua reposição em 26 anos, contrato que poderá ficar comprometido com a aplicação desta lei, dado que não é tido minimamente em consideração, quer na obrigatoriedade da prestação de serviço deficitário, quer nas condições concorrenciais.
Refira-se ainda que, relativamente as concessões a privados, não e estabelecida a qualidade do serviço a prestar, a forma de concessão, a garantia de meios próprios, a efectividade de fiscalização, o direito dos utilizadores a audição através de um conselho nacional e a clarificação das infracções.
Por outro lado, ao operador de serviço publico não são dadas garantias de um serviço publico e actividades exclusivas de forma estável, bem como um financiamento do fundo de compensação, definido a partida de forma a garantir todos os compromissos dos CTT, incluindo o do Fundo de Pensões.
Obriga se o operador de serviço publico a manutenção e gestão de uma rede publica necessariamente onerosa, que pode-a constituir mais um financiamento indevido do sector privado, se não for definido, como efectivamente não esta neste diploma, que o acesso se faça exclusivamente de forma integrada e a preços de custo.
Sr Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Deputados:
A presente proposta de lei não serve as condições concretas do nosso serviço postal, não garante a qualidade e preço que se exige a um serviço publico com a natureza social que lhe é intrínseca, não assegura a defesa dos direitos de cidadania dos seus utilizadores, nem garante os direitos dos trabalhadores dos CTT - Correios de Portugal, pelo que merece a nossa rejeição.