Projecto de Lei N.º 229/XV/1.ª

Estabelece medidas de redução do número de alunos por turma visando a melhoria do processo de ensino-aprendizagem

Exposição de motivos

De acordo com o artigo 73.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), cabe ao Estado efetivar “as condições para que a Educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais”.

Este dever tem sido desrespeitado de forma flagrante por sucessivos governos que, apostando numa política de desmantelamento da escola pública democrática e do seu papel, aprofundaram medidas de degradação das condições de organização pedagógica e de funcionamento. Tal refletiu-se muito negativamente nas condições de aprendizagem e na própria qualidade do ensino.

A redução do número de alunos por turma realizada nos últimos anos foi claramente insuficiente. O PCP apresentou sucessivas propostas para levar a redução do número de alunos por turma mais longe, apresentando medidas que teriam sido ainda mais importantes tendo em conta o contexto do surto epidémico e a necessidade de recuperar as aprendizagens.

Os objetivos de desenvolvimento dos alunos previstas na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) são incompatíveis com turmas nas quais o professor não tem condições objetivas de acompanhar próxima e atempadamente o processo de aprendizagem específico de cada um dos alunos, quer seja na educação pré-escolar, quer seja no ensino básico ou secundário.

Ao longo destes anos, têm-se generalizado situações de aumento da carga burocrática do trabalho docente e de negação de condições para um ensino individualizado, conforme consagra a LBSE, que afetam docentes dos diferentes níveis e graus de ensino e educação. A própria diferenciação pedagógica é comprometida, sendo muito mais difícil combater o insucesso escolar, o abandono e promover a inclusão.

Também do ponto de vista humano e pedagógico, às exigências que se colocam à escola pública devem corresponder os meios e as condições adequados. A capacidade de acompanhamento de cada aluno, o relacionamento com as famílias dos estudantes por parte dos professores, tem uma relação direta com a dimensão das turmas que lecionam e com o número total de estudantes com que trabalham.

O PCP defende o reforço inequívoco da escola pública e mais investimento; a contratação dos auxiliares de ação educativa de acordo com as necessidades das escolas e não de rácios completamente desajustados à realidade; a contratação dos professores em falta, não apenas para suprir as falhas como para recuperar défices criados com o ensino à distância nos últimos anos letivos; a contratação de mais assistentes técnicos e outros técnicos especializados, bem como a melhoria do parque escolar. É fundamental reforçar os apoios aos alunos e isso só é possível com o reforço do número de profissionais a todos os níveis. A escola pública de qualidade deve responder sempre aos objetivos da inclusão, garantindo efetivamente a igualdade de oportunidades para todos. Neste sentido, a redução do número de alunos por turma é mais do que nunca essencial.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto e âmbito

  1. A presente lei regula a constituição de turmas nos estabelecimentos de educação pré-escolar e de ensino no âmbito da escolaridade obrigatória.
  2. A presente lei aplica-se:
    1. Aos agrupamentos de escolas e às escolas não agrupadas da rede pública;
    2. Aos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo com contrato de associação;
    3. A outras instituições de educação e ou formação, reconhecidas pelas entidades competentes, designadamente às escolas profissionais privadas.

Artigo 2.º

Constituição de turmas

Na constituição das turmas devem prevalecer critérios de natureza pedagógica, em respeito pelas especificidades previstas nos projetos educativos das escolas ou agrupamentos.

Artigo 3.º

Estabelecimentos de educação pré-escolar

  1. Nos estabelecimentos de educação pré-escolar a relação deve ser de 19 crianças para um docente.
  2. Quando se trate de uma turma homogénea de três anos de idade, o número de crianças por turma não pode ser superior a 13.
  3. As turmas que integrem crianças apoiadas com medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão ou outros critérios pedagógicos julgados pertinentes, no quadro da autonomia dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, são constituídas por um número máximo de 15 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nessas condições.

Artigo 4.º

Constituição de turmas no 1.º ciclo do ensino básico

  1. As turmas do 1.º ciclo do ensino básico são constituídas por um número máximo de 19 alunos.
  2. As turmas integradas nos territórios educativos de intervenção prioritária são constituídas por um número máximo de 17 alunos.
  3. As turmas que integrem alunos apoiados com medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão ou outros critérios pedagógicos julgados pertinentes, no quadro da autonomia dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, são constituídas por um número máximo de 15 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nestas condições.
  4. Sem prejuízo do número seguinte, as turmas do 1º ciclo do ensino básico são constituídas por alunos de um ano de escolaridade.
  5. Excecionalmente as turmas do 1.º ciclo do ensino básico podem ser constituídas por mais de que um ano de escolaridade, desde que sejam sequenciais e respeitem um máximo de dois anos de escolaridade por turma.
  6. No caso previsto no número anterior, as turmas são constituídas por um número máximo de 12 alunos.
  7. Cabe aos órgãos pedagógicos do agrupamento de escolas ou escolas não agrupadas a decisão fundamentada da criação de turmas com mais do que um ano de escolaridade.

Artigo 5.º

Constituição de turmas do 2.º e 3.º ciclo do ensino básico

  1. As turmas do 5.º ao 9.º ano de escolaridade são constituídas por um número máximo de 20 alunos.
  2. As turmas integradas nos territórios educativos de intervenção prioritária são constituídas por um máximo de 18 alunos.
  3. Nos 7.º e 8.º anos de escolaridade, o número mínimo para a abertura de uma disciplina de opção do conjunto das disciplinas que integram as ofertas de escola é de 10 alunos.
  4. As turmas do 2.º ciclo que integrem alunos apoiados com medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão ou outros critérios pedagógicos julgados pertinentes, no quadro da autonomia dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, são constituídas por um número máximo de 15 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nessas condições.
  5. As turmas do 3.º ciclo que integrem alunos apoiados com medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão ou outros critérios pedagógicos julgados pertinentes, no quadro da autonomia dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, são constituídas por um número máximo de 17 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nessas condições.
  6. Do 5.º ao 9.º ano, cada docente não pode lecionar, simultaneamente, mais de cinco turmas, num limite máximo de 120 alunos, nem mais de três níveis.
  7. Não sendo possível respeitar o disposto no número anterior, por motivos devidamente justificados, o docente tem uma redução da componente letiva correspondente a uma hora por cada disciplina, programa ou turma que ultrapasse o definido.

Artigo 6.º

Constituição de turmas no ensino secundário

  1. Nos cursos científico-humanísticos e nos cursos artísticos especializados, nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais, no nível secundário de educação, as turmas são constituídas por um número máximo de 22 alunos.
  2. Nos estabelecimentos de ensino integrados nos territórios educativos de intervenção prioritária, as turmas são constituídas por um número máximo de 20 alunos.
  3. Nos cursos do ensino artístico especializado, o número de alunos para abertura de especialização é de oito.
  4. O reforço nas disciplinas da componente de formação específica ou de formação científico-tecnológica, decorrente do regime de permeabilidade previsto na legislação em vigor, pode funcionar com qualquer número de alunos, desde que respeitem os máximos previstos na presente lei.
  5. As turmas que integrem alunos apoiados com medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão ou outros critérios pedagógicos julgados pertinentes, no quadro da autonomia dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, são constituídas por um número máximo de 17 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nestas condições.
  6. No ensino secundário cada docente não pode lecionar, simultaneamente, mais de cinco turmas, num limite máximo de 120 alunos, nem mais de três níveis.
  7. Não sendo possível respeitar o disposto no número anterior, por motivos devidamente justificados, o docente tem uma redução da componente letiva correspondente a uma hora por cada disciplina, programa ou turma que ultrapasse o definido.

Artigo 7.º

Cursos profissionais do 3.º ciclo e do ensino secundário

  1. Nos cursos profissionais, as turmas são constituídas por um número máximo de 20 alunos, exceto nos cursos profissionais de música, de interpretação e a animação circenses, de intérprete de dança contemporânea e de cenografia, figurinos e adereços, da área de educação e formação de artes do espetáculo, em que o limite máximo é 14 alunos por turma.
  2. Nos estabelecimentos de ensino integrados nos territórios educativos de intervenção prioritária, as turmas são constituídas por um máximo de 18 alunos, exceto nos cursos profissionais de música, de interpretação e a animação circenses, de intérprete de dança contemporânea e de cenografia, figurinos e adereços, da área de educação e formação de artes do espetáculo, em que o limite máximo é 14 alunos por turma.
  3. As turmas dos cursos profissionais que integrem alunos apoiados com medidas de suporte à aprendizagem ou outros critérios pedagógicos julgados pertinentes, no quadro da autonomia das instituições, são constituídas por um número máximo de 15 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nestas condições.
  4. É permitido agregar componentes de formação comuns, ou disciplinas comuns, de dois cursos diferentes numa só turma, desde que respeitados os números máximos previstos no presente artigo.

Artigo 8.º

Ensino Recorrente

  1. Nos cursos científico-humanísticos é criada, nos estabelecimentos de ensino que para tal disponham de condições logísticas e de modo a proporcionar uma oferta distribuída regionalmente, a modalidade de ensino recorrente, cujas turmas são constituídas por um número máximo de 22 alunos.
  2. As turmas que integrem alunos apoiados com medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão ou outros critérios pedagógicos julgados pertinentes, no quadro da autonomia dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, são constituídas por um número máximo de 17 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nestas condições.

Artigo 9.º

Disposições comuns à constituição de turmas

  1. O desdobramento das turmas ou o funcionamento de forma alternada de disciplinas dos ensinos básico e secundário e dos cursos profissionais é autorizado nos termos definidos em legislação e/ou regulamentação próprias.
  2. A constituição ou a continuidade, a título excecional, de turmas com número superior ao estabelecido nos artigos 3.º a 8.º carece de decisão devidamente fundamentada do conselho pedagógico.

Artigo 10.º

Homologação da constituição de turmas

  1. Compete à Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, de acordo com o previsto na lei e sob proposta das entidades referidas no n.º 2 do artigo 1.º, homologar a constituição das turmas no âmbito da rede de oferta educativa e formativa.
  2. Compete, ainda, à Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares proceder à divulgação da rede escolar pública, com informação sobre a área de influência dos respetivos estabelecimentos de educação e de ensino.
  3. A informação prevista no número anterior deve ser facultada até ao dia 30 de maio de cada ano e divulgada nos sítios.

Artigo 11.º

Entrada em vigor

  1. A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos no ano letivo que se inicia após o Orçamento do Estado subsequente, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
  2. Compete ao Governo a criação de condições para que a presente lei produza efeitos em 2022, considerando a disponibilidade orçamental para o ano económico, incluindo a possibilidade de recurso a financiamento comunitário.
  • Assuntos e Sectores Sociais
  • Educação e Ciência
  • Projectos de Lei
  • educação