Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

"Entregar os CTT aos grupos económicos é uma decisão criminosa"

O PCP apresentou hoje uma apreciação Parlamentar ao Decreto Lei que aprova o processo de privatização dos CTT. Bruno Dias afirmou que esta decisão do governo representa uma decisão criminosa do ponto de vista político e económico, da vida das populações e da própria soberania.
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Apreciação do Decreto-Lei n.º 129/2013, de 6 de setembro, que aprova o processo de privatização dos CTT — Correios de Portugal
(apreciação parlamentar n.º 63/XII/3.ª)

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo:

Entregar os CTT — Correios de Portugal aos grupos económicos é uma decisão criminosa, do ponto de vista político, económico, da vida das populações e da própria soberania.

Levar por diante esta medida seria uma verdadeira traição ao interesse nacional, submetendo-o de uma forma inaceitável e escandalosa aos interesses privados do poder económico, trocando uma estratégia de desenvolvimento nacional, do serviço público, da coesão territorial, pelas agendas e estratégias desses grupos económicos e pela sua opção pelo máximo lucro.

Não estamos aqui a alertar para o que poderia eventualmente acontecer às populações e aos trabalhadores em resultado dessas opções, o que estamos a fazer é a denúncia do que já está a acontecer há bastante tempo, fruto dessa mesma opção e dessa estratégia, que os Governos e administrações dos CTT têm vindo a seguir, na «preparação» da empresa para essa privatização.

É o que tem vindo a acontecer, nomeadamente com o encerramento de estações de correio um pouco por todo o País (cerca de 120, em 2012, com a previsão de mais cerca de 200 até ao final deste ano).

A Assembleia da República não pode ficar cega e surda ao protesto que acontece por todo o País, com a mobilização e a participação de utentes, trabalhadores e autarcas, e com a expressão bem viva e bem clara do povo português na penalização eleitoral, de norte a sul do País, e na derrota que infligiu ao PSD e ao CDS, no passado domingo.

Tal como o PCP tem vindo a afirmar, e aqui reafirmamos, esta luta contra a privatização dos CTT e as lutas contra os encerramentos das estações e serviços de correios e pelos direitos e condições de trabalho são uma e a mesma luta.

Por isso, registamos e saudamos as jornadas de luta que os trabalhadores dos CTT vêm desenvolvendo, agora mesmo, por todo o País, percorrendo todos os distritos, de norte a sul, em defesa dos Correios como serviço público e como empresa pública, em defesa do emprego com direitos, mas, desde logo, em defesa de um serviço de qualidade às populações e às empresas, em defesa da coesão territorial e da economia local.

É sempre assim que começam estas operações de desmantelamento, roubo e venda às peças, de empresas e serviços essenciais que são de todos nós. E importa aqui, de resto, sublinhar que foi de um processo como este que nasceu o caminho que nos trouxe às notícias de hoje sobre a fusão da PT com a Oi, com a passagem do seu comando estratégico e dos centros de decisão para fora do País. Depois, logo se verá, que seja o que o grande capital quiser!
O Governo e a maioria parlamentar hão de trazer, como sempre, o argumento da suposta vantagem financeira para o Estado deste tipo de operações. É mentira! Com a privatização dos Correios, com a liberalização do serviço postal e com o novo regime de financiamento do «serviço universal» de correios, que agora se prepara, o Estado abdica de uma empresa estratégica (e, ainda por cima, bastante lucrativa) e não se dispensará dos encargos relacionados com a prestação do serviço público, bem pelo contrário.

O que está em preparação e resultaria destas opções é uma autêntica «PPP dos Correios», em que os dinheiros públicos serviriam, no limite, para pagar um serviço postal cada vez mais pobre para as populações e um lucro privado cada vez mais rico para os interesses dos grupos económicos.

Com este debate e este agendamento, o PCP coloca à Assembleia da República a obrigação e o dever de corresponder e cumprir as suas responsabilidades enquanto órgão de soberania. Hoje e aqui, podemos travar este crime contra o interesse nacional.

(…)

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados:

O Governo trouxe a este debate a garantia de que, independentemente do acionista dos CTT, a qualidade do serviço postal está salvaguardada.
O que nós dizemos é que já hoje as pessoas conseguem desmentir, pela prática, as suas afirmações, Sr. Secretário de Estado.

Isto porque a salvaguarda da qualidade do serviço de que o senhor fala significa ter, hoje, no terreno, retrosarias e tabernas a substituir as estações de correios — é assim que os senhores dizem que as pessoas têm o serviço assegurado!… —; significa ter vastas parcelas do território que não têm, já hoje, distribuição de correio diária, a que as populações teriam, e têm, direito; significa, ano após ano, o convénio de qualidade, que, depois, a ANACOM observa, ser alterado ao sabor dos interesses dos CTT para cumprir exatamente este tipo de estratégias e de opções; significa ter as populações ao abandono, agora cada vez mais, nos correios, como já têm há anos por parte da EDP e da PT, Srs. Deputados! Porque é, hoje, no terreno que se pode saber os resultados, nomeadamente para o interior do País, do que foi a privatização destas empresas e o abandono a que deixaram as populações! As pessoas, de norte a sul do País, ainda se recordam do que foi ficarem às escuras! O Sr. Deputado diz que estamos aqui com a luz acesa. Estamos agora! Esteve a Assembleia! Mas, por todo o País, lembre-se bem do que foi a vergonha do abandono das populações por uma empresa privatizada, como foi o caso da EDP!

Aquilo que aqui dizemos é que é por isso que os Srs. Deputados da maioria parlamentar olham para esta operação e veem oportunidades de negócio.
Precisamente porque são esses os interesses que os senhores representam aqui!

Por isso, tenham cuidado, tenham respeito e tenham vergonha quando, referindo-se aos outros, falam de clientelas! A vossa clientela é que é a mesma do poder económico.

As populações que lutam por melhores condições de vida pelo abandono a que têm sido votadas, essas populações não podem nem nunca poderão ser apodadas de «clientela» nem pelos Srs. Deputados nem por ninguém!

Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo,

Independentemente daquilo que possam dizer, a verdade é que só estamos a ter este debate, hoje, porque os sucessivos governos, o vosso e os anteriores, desde logo os Governos PS com o PEC 4, que queriam impor, não conseguiram, até hoje, levar por diante a privatização. Não o conseguiram até agora e é por isso que agora estamos com esta discussão, porque houve luta e resistência, sim, senhor, dos trabalhadores e das populações.

E será essa luta que vai derrotar esta política e que vos vai derrotar, Srs. Governantes!

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