(quarta alteração à Lei n.º 47/2006, de 28 de agosto)
Exposição de motivos
Por iniciativa do PCP, uma das medidas de maior alcance conquistadas na presente legislatura foi a gratuitidade dos manuais escolares em todo o ensino obrigatório, medida que abrange mais de 1 milhão de alunos.
No Orçamento do Estado para 2016, por proposta do PCP, começou a implementação da gratuitidade dos manuais escolares para todas as crianças que iniciassem o seu percurso escolar no ano letivo 2016/2017. Com os Orçamentos do Estado de 2017, 2018 e 2019 foi prosseguido esse caminho, que culmina no ano letivo 2019/2020, altura em que todos os alunos do ensino obrigatório terão acesso aos manuais escolares gratuitos.
A insistência do PCP na implementação desta medida decorre não só do enquadramento constitucional, mas também do enorme impacto que a gratuitidade dos manuais escolares tem nas condições de vida das famílias com filhos a estudar no ensino obrigatório.
A Constituição da República Portuguesa consagra, nos seus artigos 73.º e 74.º que cabe ao Estado promover a “democratização da educação e as demais condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais, o desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, de compreensão mútua, de solidariedade e de responsabilidade, para o progresso social e para a participação democrática na vida coletiva”, assim como “Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito”.
Portugal é ainda um dos países da União Europeia onde as famílias mais custos diretos têm com a Educação e em que proliferam os baixos salários. Os manuais escolares para toda a escolaridade obrigatória custam cerca de 1500 euros, em média quase 120 euros por ano, havendo anos em que a despesa é significativamente mais elevada. A isto acrescem despesas várias com outros materiais pedagógicos. Como tal, a gratuitidade dos manuais escolares é de elementar justiça e uma medida de inegável valor na promoção da igualdade no acesso à educação.
Vencidos os obstáculos que impediam a sua aprovação, é preciso agora vencer os obstáculos que impedem a sua concretização plena. A forma como o Governo PS optou por implementar a medida, com a imposição da reutilização nos moldes em que tem ocorrido, levou a situações injustas e desiguais num direito que tem de ser universal e sem barreiras ao seu acesso.
De facto, fazer depender a gratuitidade dos manuais escolares da sua reutilização nos termos assumidos pelo Ministério da Educação é apenas encontrar um pretexto para andar para trás numa das mais importantes medidas que foram alcançadas nos últimos anos. A reutilização não pode ser uma imposição que sirva para excluir alunos e famílias da gratuitidade.
Existem muitos manuais em vigor que não estão preparados nem foram concebidos para uma política de reutilização. Em termos didático-pedagógicos, a reutilização será impossível em períodos significativos da escolaridade obrigatória e, designadamente, no 1.º ciclo. É uma violência forçar as crianças e as famílias a apagar os exercícios e desenhos que foram sendo feitos ao longo do ano letivo. É inadmissível que ocorram casos de ameaça de não acesso a manuais ou de exigência de pagamento de manuais em virtude da sua utilização e manuseamento.
O PCP foi alertando para estas questões ao longo da implementação da medida. A situação que está neste momento criada nas escolas demonstra que as críticas que o PCP foi apontando à concretização do programa eram acertadas.
Afinal, as penalidades previstas nos despachos do Ministério da Educação que, supostamente e de acordo com o Governo, apenas serviriam de elemento dissuasor e que nunca levariam ninguém a ter de pagar ou a ficar excluídos, cá estão agora a ser aplicadas. A imposição de reutilização dos manuais escolares no 3.º e 4.º ano como ocorreu no fim do ano letivo passado levou a vários problemas nas escolas e a negação de atribuição de manuais a muitas famílias.
Na esmagadora maioria dos países em que existe política de gratuitidade com reutilização não existem penalizações. No nosso país, o Governo decidiu impô-las. Numa primeira fase, afirmava-se que as penalizações previstas nos despachos do Ministério da Educação apenas serviriam de elemento dissuasor e que nunca levariam ninguém a ter de pagar ou a ser excluído. Neste momento, o que se percebe é que elas serão mesmo aplicadas.
Não é este o caminho. O que é preciso é avançar e garantir que este direito não é apagado. O PCP defende um regime de certificação, adoção e distribuição de manuais escolares mais justo e continuará a lutar para que não se ande para trás na gratuitidade dos manuais escolares. O PCP defende ainda que este regime deve também englobar as fichas de exercícios, para toda a escolaridade obrigatória.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à quarta alteração à lei n.º 47/2006, de 28 de agosto, alterada pelas Leis n.º 72/2017, de 16 de agosto, n.º 96/2019, de 4 de setembro, e pelo Decreto-Lei n.º 9/2021, de 9 de janeiro, que define o regime de avaliação, certificação e adoção aplicável aos manuais escolares e outros recursos didático-pedagógicos do ensino básico e do ensino secundário, garantindo a sua gratuitidade.
Artigo 2.º
Alteração da lei n.º 47/2006, de 28 de agosto
Os artigos 1.º, 2.º e 5.º da lei n.º 47/2006, de 28 de agosto, na sua redação atual, que define o regime de avaliação, certificação e adoção aplicável aos manuais escolares e outros recursos didático-pedagógicos do ensino básico e do ensino secundário, garantindo a sua gratuitidade, passam a ter a seguinte redação:
“Artigo 1.º
Objeto
A presente lei define o regime de avaliação, certificação e adoção aplicável aos manuais escolares e respetivas fichas de exercícios e outros recursos didático-pedagógicos do ensino básico e do ensino secundário, bem como os princípios e objetivos a que deve obedecer o apoio socioeducativo relativamente à aquisição e ao empréstimo de manuais escolares.
Artigo 2.º
Princípios orientadores
- O regime de avaliação, certificação e adoção dos manuais escolares assenta nos seguintes princípios orientadores:
- Disponibilização gratuita dos manuais escolares e respetivas fichas de exercícios a todos os alunos na escolaridade obrigatória na rede pública do Ministério da Educação;
- (…);
- (…);
- (…);
- (…);
- (…).
- (…).
Artigo 5.º
Elaboração, produção e distribuição
- A iniciativa da elaboração, da produção e da distribuição de manuais escolares e respetivas fichas de exercícios e de outros recursos didático-pedagógicos pode pertence aos autores, aos editores ou a outras instituições legalmente habilitadas para o efeito.
- Na ausência de iniciativas editoriais que assegurem a satisfação da procura, compete ao Estado promover ou providenciar a elaboração, a produção e a distribuição de manuais escolares e respetivas fichas de exercícios ou de outros recursos didático-pedagógicos.
- (…).
- O membro do Governo responsável pela área da educação define os procedimentos e condições de disponibilização gratuita, uso, devolução e reutilização dos manuais escolares e respetivas fichas de exercícios, podendo os mesmos ser reutilizados na mesma escola ou em qualquer outra escola ou agrupamento que o tenha adotado, garantindo que:
- Os alunos dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico devolvem os manuais no final do ano letivo, excetuando-se os manuais das disciplinas sujeitas a prova final de ciclo, que ocorre no 9.º ano, devendo a devolução efetuar-se, neste caso, no momento da conclusão, com aproveitamento, do ano letivo;
- (…);
- (…).”
Artigo 3.º
Atribuição de manuais escolares novos
É garantida a todos os alunos a distribuição de manuais escolares gratuitos independentemente do estado do manual aquando da sua devolução.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.