Exposição de motivos
Com a epidemia de COVID-19, têm sido de enorme gravidade as consequências que se abateram sobre milhares e milhares de micro e pequenas empresas, confrontadas com a paragem forçada, a perda brutal (muitas vezes, total) de rendimentos.
Para além das situações de paragem forçada da atividade, ou do seu forte condicionamento, que se verificou na sequência das decisões das autoridades competentes, em nome da defesa da saúde pública para conter a propagação da epidemia, observa-se um quadro generalizado de quebra acentuada de vendas no presente contexto, face à diminuição da procura interna, ou do turismo.
Em sectores como o comércio, a restauração, os serviços, o turismo, há centenas de milhares de empresas que estão confrontadas com uma situação particularmente gravosa: as receitas caíram a pique, ao passo que as despesas se mantiveram inalteradas, desde logo nos contratos de arrendamento.
São muitos os empresários que dão conta de uma situação aflitiva, em que as vendas realizadas não atingem sequer o valor necessário para pagar a renda do estabelecimento, e, no entanto, o que continua a acontecer é que, para a imensa maioria das micro e pequenas empresas, os apoios anunciados e aprovados pelo Governo continuam a não chegar aos destinatários.
Recorde-se que, desde o início da crise pandémica o PCP tem vindo a apresentar um vasto conjunto de propostas de alteração. Dessas constava, para os arrendatários, a redução dos valores de renda em igual percentagem da redução dos seus rendimentos. O diferencial seria subsidiado pelo Estado diretamente ao senhorio. Para evitar subsidiar valores especulativos de renda, o subsídio era concedido apenas nos casos em que a renda anual fosse igual ou inferior a 1/15 avos do valor patrimonial tributário atual ou até esse valor nas rendas superiores a 1/15 avos.
Assim, quanto às rendas, ao seu valor e ao seu pagamento, importa sublinhar que as situações de perda de rendimentos por parte do inquilino – neste caso, do micro ou pequeno empresário – devem ser respondidas não com a acumulação de dívida para pagar mais tarde, mas sim com a redução proporcional do valor da renda.
Ou seja, se o inquilino perde rendimento, deve pagar menos renda, e o senhorio deve ser compensado pelo Estado no valor correspondente. É esta a solução mais justa, e é a proposta do PCP. Estabelecendo o limite dos montantes da renda em função do valor do imóvel, evita-se que o Estado possa subsidiar rendas especulativas.
Estas são propostas concretas e construtivas do PCP, que visam contribuir para a defesa das micro e pequenas empresas face ao impacto da pandemia no plano económico e social, cujas consequências – tal como tem vindo a ficar cada vez mais evidente – não têm vindo a fazer-se sentir de forma idêntica para todos.
Importa aliás sublinhar que as medidas propostas pelo PCP e recentemente aprovadas na Assembleia da República, em sede de Orçamento Suplementar, relativamente aos contratos das instalações em espaços comerciais para defesa dos lojistas, eram parte integrante de um conjunto de medidas apresentadas por este Partido que incluíam o apoio às micro e pequenas empresas neste âmbito e que respondiam aos problemas sentidos pelo “comércio de rua”, nos mais diversos ramos de atividade – as quais nesta matéria foram rejeitadas pela conjugação dos votos do PS e PSD. Razão pela qual é indispensável retomar esse debate e esta proposta do PCP em defesa destas empresas no que respeita ao arrendamento.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece um regime excecional no pagamento de renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano não habitacional, atendendo à situação posterior decorrente da declaração do estado de emergência e desde que seja comprovada a diminuição de rendimento.
Artigo 2.º
Âmbito territorial
A presente lei é aplicável em todo o território nacional.
Artigo 3.º
Universo de aplicação
A presente lei é aplicável:
- Às micro e pequenas empresas e empresários em nome individual que se encontrem em situação de crise empresarial, definida como tal nos termos legalmente previstos, atendendo à situação epidemiológica provocada pela doença COVID-19;
- Aos contratos titulados por associações desportivas, culturais, sociais ou recreativas que se encontrem em situação de crise e impedimento de desenvolver as atividades que lhes são atribuídas no respetivo estatuto.
Artigo 4.º
Moratória no pagamento das rendas não habitacionais
- É prolongado até ao dia 30 de cada mês o período de pagamento das rendas não habitacionais.
- Nos casos comprovados de redução ou paralisia das atividades económicas, sociais ou culturais, nos termos do artigo anterior, é aplicada, a pedido do inquilino, uma redução de igual percentagem nas respetivas rendas, sendo o diferencial subsidiado pelo Estado diretamente ao senhorio.
- O subsídio previsto no número anterior apenas é concedido aos senhorios cujas rendas sejam iguais ou inferiores a 1/15 do Valor Patrimonial Tributário atual do locado ou até esse valor nas rendas superiores a 1/15.
- O processo de demonstração da quebra de rendimentos e de atribuição do subsídio é definido por portaria a aprovar pelo membro do Governo responsável pela área da Economia.
Artigo 5.º
Deveres de informação
Os arrendatários que se vejam impossibilitados do pagamento da renda têm o dever de informar o senhorio, por escrito, até cinco dias antes do vencimento da primeira renda em que pretendem beneficiar do regime previsto, juntando a documentação comprovativa da situação, nos termos da portaria a que se refere o n.º 5 do artigo 4.º.
Artigo 6.º
Regime extraordinário de proteção dos arrendatários
Até à cessação da situação dos arrendatários abrangidos na presente lei, fica suspensa:
- A produção de efeitos das denúncias de contratos de arrendamento efetuadas pelo senhorio;
- A caducidade dos contratos de arrendamento, salvo se o arrendatário não se opuser à cessação;
- A produção de efeitos da revogação, da oposição à renovação de contratos de arrendamento efetuadas pelo senhorio;
- O prazo indicado no artigo 1053.º do Código Civil, se o término desse prazo ocorrer durante o período de tempo em que a situação do arrendatário se mantiver.
Artigo 7.º
Aplicação da lei no tempo
A presente lei é aplicável às rendas vencidas a partir do dia 1 de abril de 2020.
Artigo 8.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.