Projecto de Lei N.º 343/XIV/1.ª

Estabelece restrições à publicidade nos jogos e apostas

(15.ª alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de outubro).

Exposição de motivos

Argumentando com a necessidade de legalização do jogo e apostas online, em 2014 o Governo PSD e CDS apresentou à Assembleia da República uma proposta de autorização legislativa, que visou entre outros, criar o regime jurídico de jogos e apostas online, com alterações significativas no plano fiscal e possibilitando a publicidade ao jogo e apostas em qualquer órgão de comunicação, incluindo a mais de 250 metros das escolas, tal como veio a ser aprovado.

Na altura o PCP suscitou dúvidas e preocupações com a alteração do código da publicidade no sentido de permitir a publicidade e a promoção do jogo e das apostas que até então era proibida.

É verdade que havia um vazio legislativo relativamente ao jogo e apostas online, mas criar um regime mais permissivo, onde são possíveis o incitamento e os estímulos ao jogo e apostas online, constituiu um motivo acrescido de preocupação, quando estão identificadas as consequências negativas da dependência do jogo.

Em caso de dependência do jogo, no espaço físico é possível o controlo de interdições, no mundo virtual, em que o acesso não é presencial, é mais fácil contornar o controlo, o que exige uma maior intervenção.

Na Código de Publicidade em vigor, na sequência da aprovação da autorização legislativa em 2014, com a nossa oposição, é referido que “a publicidade de jogos e apostas deve ser efetuada de forma socialmente responsável, respeitando, nomeadamente, a proteção dos menores, bem como de outros grupos vulneráveis e de risco, privilegiando o aspeto lúdico da atividade dos jogos e apostas e não menosprezando os não jogadores, não apelando a aspetos que se prendam com a obtenção fácil de um ganho, não sugerindo sucesso, êxito social ou especiais aptidões por efeito do jogo, nem encorajando práticas excessivas de jogo ou aposta”. Apesar destas referências na legislação, na prática isso não se verifica. Há uma agressiva publicidade, nomeadamente ao jogo e apostas online.

Esta realidade constitui motivo de preocupação acrescida, devido à existência de mais estímulos para os jogos e apostas, com os riscos associados de provocar dependência. Para as pessoas com dependência do jogo e para as pessoas mais vulneráveis, a facilidade do acesso aos jogos e apostas online é extremamente prejudicial e pode ser um aspeto que contribui para o agravamento de dependência e para o aumento da dependência ao jogo na população em geral.

Hoje a dependência do jogo é acompanhada pelo Serviço de Intervenção dos Comportamentos Aditivos e das Dependências (SICAD).

No documento do SICAD, intitulado “Linhas de Orientação Técnica para a Intervenção em Comportamentos Aditivos e Dependências sem Substância – Perturbação do Jogo”, a dependência do jogo é entendida da seguinte forma:

O Jogo é hoje validado no plano científico não como uma perturbação do controlo dos impulsos mas como uma patologia aditiva sem substância, envolvendo circuitos e regiões cerebrais (e concomitante disfunção) tipicamente envolvidos nos comportamentos aditivos e dependências (CAD) decorrentes do uso continuado de substâncias psicoativas. Também como frequentemente se observa nos CAD com substância, no Jogo verifica-se um enfoque gradativo no objeto aditivo em detrimento da priorização das atividades que comummente promovem o prazer humanizado, associado às experiências relacionais, familiares e afiliativas, ao trabalho, ao lazer, entre outros. Também no Jogo a deterioração psicossocial tende a agravar-se, não apenas nas situações de jogo a dinheiro como naquelas que, frequentemente, isolam o indivíduo da relação com o meio envolvente, como o caso do jogo online. Também o Jogo cursa frequentemente com comorbilidades, designadamente no plano psiquiátrico. Também o Jogo deve ser entendido num enquadramento mais abrangente da história de vida do indivíduo, no seu contexto, com as suas circunstâncias e numa dada etapa do seu ciclo de vida.”

Não existem ainda estudos muito desenvolvidos sobre a realidade do jogo no nosso país. No entanto, o documento acima referido, avança alguns elementos, nomeadamente que “a prevalência de jogo a dinheiro em Portugal é de 65,7%, sendo mais elevada no género masculino e entre os 35-44 anos” e “que cerca de um terço da população não pratica qualquer um dos tipos de jogos enunciados”, totobola ou totoloto; lotarias; jogos de cartas, entre amigos ou conhecidos; jogos de apostas, entre amigos ou conhecidos; jogos de apostas em salões de jogo; raspadinha; euromilhões; jogos de dados; jogos de perícia e jogos desportivos. Diz que “embora dois terços (65,7%) praticam ou praticaram alguma vez qualquer jogo (24,4% que jogam/jogaram um só tipo de jogo, 16% que jogam/jogaram dois tipos de jogo, 10% três tipos de jogo, 9% quatro tipos de jogo e 6% cinco ou mais tipos de jogo”. Refere ainda que “20% dos jovens utilizam a internet para práticas de jogo de forma regular (pelo menos 4 vezes nos últimos 7 dias). O jogo online parece ser muito mais comum nos rapazes (39%) do que nas raparigas (5%). O jogo a dinheiro online verifica-se em 2% dos jovens, com maior predominância nos rapazes.”

A esta realidade, nos tempos que vivemos acresce os condicionamentos existentes devido ao surto epidémico da covid 19, que implicou o encerramento de casinos, bingos e salas de jogos e com o confinamento nas habitações, há um sério risco de recurso ao jogo e apostas online. Para além das perturbações mentais que podem aumentar na população devido ao distanciamento social e ao confinamento nas habitações, em que as pessoas saem somente naquilo que for estritamente necessário, pode surgir o agravamento da perturbação do jogo para as pessoas com dependência ou o aumento dessa perturbação.

O PCP entende que é preciso limitar o acesso ao jogo e apostas, nomeadamente online atendendo às implicações que pode ter no plano clínico e da saúde mental das pessoas. É preciso reduzir muito significativamente os estímulos, a publicidade que está permanentemente presente na internet e nos órgãos de comunicação, por isso propomos a presente iniciativa no sentido da proibição da publicidade ao jogo e apostas em horários e condições específicas, equiparando à legislação sobre a publicidade de bebidas alcoólicas, como medida de proteção da saúde.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece restrições à publicidade nos jogos e apostas, procedendo à 15ª alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de outubro.

Artigo 2.º

Alteração ao Código da Publicidade

É alterado o artigo 21º do Código da Publicidade, na sua versão atualizada, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 21.º

Jogos e apostas

  1. […].
  2. […].
  3. […].
  4. […].
  5. […].
  6. […].
  7. É proibida a publicidade a jogos e apostas, em sítios e páginas na internet da responsabilidade de empresas e entidades com sede em Portugal, na televisão e na rádio e na imprensa escrita, entre as 7 horas e as 22 horas e 30 minutos.
  8. Para efeitos do disposto no número anterior é considerada a hora oficial do local de origem da emissão.
  9. (atual n.º 7).»

Artigo 3.º

Entrada em Vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.