Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República, Reunião Plenária

A crise na Habitação, os anúncios do Governo e a luta das populações

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Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,

A Habitação é uma condição para viver. É algo de que cada um de nós não pode prescindir – e que, para o manter, fará todos os cortes, todos os sacrifícios, passará por todas as dificuldades que forem possíveis até ao limite da decisão de abdicar do nosso teto, do nosso lar.

É essa a situação em que se encontram milhares e milhares de pessoas. Todos os dias a ver no que podem cortar para aguentar. 

Os jovens não ficam na casa dos seus pais até aos 30, ou 35 anos por comodismo, não, eles ficam lá pela precariedade do seu trabalho, pela instabilidade da sua vida, porque não têm condições para manter casa própria.

As pessoas não “optam” por partilhar casa com outros, muitas vezes desconhecidos, nem “optam” por viver em tendas de campismo – fazem-no porque não têm opções.

Estamos de facto perante um drama. Um drama para as famílias, um drama para os jovens, um drama para os estudantes e os seus pais.

E perante tudo isto, perante a brutal especulação, perante um mercado de arrendamento completamente oposto às necessidades da população, perante a gula e acumulação de lucros da banca, perante as benesses dos fundos imobiliários, perante tudo isto a que se devem juntar os incomportáveis aumentos dos preços da alimentação, gás, eletricidade, telecomunicação, combustíveis, portagens, material escolar, entre outras necessidades do dia-a-dia… o que faz o Governo?

Avança com um pacote a que chama “Mais Habitação”, mas cujo nome mais apropriado deveria ser “mais transferências”, mais transferências para a banca, mais transferências de benefícios para os fundos imobiliários, no fim do dia é nisto que resulta o suposto mais habitação.

Há poucos dias foram anunciadas medidas pelo Governo. Medidas que, podendo ter importância para quem lhes pode aceder, deixam intocável por opção, e só por opção, a principal responsável pela situação a que chegámos e simultaneamente a principal beneficiária dessa mesma situação – a banca.

São medidas insuficientes, tardias e que, sobretudo, passam ao lado das questões centrais. Insuficientes porque, aliviando o aperto da corda, deixam o nó no pescoço de quem tem um crédito à habitação. Tardias porque não há nada que justifique que medidas, ainda que limitadas, sejam tomadas ao fim do décimo aumento das taxas de juro. E passam ao lado do alvo, porque o alvo deveria ser colocar os lucros da banca a que suportar o aumento das taxas juro.

Nem uma medida, nem sequer uma aproximação disso que belisque os 11 milhões de euros de lucros por dia da banca.

O Governo determina que devemos pagar o mesmo e na totalidade, à banca o Governo garante que continuam a encher os cofres recebendo tudo, na totalidade e cada vez mais. Uma decisão que não só prolonga o nível insuportável das prestações pagas aos bancos, como em nada garante que estas não venham a subir ainda mais, como aliás o BCE tem vindo a admitir.

O Governo, que fala em "reduzir e estabilizar" as prestações ao banco, está na prática a empurrar as famílias para um adiamento daqueles pagamentos que, sendo um pouco mais "reduzidos" durante dois anos, terão de ser pagos na íntegra depois.

Poupança zero para as famílias, lucro por inteiro para a banca. Não é essa a resposta de que o País precisa!

Coragem, determinação, uma política ao serviço dos trabalhadores e do povo, é isso que se impõe neste momento. E isso implica enfrentar a banca, os seus interesses e pô-la, com os seus milhões de euros de lucros, a suportar o aumento das taxas de juro.

É preciso proteger a habitação própria, travar penhoras e despejos, impedir a especulação, impor como limite máximo 0,43% de aumento para as rendas no próximo ano. É preciso concretizar uma moratória por um máximo de dois anos, suspendendo a amortização do capital e pagando juros apenas a uma taxa igual àquela a que os bancos se financiam.

A verdade é que a banca se financia a valores muito mais baixos do que aqueles que cobra nos empréstimos à habitação. E a verdade é que esta paga duas a três vezes menos pelos depósitos do que aquilo que cobra pelos empréstimos. 

É preciso que a Caixa Geral de Depósitos, como banco público que é, prossiga uma opção clara que permita baixar o spread e os custos bancários.

É preciso eliminar os benefícios fiscais aos especuladores, aos fundos imobiliários, e acabar com o fim do regime fiscal de privilégio que é o Regime dos Residentes Não Habituais.

É preciso assumir uma forte aposta na disponibilização de habitação pública, mobilizando recursos para a construção, requalificação e aquisição de habitações, elemento determinante para impedir que o direito à habitação esteja refém dos lucros da banca e da especulação imobiliária, condição decisiva para garantir que em Portugal, como diz a Constituição da República, “todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação”.

E isso implica enfrentar a banca e pô-la, com os seus milhões de lucros à nossa conta, a assumir o aumento das taxas de juro. Implica o combate à especulação, o combate aos privilégios da banca e dos fundos imobiliários e acima de tudo, uma questão que só se resolve com um geral e significativo aumento dos salários e das pensões. E quanto aos salários, basta de conversa, aumentem-se os salários 15%, num mínimo de 150 euros para todos os trabalhadores.

Apesar, como já dissemos, do caráter insuficiente, limitado, propagandístico destas medidas, e do facto de elas passarem completamente ao lado das questões centrais, a verdade é que essas medidas agora anunciadas pelo Governo vêm demonstrar mais uma vez que o Governo foi forçado pela luta das populações a fazer alguma coisa. Que vale sempre a pena lutar!

E é essa luta que vai continuar, já neste sábado, dia 30, em vários pontos do País, uma luta que mais cedo ou mais tarde, irá levar por diante as medidas que se impõem para responder ao problema da habitação.

Mais uma vez reafirmamos o compromisso do PCP em prosseguir a intervenção e a luta pela garantia do direito à habitação. 

E diremos isto quantas vezes for preciso: a Habitação tem mesmo de ser um direito e não uma mercadoria – e o que é urgente garantir são casas para viver, e não para especular!

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