Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

Os cortes que o Governo está a fazer na educação, relegando o conhecimento e a cultura para um plano secundário

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Carlos Zorrinho,
Congratulo-o pela declaração política que trouxe a Plenário sobre a aposta na educação e a importância da educação numa sociedade.
Todavia, acontece que na sua intervenção, e ao ouvi-lo com atenção, não podemos deixar de registar que houve uma espécie de esquecimento seletivo relativamente a algum património do Partido Socialista em matéria de escola pública e que, entendemo-lo, pelos impactos negativos que essas medidas tiveram, a nossa responsabilidade obriga-nos a trazê-las aqui.
São elas: a criação dos mega-agrupamentos; o recurso ilegal à precariedade na contratação de milhares de funcionários, professores, de psicólogos; o fim do par pedagógico EVT; os ataques e desvalorização ao estatuto da carreia docente feitos pela então ministra Maria de Lurdes Rodrigues e depois pela ministra Isabel Alçada; o Decreto-Lei n.º 70/2010 e o impacto gravíssimo que teve na atribuição das bolsas de ação social escolar no ensino superior; o Decreto-Lei n.º 3/2008 e aquela decisão profundamente injusta de que os apoios sejam apenas para os alunos que não têm necessidades transitórias, mas apenas para os que têm necessidades permanentes; o fim da gestão democrática das escolas.
Em suma, um conjunto de medidas que, pela gravidade que representaram, deixaram sequelas e deixaram uma porta aberta para que este Governo PSD/CDS pudesse entrar dentro da escola pública e agudizasse muitos dos seus problemas estruturais.
Não temos dúvida nenhuma de que a escola pública — e não é uma escola qualquer, é a escola pública — é um pilar do regime democrático.
A escola pública é um instrumento de emancipação individual e coletivo, é um espaço de formação da cultura integral do indivíduo e sobre isso, assim, em teoria, estamos de acordo. Aliás, com o discurso do PS sobre a escola e a educação quando o PS está na oposição nós até estamos quase sempre, no essencial, de acordo; o problema é que quando o PS chega ao Governo executa, na prática, uma política de destruição da escola pública e do seu papel numa sociedade democrática.
Assim, a questão que gostaríamos de lhe colocar é no sentido de perceber onde é que os desígnios que aqui apontou relativamente ao papel da escola pública se compatibilizam com o pacto da troica.
Srs. Deputados, a realidade incomoda o Partido Socialista, mas a realidade é esta: foi o Partido Socialista que, na prática, abriu caminho ao PSD e ao CDS. Era importante que não tivesse sido, mas, na prática, foi isso que aconteceu!
Quando o pacto da troica determina cortas inaceitáveis nas condições materiais e humanas da escola pública e quando o tratado orçamental, que o Partido Socialista aqui assinou com o PSD e o CDS, prevê a limitação do investimento público nas funções sociais e estratégicas do Estado, pergunto: que novo rumo é que o Partido Socialista quer?
É que ao ouvi-lo na sua primeira intervenção parecia que existia uma vontade de alternativa, mas, Sr. Deputado, nas respostas que deu ao PSD e ao CDS, de facto, o que aqui está não é um novo rumo de alternativa; é um rumo de alternância. A escola pública não é qualquer coisa, a escola pública é um pilar do regime democrático. A escola pública para o cumprimento do seu papel exige investimento público, e isso não é despesa, mas investimento público!
Por isso, era importante que o Partido Socialista, de uma vez por todas, nos esclarecesse relativamente ao pacto da troica, às suas implicações, designadamente no tratado orçamental, e aos impactos que isso vai ter nos sistemas científico e técnico, na escola pública e no sistema educativo.

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