Projecto de Lei N.º 817/XIV/2.ª

Em defesa da produção nacional de moluscos bivalves vivos e dos trabalhadores do sector

Exposição de motivos

As condições higio-sanitárias e o seu controlo, no que respeita à produção, distribuição e comercialização de moluscos bivalves vivos, equinodermes, tunicados e gastrópodes marinhos vivos destinados ao consumo humano, visando a proteção da saúde pública, encontram-se estabelecidas em diversos diplomas no direito da União Europeia e no Direito Nacional.

Estes diplomas legais, centrando-se fundamentalmente na fixação de teores máximos admissíveis de contaminação e na aplicação de restrições à atividade produtiva baseada nos limiares fixados e demais orientações, não preveem a análise das causas e origem das contaminações que impõem a suspensão dessas atividades nem a adoção de soluções com vista a ultrapassar essas causas, nomeadamente quando estas são alheias aos produtores e à própria atividade produtiva, nem promove a resolução destas situações de forma célere e eficaz.

A este facto acresce que a legislação referida também não contempla a análise das consequências que as restrições impostas à produção, apanha e comercialização de moluscos bivalves vivos, podem implicar, quer em termos económicos, quer em termos sociais, com destaque para a perda de rendimentos dos profissionais, o encerramento de empresas e unidades de produção e o desemprego.

A este respeito, é de salientar o desinvestimento, ao longo de décadas, na proteção destes territórios, por parte de sucessivos governos, incluindo a falta de intervenção nos âmbitos do tratamento adequado de águas residuais, das dragagens e dos apoios à renovação dos viveiros.

É preciso ter em conta que este sector de actividade assegura o emprego e o rendimento a milhares de famílias, sendo a sua actividade sustentável, contribuindo para combater o défice da balança alimentar ao substituir importações.

A inexistência de um regime para apoiar a perda de rendimentos dos trabalhadores que se dedicam à produção de moluscos bivalves para consumo humano nas situações em que ocorram, por extensos períodos, alterações na qualidade do meio que impliquem a alteração da classificação das zonas de produção e a suspensão da atividade, é uma questão que requer resolução, no sentido de permitir a manutenção do emprego e a sustentabilidade futura da atividade.

Neste sentido, para além da definição de medidas e orientações que assegurem a salvaguarda da saúde pública, é necessário identificar a origem das contaminações que põe em causa a segurança alimentar, avaliar as suas repercussões em termos sócio-económicos e atuar no sentido de resolver os problemas, quer no que respeita à eliminação ou mitigação de contaminações, quer no apoio à perda de rendimento dos trabalhadores, defendendo a capacidade produtiva nacional, os trabalhadores e o emprego e combatendo o abandono da atividade e a desertificação dos territórios.

Importa também referir que os mariscadores e produtores de moluscos bivalves vivos para consumo humano constituem um dos grupos que mais interessados estão na preservação destes ecossistemas que lhes asseguram o rendimento, mas são estes que acabam por ser as primeiras vítimas da falta de investimento a que se tem vindo a assistir nesta matéria.

Com o presente Projeto de Lei, o PCP procura dar resposta à necessidade de assegurar a qualidade do meio em que as espécies de moluscos bivalves são produzidas, de atuar sobre as origens de contaminação que conduzem à fixação de restrições no âmbito da sua produção, apanha e comercialização e proteger a produção nacional, os rendimentos e o emprego dos trabalhadores do sector.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente Lei estabelece regras a aplicar no âmbito da regulação da produção e comercialização de moluscos bivalves, equinodermes, tunicados e gastrópodes marinhos vivos, complementares ao Regulamento de Execução (UE) 2019/627 da Comissão, ao Decreto-Lei n.º 113/2006, de 12 de junho e à Portaria n.º 1421/2006, de 21 de dezembro e cria um regime de apoio à perda de rendimento de mariscadores em caso de imposição de suspensão da atividade por períodos superiores a 30 dias.

Artigo 2.º

Atualização da classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos

  1. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera, I. P. (IPMA), a quem estão acometidas as atribuições do extinto Instituto Nacional de Investigação Agrária e das Pescas (INIAP), no domínio das pescas, aquicultura e mar, é responsável pela classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos em Portugal continental.
  2. A classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos em Portugal continental, referida no número anterior, é atualizada e publicitada, pelo menos, semestralmente.

Artigo 3.º

Zonas de produção, apanha e comercialização de moluscos bivalves para consumo humano integradas em Classe C ou Classe D

  1. Quando a atualização da classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos referida no artigo 2.º da presente Lei resultar na definição de novas áreas incluídas nas classes C ou D, esta atualização é acompanhada de um estudo detalhado com a indicação dos elementos que estão na origem da alteração da classificação, a avaliação dos impactos económicos e sociais das novas restrições impostas às atividades de produção, apanha e comercialização de moluscos bivalves para consumo humano e das medidas a tomar para a sua mitigação.
  2. A classificação de zonas de produção de moluscos bivalves vivos incluídas em Classe C ou Classe D, é acompanhada do estudo de identificação das causas e origem de contaminações que justificam esta classificação e das medidas e ações a adotar para melhorar a qualidade dessas zonas, permitindo que passem a incluir-se, pelo menos, em Classe B
  3. Os estudos referidos nos números anteriores do presente artigo são coordenados pelo IPMA, I.P., em articulação com a Agência Portuguesa do Ambiente, o Ministério da Economia, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e com as associações representativas dos produtores e trabalhadores.

Artigo 4.º

Regime de apoio ao rendimento dos trabalhadores em caso de suspensão de atividade

  1. É criado um regime de apoio à perda de rendimento dos trabalhadores, no caso da imposição da suspensão da atividade de produção e apanha de moluscos bivalves para consumo humano, por períodos superiores a 30 dias, ou resultante de alterações na classificação das zonas de produção e de afinação.
  2. São elegíveis para efeito de apoio à perda de rendimento referido no número anterior, os produtores e trabalhadores cujas áreas de produção se integrem totalmente em áreas reclassificadas como C ou D, ou que se integrem em áreas sujeitas a interdição da atividade de produção e apanha de moluscos bivalves por período igual ou superior a 30 dias anuais.
  3. O apoio referido no número 1 do presente artigo é concedido pelo período em que vigore a imposição da suspensão da atividade de produção e apanha de moluscos bivalves para consumo humano, não podendo exceder os 180 dias contínuos.
  4. O valor do apoio a conceder é determinado em função dos rendimentos declarados dos dois anos anteriores, afetos à atividade exercida na área sujeita à imposição de restrições no âmbito da produção e apanha de moluscos bivalves para consumo humano, não podendo o valor a receber ser inferior a uma vez e meia o valor do Indexante dos Apoios Sociais em vigor.

Artigo 5.º

Formalização de candidaturas ao apoio

  1. As candidaturas ao apoio são formalizadas mediante preenchimento de formulário próprio disponível nos serviços descentralizados do Ministério do Mar e no portal das DRAP territorialmente competentes, indicando os elementos relacionados com a perda de rendimentos a ser objeto de apoio.
  2. O prazo para a apresentação das candidaturas é de até 30 dias após a ocorrência da circunstância que está na origem do pedido de apoio.

Artigo 6.º

Financiamento

O presente apoio é suportado pelo orçamento do Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I. P. (IFAP, I. P.).

Artigo 7.º

Período transitório

Compete ao Governo, no prazo de 60 dias, aprovar a regulamentação e proceder às alterações legislativas necessárias à execução da presente lei.

Artigo 8.º

Entrada em vigor e produção de efeitos

  1. A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos com o Orçamento do Estado subsequente, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
  2. Compete ao Governo a criação de condições para que a presente lei produza efeitos em 2021, considerando a disponibilidade orçamental para o ano económico, incluindo a possibilidade de recurso a financiamento comunitário.
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