Exposição de Motivos
O PCP tem acompanhado com grande preocupação a situação das famílias com crianças que frequentam diversos equipamentos de apoio à infância que, face às circunstâncias atuais, se encontram encerrados, obrigando a que as crianças fiquem em casa, tendo já dirigido uma pergunta ao Governo sobre essa mesma matéria. Tal realidade resulta num aumento das despesas familiares, nomeadamente com refeições. Neste contexto é ainda colocado às famílias o pagamento das mensalidades de instituições que se encontram encerradas, acrescendo, em muitas situações realidades familiares de perda de rendimentos (seja por situações de desemprego ou lay-off, por exemplo), o que cria dificuldades acrescidas ou torna incomportável o pagamento da comparticipação familiar em muitas instituições. A situação excecional que vivemos e as medidas de prevenção do surto epidémico não podem ser pretexto para lançar a “lei da selva” com o aumento da instabilidade laboral dos trabalhadores e a proliferação dos despedimentos, cortes nos salários, violação dos direitos laborais, como tem tido lugar, e que se reflete nas condições de vida das famílias e das crianças.
São manifestamente insuficientes as orientações estabelecidas que deixam ao critério das instituições o estabelecimento das percentagens de redução das mensalidades nesta situação excecional.
O PCP considera necessário garantir a revisão das mensalidades para atender às alterações de rendimentos das famílias, repercutindo-as, no imediato, nos montantes das mensalidades a pagar, não apenas no período de encerramento das valências mas para o futuro. Entendemos ser também necessário criar mecanismos de igualdade no valor das mensalidades a pagar, designadamente a partir do alargamento das vagas abrangidas pelos protocolos de cooperação.
Para que as crianças possam continuar a frequentar as respetivas valências quando estas retomarem o seu funcionamento é necessário tomar medidas que impeçam a anulação da matrícula e a cobrança de taxas por incumprimento do pagamento das mensalidades no período em que estas estiverem encerradas.
O PCP considera ser necessário garantir respostas imediatas às famílias face às dificuldades que estão criadas com a quebra de salários e rendimentos, bem como medidas que tenham em consideração as dificuldades financeiras com que muitas instituições de solidariedade social estão confrontadas. Não podemos deixar de sinalizar a necessidade de reforço do número de trabalhadores e da sua valorização, da melhoria das suas condições de trabalho, do integral cumprimento dos seus direitos laborais.
O PCP considera urgente que seja concretizada a gratuitidade das creches, dando cumprimento ao que foi aprovado no Orçamento do Estado para 2020, e continuará a intervir para que sejam tomadas medidas que visem atingir a universalidade da gratuitidade do acesso à creche por todas as crianças até aos três anos.
O PCP tem defendido a necessidade de ser criada uma resposta pública nesta área, que deve ser implementada no âmbito da Rede de Equipamentos e Serviços, sem prejuízo do papel complementar, e nem por isso menos relevante, das IPSS nas diferentes valências.
Não abdicando destas propostas de fundo, o PCP apresenta o presente Projeto de Lei propondo um conjunto de medidas urgentes.
Propomos:
- Revisão das mensalidades de forma a refletir a alteração dos rendimentos do agregado familiar, devendo este instrumento continuar em vigor após a abertura das valências para atender a novas situações de quebra dos salários e dos rendimentos das famílias;
- Alteração do período que serve de cálculo a essa revisão passando a ser efetuada em função dos rendimentos dos últimos 2 meses;
- Redução em pelo menos 20% das mensalidades no período de suspensão de atividades letivas e não letivas;
- Proibição de anulação de matrícula e de cobrança de taxas ou multas por incumprimento do pagamento das mensalidades no período de encerramento das valências;
- Alargamento das vagas abrangidas pelos Acordos de Cooperação nas valências de apoio à infância, criando-se critérios de igualdade no cálculo das mensalidades entre as crianças que frequentam as valências de infância e garantindo a todas a possibilidade de redução das mensalidades.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto e âmbito
A presente lei cria um regime excecional e temporário de apoio às famílias com quebra de rendimentos cujos filhos ou outros dependentes frequentem equipamentos sociais de apoio à infância, nomeadamente creches ou soluções equiparadas, jardins de infância e centros de atividades de tempos livres.
Artigo 2.º
Revisão das mensalidades
- 1 – A requerimento dos utentes, as instituições que possuam valências de apoio à infância cujas atividades se encontrem suspensas procedem à revisão do valor da comparticipação familiar.
- A revisão prevista no número anterior considera os rendimentos dos últimos dois meses para definição do rendimento per capita.
- Para os efeitos previstos nos números anteriores, a prova do rendimento pode ser feita por qualquer meio admissível em Direito, nomeadamente pelo registo de remunerações junto da Segurança Social.
Artigo 3.º
Redução do valor das mensalidades
- A suspensão das atividades letivas e não letivas das instituições que possuam valências de apoio à infância determina uma redução do valor mensal da comparticipação familiar.
- Sem prejuízo de reduções superiores que sejam aplicáveis, a redução prevista no número anterior não pode ser inferior a 20% do valor da comparticipação familiar mensal.
- Nos casos em que, após a determinação da suspensão das atividades letivas e não letivas, sejam pagos valores da comparticipação familiar superiores aos que forem devidos, as instituições procedem à respetiva compensação com a redução das mensalidades seguintes ou, quando tal não seja possível, devolvendo os montantes pagos em excesso.
Artigo 4.º
Proibição de anulação de matrícula ou cobrança de penalidades ou juros
- Em caso de suspensão das atividades letivas e não letivas das instituições que possuam valências de apoio à infância e quando os utentes demonstrem existir quebra do seu rendimento mensal, não é permitido à instituição anular a matrícula nem cobrar juros ou qualquer outra penalidade por falta ou atraso no pagamento das mensalidades.
- Para os efeitos previstos no número anterior a prova do rendimento pode ser feita por qualquer meio admissível em Direito, nomeadamente pelo registo de remunerações junto da Segurança Social.
Artigo 5.º
Plano de pagamento
- Nas situações em que se constituam dívidas relativas a mensalidades devidas após a determinação das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia de SARS-CoV-2 é elaborado um plano de pagamento.
- O plano de pagamento referido no número anterior é definido entre a instituição e os utentes, podendo iniciar-se no segundo mês posterior ao da cessação das medidas referidas no número anterior desde que o utente o requeira.
- Salvo acordo expresso do utente em sentido diferente, as prestações previstas no plano de pagamento não podem exceder o montante mensal de 1/12 do valor em dívida.
Artigo 6.º
Alargamento das vagas em creches em acordo de cooperação
- A Segurança Social procede oficiosamente ao alargamento do número de vagas em creches em acordo de cooperação relativamente às instituições com as quais existiam os referidos acordos à data do início das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia de SARS-CoV-2.
- O alargamento referido no número anterior é efetuado assegurando a cobertura de todos os utentes das creches naquela data e determina a revisão das respetivas comparticipações familiares, assim como dos valores das comparticipações financeiras a atribuir a cada instituição.
- Ficam excluídas da aplicação do disposto no presente artigo as instituições que tenham procedimento à resolução de contratos de trabalho ou recorrido aos mecanismos previstos no Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março.
Artigo 7.º
Entrada em vigor e vigência
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e vigora até à cessação das medidas excecionais e temporárias de resposta à epidemia SARS-CoV-2.
Artigo 8.º
Produção de efeitos
A presente lei produz efeitos à data de 1 de abril.