Sr. Presidente, Srs. Ministros e Srs. Deputados: A proposta de lei apresentada pelo Governo, hoje em discussão, afirma estabelecer mecanismos de convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social. Os motivos evocados pelo Governo prendem-se com razões de equidade, de justiça social e com a necessidade de contrariar o desequilíbrio financeiro do sistema. Os motivos evocados, além de não corresponderem à verdade, visam esconder as verdadeiras razões que motivam o Governo. Contudo, e antes de outras considerações, gostaria de me referir à forma como o Governo lidou com o processo de negociação colectiva. Na verdade, não se pode afirmar que houve uma verdadeira negociação colectiva. O que o Governo fez foi ouvir os diferentes sindicatos, cumprindo formalmente a negociação, mas na prática não estava nem nunca esteve disposto a verdadeiramente negociar. Quanto às medidas propriamente ditas, estas não visam a convergência com o regime da segurança social. Bem pelo contrário: vão, sim, criar um regime mais gravoso para os trabalhadores do Estado e têm como objectivo reduzir o valor das pensões dos trabalhadores. Senão, vejamos: o presente diploma aumenta de forma gradual a idade de reforma dos trabalhadores do Estado para os 65 anos. Contudo, estabelece um conjunto de penalizações e formas de cálculo que, se não forem corrigidas em sede de discussão na especialidade, irão implicar que a grande maioria dos cerca de 440 000 trabalhadores a quem este diploma se aplica tenham de ter carreiras contributivas superiores a 40 anos ou a trabalhar muito para além dos 65 anos. Isto só é possível devido a dois factos. Primeiro, porque o Governo, além de manter a penalização de 4,5% por cada ano a menos na idade de reforma, aplica essa penalização à nova idade de aposentação, e não aos 60 anos de idade como até aqui se verificava. Segundo, porque o Governo criou uma nova penalização, que os trabalhadores do regime geral não têm, que implica uma redução entre 2% e 2,25% por cada ano a menos no tempo de serviço. A título de exemplo, um trabalhador que tenha 62 anos de idade em 2009 e 34 anos de serviço sofre uma redução de 8% na sua aposentação. Assim, facilmente se constata que este diploma cria um regime mais desfavorável para os trabalhadores do Estado do que o do regime geral da segurança social. Por outro lado, o presente diploma ataca direitos já formados, uma vez que a fórmula de cálculo do tempo de serviço prestado até 2005 implica a sua desvalorização. Isto deve-se ao facto de a taxa de formação a aplicar, entre 2,47% e 2,2%, ser inferior à que se aplica hoje em dia, que é de 2,5%. É este o diploma da justiça social que o Governo do PS propõe e é este o diploma que pretende a convergência. Ora, nem uma coisa nem outra. Este diploma cria, sim, um regime mais gravoso do que o que existe para os restantes trabalhadores. Este diploma constitui, sim, um verdadeiro retrocesso social. Na realidade, este diploma viola as legítimas expectativas e direitos já formados dos trabalhadores. E esta interpretação só não colhe na bancada do PS, porque, infelizmente, tem memória curta. O PS esquece-se que, na anterior Legislatura, na discussão sobre a aplicação da penalização de 4,5% (a proposta de lei do PSD), o então Deputado Artur Penedos, hoje assessor do Primeiro-Ministro para — imagine-se! — os assuntos sociais, subscreveu uma declaração de voto, em nome da bancada, onde afirmava «que algumas soluções normativas plasmadas no projecto de lei nunca poderiam merecer aprovação dos Deputados do PS por se afigurarem muito gravosas para os trabalhadores da Administração Pública» e reiterava que «a sua pensão será calculada em moldes gravosos, violação dos direitos adquiridos e em formação», chegando ao ponto de falar em «expectativas jurídicas entretanto adquiridas». Pena seja que a bancada do PS se esqueça, mal chegue ao poder, quer dos conceitos jurídicos quer da sua consciência social. Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Este aumento da idade de reforma é justificado com a necessidade de convergência prevista na Lei de Bases da Segurança Social. Contudo, o Governo esquece-se de referir que a convergência dos sistemas não implica forçosamente que esta se faça por baixo. O PCP considera que o caminho da convergência não tem de ser necessariamente este. O Governo aponta, como razão para esta opção, o desequilíbrio financeiro do sistema. Há que repor a verdade. Os chamados desequilíbrios financeiros da Caixa Geral de Aposentações não surgiram do nada, Srs. Ministros. Estes foram provocados pelo facto de os sucessivos governos PS e PSD, com ou sem o CDS-PP, nunca terem transferido a totalidade das verbas que deviam à Caixa Geral de Aposentações. Se o Estado tivesse entregue o correspondente a 23,75% das remunerações que foram pagas — valor que o Estado exige a qualquer entidade patronal —, a situação financeira da Caixa Geral de Aposentações seria bem diferente. Na verdade, a preços de 2005, o Estado deve a esta Caixa um montante aproximado de 9000 milhões de euros — repito: 9000 milhões de euros! Com este encaixe financeiro e sendo devidamente aplicado num fundo de capitalização, estaríamos hoje numa situação financeira substancialmente diferente. Outro facto, também da inteira responsabilidade do Estado, que fragiliza a Caixa Geral de Aposentações diz respeito aos novos subscritores, que a partir do ano de 2001 deixaram de aumentar, tendo mesmo diminuído em 2004. É da inteira responsabilidade do Governo, porque, por um lado, é consequência do desinvestimento nas funções sociais do Estado e, por outro, é consequência da utilização por parte do Estado de contratos de direito privado, de falsos contratos de prestação de serviços, programas ocupacionais, etc. Um conjunto de mecanismos que implicam a precariedade de milhares de jovens que, trabalhando para o Estado, não têm direito a inscrever-se na Caixa Geral de Aposentações, contribuindo, assim, para a sua fragilização. Se se tomarem as medidas necessárias, é possível melhorar a situação financeira da Caixa Geral de Aposentações. No entanto, o que é inadmissível e totalmente injusto é que o Governo utilize as dificuldades económicas provocadas pelos erros dos sucessivos governos, incluído o do PS, para atacar, mais uma vez, os direitos e as legítimas expectativas dos trabalhadores do Estado. Com a campanha de hostilização contra a Administração Pública e com esta ofensiva por parte do Governo do PS — congelamento das carreiras, aumento da idade de reforma e aumentos salariais abaixo da inflação —, os trabalhadores só podiam ter dado uma resposta: a luta, o protesto e as greves. A prova foi dada ontem. Milhares de trabalhadores da Administração Pública, espalhados pelo País, manifestaram-se contra este Governo. Se continuar nesta linha de ataque contra os trabalhadores, o PS pode ter a certeza absoluta de que os protestos e as manifestações vão continuar e vão ser cada vez maiores. O Governo tem aqui, na Assembleia, infelizmente, o apoio dos Deputados do PS, que vão defender as posições do Governo, mesmo que tal implique atacar os direitos e interesses daqueles que, de boa fé, votaram no Partido Socialista. Mas vai contar com a firme oposição do PCP, que nunca traiu o seu eleitorado. Foi por isso que estivemos ao lado e nos solidarizamos com os trabalhadores, que ontem, naquela manifestação, gritavam: «Não podem ser roubados direitos já formados!». Sr. Presidente, Sr. Ministro: No que se r efere à negociação colectiva, alteraram cinco artigos tecnicamente errados, resultado da vossa incompetência! Nada de substancial!… Sr. Ministro, a convergência pode ser feita nivelando por baixo ou por cima. A Lei de Bases da Segurança Social não diz que a convergência tem de ser nivelada por baixo. Pode ser nivelada por cima e o Sr. Ministro sabe-o bem. O Governo invoca a necessidade de sustentabilidade do sistema e o financiamento, e diz que os governos anteriores não fizeram transferências, tudo como se fosse uma entidade estranha. Então, o PS não esteve no governo, no passado?! Não transferiu verbas porquê? De quem é a culpa política? Não é vossa? É vossa, Sr. Ministro, e não dos trabalhadores! O Sr. Ministro quer pôr os trabalhadores a pagar, e em sistema de recibo verde. É disto que se trata, Sr. Ministro! Depois, o Sr. Ministro nada diz quanto aos contratos de trabalho precários na Administração Pública, sistema que desestabiliza e desequilibra todo e qualquer fundo de pensões. O Sr. Ministro nada diz sobre isto. Por outro lado, Sr. Ministro, não corresponde à verdade quando diz que estão assegurados os direitos dos trabalhadores. É que o Sr. Ministro sabe que a taxa de formação da pensão implica que haja uma desvalorização da pensão e os trabalhadores são claramente prejudicados. Sabe, Sr. Ministro, nesta Sala, tem o apoio de todas as bancadas mas, lá fora, os trabalhadores dizem que não podem ser roubados de pensões já formadas.